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Novo medicamento para a obesidade disponível. Serão a solução para a doença?

Débora Calheiros Lourenço 01 de abril de 2025 às 13:20

São já cinco os medicamentos para a obesidade disponíveis em Portugal, no entanto nenhum tem comparticipação. A SÁBADO falou com dois especialistas e as opiniões dividem-se entre o apoio aos fármacos e a precaução devido à falta de estudo sobre possíveis consequências no futuro.

Wegovy é o mais recente medicamento para o combate à obesidade a chegar às farmácias portuguesas, já pode ser receitado pelos médicos e estará disponível partir de dia 7.

Jens Kalaene/AP

A Novo Nordisk, farmacêutica responsável pela produção do medicamento, refere que o Wegovy deve ser usado como um complemento de uma dieta reduzida em calorias e aumento da atividade física para o controlo de peso em adultos com um Índice de Massa Corporal superior a 30 ou 27, se o paciente tiver outros problemas que agravem a sua condição de saúde. Este é um medicamento que pode também ser utilizado em casos de pessoas que têm disglicemia, hipertensão, dislipidemia, apneia obstrutiva do sono e doença cardiovascular. Além disso podem ser utilizados por crianças a partir dos 12 anos.

Já é famoso por ser semelhante ao Ozempic. Na realidade, tem o mesmo princípio ativo na sua base e é produzido pela mesma farmacêutica. Alejandro Santos, professor associado da Universidade de Ciências da Nutrição e Alimentação do Porto, explica à SÁBADO que o Wegovy não passa de "uma apresentação comercial diferente do semaglutido, que anteriormente era utilizado para o tratamento de doentes com diabetes tipo 2, apesar das utilizações inadvertidas para a perda de peso". A principal diferença aqui é que a dosagem é maior do que a aconselhada na utilização do Ozempic. 

Os ensaios clínicos demonstraram que o Wegovy potencializa uma perda de peso em média de 17%, que se manteve durante dois anos. Um outro estudo baseado em mais de 17.600 adultos revelou que o Wegovy reduz em 20% o risco de doenças cardiovasculares graves em pessoas sem diabetes, mas com histórico de doenças cardiovasculares e excesso de peso ou obesidade. 

Segundo o site do Infarmed, o preço de uma caneta de Wegovy vai depender do tipo de dosagem, mas o preço máximo para uma caneta de 0,25 é de €153,08€ enquanto a caneta máxima de 2,4 mg pode chegar aos €244,80.

Este será o quinto medicamento contra a obesidade a entrar no mercado português, no entanto nenhum deles tem comparticipação do Estado. José Silva Nunes, presidente da Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade (SPEO), reforça que esta decisão estimula uma "situação de iniquidade social" pois "impossibilita que uma faixa grande da população tenha acesso aos fármacos", por isso, pede que "não haja um tratamento discriminatório dos doentes".  

"Há vinte anos que a obesidade é reconhecida em Portugal como uma doença crónica, mas na prática ainda pouco foi feito para proteger as pessoas que sofrem da doença", continua o presidente da SPEO antes de reforçar que tem trabalhado "para que a doença deixe de ser discriminada quando comparada com outras crónicas". Este é um fator importante porque ao ser uma doença crónica necessita de um "tratamento continuado", o que aumenta ainda mais o esforço financeiro para lidar com a doença.

José Silva Nunes alerta também que o combate à obesidade "tem um impacto económico gigante, chegando aos 1,2 milhões por ano" pelo que considera que é essencial aumentar as medidas para o controlo da doença, "que está na génese de outras doenças" e possibilita "controlar também todas as doenças associadas".

Sobre uma possível comparticipação do estado, Alejandro Santos defende que "tendo em consideração o custo destes fármacos e o número de pessoas a quem eventualmente poderia ser prescrito, não sei se teríamos e economia para aguentar". 

Como é possível controlar a obesidade? 

José Silva Nunes explica que "a narrativa antiga era que com dieta e exercício físico qualquer pessoa com a obesidade conseguia tratar a sua doença, no entanto atualmente já é reconhecido que esta é uma doença que para ser tratada precisa de uma intervenção cognitiva comportamental, na qual a alimentação e o exercício físico estão incluídos, terapêutica farmacológica e, nos casos elegíveis, tratamentos cirúrgicos".  

O médico reforça que "a dieta e o exercício sozinho não conseguem tratar a doença", especialmente devido aos conhecidos "mecanismos de compensação", que levam as pessoas a ganhar todo o peso perdido, ou até mais, depois de um período de dieta. Assim os fármacos são utilizados para "regular o hipotálamo", responsável por "regular o apetite e permitir às pessoas que consigam manter o peso".  

"Os medicamentos contra a obesidade permitem evitar que a fisiopatologia do nosso organismo funcione, tal como fazem nas outras doenças crónicas", concluiu José Silva Nunes reforçando a "predisposição genética que existe na condição e que é preciso que as pessoas tenham noção para conseguirmos acabar com a narrativa de que a obesidade surge por descuido". 

Ainda assim, Alejandro Santos adverte que "os estudos sobre este tipo de medicamentos são muito focados na perda de peso corporal e na redução de alguns riscos cardiovasculares", "deixando um pouco de lado a qualidade do peso perdido, se inclui muita massa magra ou não, e os impactos que podem ter no futuro".

"Se estes tipos de medicamentos não forem adequadamente acompanhados com um plano alimentar personalizado e a prática de exercício corremos o risco de ter uma perda de massa magra muito superior ao esperado e desejado, até devido à dificuldade de manter um gasto energético que permita manter os resultados", continua o professor.  

Tendo mais uma vez em conta que a obesidade é uma doença crónica "e necessita de um tratamento para a vida toda", Alejandro Santos partilha que "neste momento ainda não se sabe se estes fármacos podem ser utilizados a vida toda", porque "não existem estudos que nos deem respostas sobre o que vai acontecer em longo prazo, além do esforço económico incomportável".

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