Silvana Santos descobriu que mais de 30% dos casais de Serrinha dos Pintos, no interior do Rio Grande do Norte, eram parentes e um terço deles tinha pelo menos um filho com deficiência.
Silvana Santos, professora da Universidade Estadual da Paraíba, descobriu uma doença que afeta dezenas de famílias no Brasil e foi nomeada pelaBBCcomo uma das cem mulheres mais influentes e inspiradoras de 2024.
REUTERS/Bassam Khabieh
Nos últimos 25 anos, a bióloga esteve inserida numa comunidade da Serrinha dos Pintos, no interior do Rio Grande do Norten onde coordenou estudos que foram capazes de identificar uma mutação genética, causa da Síndrome Spoan, sigla em inglês que significa paralisia espática, atrofia ótica e neuropatia.
Esta é uma síndrome que afeta o sistema nervoso e enfraquece gradualmente o corpo, no entanto só se verifica quando o gene alterado é herdado de ambos os pais. A Spoan costuma manifestar-se ainda na juventude através da contração involuntária dos membros inferiores que fazem com que o doente perca a capacidade de andar. Com a evolução da doença, os braços e as mãos a começam a sofrer de espasmos e enrijecimento e, nos casos mais graves, as pessoas ficam com problemas de fala e seriamente dependentes para concluir qualquer atividade básica.
Serrinha dos Pintos é casa para menos de cinco mil pessoas e antes da chegada de Silvana Santos ninguém tinha uma explicação para existirem tantas crianças que perdiam a capacidade de andar. A bióloga foi uma peça chave para a melhoria do aconselhamento genético da população e mobilizou outros investigadores para conseguirem garantir que os pacientes têm acesso a tratamentos de fisioterapia capazes de melhorar a sua qualidade de vida e aliviar as dores. Esta é uma doença que não tem cura.
Em 2008, Silvana Santos já tinha participado na produção de um minidocumentário onde os pacientes com Spoan relatavam o seu quotidiano e partilhavam os seus planos para o futuro, que passavam por ter filhos ou concluir a faculdade.
A especialista teve conhecimento do fenómeno ainda em São Paulo, onde muitos dos seus vizinhos eram membros da mesma família originária da Serrinha dos Pintos e partilharam consigo que era normal os primos casarem entre si e que muitas pessoas não conseguiam andar. Foi a filha de um destes vizinhos que fez com que a curiosidade aumentasse: quando era criança, os olhos de Zirlândia moviam-se involuntariamente e com o tempo perdeu a força nos membros inferiores.
Silvana Santos decidiu dedicar-se a condição e visitar Serrinha dos Pintos. A realidade que encontrou parecia "um mundo à parte" com uma notável coincidência social e quanto mais falava com os moradores mais foi percebendo o quão comum eram os casamentos entre primos. Um estudo levado a cabo por si demonstrou que, em 2010, mais de 30% dos casais da pequena cidade eram parentes e um terço deles tinha pelo menos um filho com deficiência. Apesar da maioria das crianças nascidas em casamentos entre primos serem saudáveis, existe um maior risco de doenças originadas por mutações genéticas que sejam transmitidas dentro da família.
Desde 2005, altura em que a síndrome foi identificada pela primeira vez, a equipa liderada por Silvana Santos conseguiu identificar 82 casos espalhados pelo mundo.
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"O afundamento deles não começou no Canal; começou quando deixaram as suas casas. Talvez até tenha começado no dia em que se lhes meteu na cabeça a ideia de que tudo seria melhor noutro lugar, quando começaram a querer supermercados e abonos de família".