Franceses querem fazer cocó no rio Sena?

Revoltados com o gasto de 1,4 mil milhões de euros na limpeza das águas do rio desde 2015, que consideram que seriam melhor gastos para resolver outros problemas de Paris como segurança e transportes públicos, algumas pessoas decidiram manifestar o seu desagrado assegurando que vão fazer cocó no Sena no dia em que a autarca nele mergulhará. 

A hashtag #jechiedanslaseinele23juin surgiu minutos depois do anúncio oficial de Anne Hidalgo e foi partilhada milhares de vezes. "Eles meteram-nos na merda, agora é a vez deles de se meterem na nossa merda", dita o slogan da campanha que até levou à criação de um site no dia 23 de maio.

Como surgiu o site?

Segundo o Actu Paris, o site foi criado por um informático residente na região de Paris. Este permite a qualquer um calcular onde e quando fazer as suas necessidades para que cheguem a Paris no dia 23 de junho, tendo em conta a distância a que se situa. Por exemplo, quem viver a 120 quilómetros, deverá fazê-lo a 21 de junho à meia-noite. 

"De início, o objetivo era fazer uma piada, recuperando essa hashtag irónica. Depois, cada um tem o seu ponto de vista. Há pessoas que querem mesmo fazer cocó no Sena, ou avançar com outras ações, nada está excluído", contou o autor do site ao Actu Paris. 

Para criar um site como estes, "bastam alguns minutos de código e a aplicação de um algoritmo 'simples'", relatou o jovem que não se identificou "por precaução" ao site francês. 

O mesmo acrescenta que o movimento surgiu como um protesto político: "Em termos de imagem da França, é bom que o Sena esteja limpo. O problema é que todos os recursos investidos não o foram na resolução de todos os problemas sociais que temos atualmente. Temos a sensação de que fomos negligenciados. Podemos ver onde estão as prioridades."

Anne Hidalgo cumprirá promessa?

A natação no rio Sena era muito comum antes da Revolução Francesa, mas acabou por ser proibida em Paris em 1923 através de um decreto-lei. Desde então, as autoridades tem estado em permanente vigilância para não permitir banhistas.

Em 1990, Jacques Chirac, então presidente da Câmara de Paris, prometeu "banhar-se no Sena perante testemunhas" três anos depois, mas nunca chegou a cumprir a sua promessa. Desde 2016, França já investiu cerca de 1,4 mil milhões de euros para tornar o Sena e o seu principal afluente, o Marne, seguros para os banhos. Está previsto que, após este mergulho simbólico, se dê a abertura de vários pontos de banho em Paris no verão de 2025.

O banho de Anne Hidalgo decorrerá sob vigilância apertada, sendo esperada a presença do dirigente da polícia de Paris, Laurent Nuñez, e do presidente regional, Marc Guillaume, ao lado da autarca. Há rumores de que o Emmanuel Macron, presidente de França, irá participar, mas ainda não foi confirmado.

Apesar disto, entre setembro de 2023 e março de 2024, a ONG Surfrider Foundation realizou várias análises para medir a qualidade de água do rio, tendo constatado que 13 das 14 medições efetuadas estavam "acima, ou mesmo muito acima" dos limites recomendados para tomar banho, noticiou o Marie France: ou seja, a água está poluída.  Este facto deveu-se a concentrações elevadas de duas bactérias: a Escherichia coli e enterococos.

"Às armas, cidadãos"

Apesar do compromisso do governo francês em abrir alguns pontos do Sena para banhos, a polémica continua a crescer nas redes sociais: "O regresso do cocó como arma revolucionária", lê-se na rede social X. "Às armas, cidadãos! Formem os vossos batalhões!", acrescentou outro parisiense, numa alusão ao hino francês.

Existe até um cartaz a anunciar o evento, apelidado de Crotte en Seine (cocó no Sene), com um ponto de encontro marcado para a ponte Marie. Foram também divulgadas várias imagens, criadas com Inteligência Artificial, de sanitas instaladas ao longo do rio. 

O primeiro vice-presidente da Câmara Municipal de Paris, Emmanuel Grégoire, já veio responder aos órgãos de comunicação franceses sobre o movimento: "Não estamos a levar isto muito a sério. Não é mais do que uma brincadeira. Para além da brincadeira, a ideia é mostrar que os responsáveis vão tomar banho. É o poder do exemplo."

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