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"Precariedade" empurra pilotos bombeiros portugueses para Espanha

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Há cada vez mais pilotos de combate aos incêndios a trabalhar no país vizinho. Bombeiros e pilotos falam de maus salários e condições de trabalho.

A notícia chegou de Espanha: o país, particularmente na região da Galiza, está a captar pilotos portugueses para serviços de emergência, em especial de combate a incêndios, para suprir o êxodo dos seus próprios profissionais para o estrangeiro. Em ambos os casos, a migração dos chamados pilotos bombeiros estará a ser movida por melhores salários e condições de trabalho.

Precariedade leva pilotos portugueses para Espanha, com melhores salários e condições de trabalho
Precariedade leva pilotos portugueses para Espanha, com melhores salários e condições de trabalho PEDRO SARMENTO COSTA/LUSA

Segundo reporta o El Periódico, dos cerca de 40 pilotos atualmente na Galiza, "pelo menos uma dúzia" são portugueses. Em Espanha, os pilotos chegam a receber €4.000 mensais, enquanto que, em outros países europeus, ou em estados do Médio Oriente como os Emirados Árabes Unidos ou a Arábia Saudita, podem receber "o triplo disso". Enquanto isso, em Portugal, o êxodo agudiza os problemas de um setor mal pago e precário, defendem representantes de bombeiros e pilotos nacionais.

"Não há muitos pilotos em Portugal, são normalmente pilotos sazonais e há alguma dificuldade em obter novos", diz António Nunes, presidente da Liga de Bombeiros Portugueses (LBP), que explica, no entanto, que os bombeiros "não têm nenhuma responsabilidade sobre a contratação de meios aéreos", que recai sobre a Força Aérea, que por sua vez os coloca "à disponibilidade da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil", à ordem da qual está também o corpo de bombeiros.

A Força Aérea, no entanto, "não tem neste momento meios próprios de combate a incêndio, só de vigilância", o que significa que "todos os meios aéreos de combate a incêndios são concessionados" a privados. Mesmo estas empresas, que se candidatam a concursos públicos para fornecer meios de combate aos incêndios florestais, "têm tido dificuldades em captar pilotos", afirma o presidente da LBP. Em causa estarão, sobretudo, condições adversas para exercer a profissão.

"O que sabemos, tanto no combate aos incêndios quanto a outro tipo de trabalho aéreo de emergência, como o médico, estão associados a alguma precariedade no País", explica Frederico Saraiva Almeida, vice-presidente do SPAC, o Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil - uma precariedade que se manifesta, em primeiro lugar, nos "vínculos contratuais, que muitas vezes são a termo ou de prestação de serviços", visto que o trabalho no combate aos incêndios é sobretudo sazonal.

"Acaba por haver despedimentos sem os haver, porque os contratos não são renovados", prossegue o sindicalista, explicando que, no caso dos incêndios, Espanha está a obrigar a que se assinem contratos de trabalho", ao passo que, "em Portugal, ainda são permitidos recibos verdes". 

Não é a única diferença entre os dois países no que aos pilotos diz respeito. Frederico Saraiva Almeida explica que "os pilotos nesta área podem fazer um máximo de 2.000 horas anuais, mas a legislação europeia determina que outros períodos de trabalho, como o número exigido de horas de simulador e as deslocações, não contem", motivo que "levou a greves neste setor em Espanha".  

Por lá, "o governo interveio para que os operadores chegassem a acordo com pilotos para arranjar forma de contabilizar o trabalho acessório ao voo"; por cá, "a Autoridade Nacional da Aviação Civil [ANAC] não foi recetiva a intervir, e portanto a contabilização dos tempos de trabalho não ficou como poderia ficar", o que significa que "os pilotos podem estar numa base em alerta de sol a sol e ser chamados depois de 12 horas de trabalho não-contabilizado".

"As autoridades têm vindo a fechar os olhos consistentemente, a ANAC não tem tomado as diligências para regular", denuncia o sindicato, que acrescenta que os reguladores parecem "só se lembrar quando há acidentes". Mesmo nestes casos, "as instituições refugiam-se no erro dos pilotos, mas não querem dizer em que condições é que estes pilotos trabalham - é sobre as causas que as instituições têm de atuar."

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