Apenas uma única proposta de lei foi apresentada, que se insira no âmbito dos objetivos definidos na Agenda Anticorrupção.
Esta semana contaram-se seis meses desde a tomada posse do XXIV Governo Constitucional. No discurso proferido por ocasião da tomada de posse, o Primeiro-Ministro disse que o Governo não iria "governar para a propaganda", mas "governar para os resultados". Disse também que "[n]a Justiça, a celeridade e a simplificação processual são eixos fundamentais para dar confiança aos cidadãos, às instituições e aos agentes económicos". Anunciando o propósito de "fixar uma agenda ambiciosa, eficaz e consensual de combate à corrupção", com o objetivo de "no prazo de dois meses ter uma síntese de propostas, medidas e iniciativas que seja possível acordar e consensualizar" com todos os partidos com assento parlamentar, daí propunha-se partir "para a aprovação das respetivas leis, seja por proposta do Governo, seja por iniciativa do Parlamento". Isto foi a 2 de abril deste ano.
Pouco depois de decorridos os anunciados dois meses, a 20 de junho, o Primeiro-Ministro e a Ministra da Justiça apresentaram a Agenda Anticorrupção. Nessa mesma ocasião, logo foi anunciado que o Governo iria sujeitar a consulta pública o relatório técnico que densifica e desenvolve o conjunto de medidas, objetivos ou simples ideias que constam da mesma Agenda. A consulta pública ocorreu entre os dias 2 julho e 12 de agosto.
Volvidos 6 meses da posse do Governo, 4 meses do anúncio da Agenda Anticorrupção e quase 2 meses do fim da referida consulta pública, em que ponto estamos?
Neste período, apenas uma única proposta de lei foi apresentada, que se insira no âmbito dos objetivos definidos na Agenda Anticorrupção. Mas na lógica do combate à corrupção, não será o exemplo mais paradigmático, já que se tratou de uma proposta de lei de autorização legislativa, para que o Governo pudesse regular a citação e notificação por via eletrónica das pessoas singulares e das pessoas coletivas, determinando que a citação e notificação das pessoas coletivas é, em regra, efetuada por via eletrónica.
É verdade que neste ínterim ocorreu o tão nacional "depois meteu-se agosto". E daqui a pouco "mete-se o Natal". Mas se não era para "andarmos todos ao ritmo de uma justiça lenta", talvez o ritmo a que o Governo segue, até ver, não seja o melhor exemplo. E também para quem não queria governar para a propaganda, são poucos os resultados, até ver, apresentados.
Não se ignoram os relevantes passos dados na área da Justiça por este Governo, desde logo nos acordos estabelecidos com os sindicatos dos funcionários judiciais ou dos guardas prisionais ou a forma como se ultrapassou um protesto de muito duvidosa legalidade, da iniciativa do Conselho Geral da Ordem dos Advogados.
Mas não há como não ver as coisas de outro modo: é pouco.
Falando só em exemplos que conheço diretamente e suficientemente contemporâneos, continuamos num sistema processual:
Que tolera que um processo com acusação dada em dezembro de 2021, sem que tenha ocorrido sequer fase de instrução, só tenha julgamento agendado para dezembro de 2024 – sim, três anos entre uma coisa e outra, sem instrução pelo meio;
Que permite que um inquérito dure mais de 12 anos, sujeito a "aceleração" processual durante mais de 7 anos, em que o prazo para conclusão do inquérito possa ser renovado sem limite mais de 20 vezes;
Que convive pacificamente com o facto de um requerimento de abertura de instrução só seja apreciado dois meses depois de apresentado e que cinco meses depois daquele primeiro momento, não haja ainda sequer uma data para um debate instrutório;
Que vive bem com o facto de um despacho dado por um juiz em junho só seja notificado aos seus destinatários quase 4 meses depois;
Que aceita que o despacho que aceita um recurso apresentado em dezembro de 2023, só seja notificado a quem recorreu quase seis meses depois;
Que consente que um julgamento terminado com acórdão de setembro de 2022 e recursos interpostos em novembro de 2022, em outubro de 2024 não haja ainda apreciação de tais recursos;
Etc., etc., etc.
As reformas necessárias para acelerar a tramitação do processo penal devem ser ponderadas e estruturadas. No tempo próprio. Sem dúvida. Mas há coisas tão simples e tão imediatas de percecionar e com certeza suficientemente pacíficas de acolher, que impressiona que, nesta altura, nada de verdadeiramente palpável tenha sido apresentado no plano legislativo.
No meu texto de junho ("O aproximar da meia-idade da justiça processual penal: breve contributo para refletir sobre pontuais correções legais"), já apresentava algumas sugestões nesse sentido. Alguns exemplos: "um retorno ao prazo supletivo de 5 dias" para o processo penal; transferir "o contraditório sobre a constituição como assistente para um eventual recurso da decisão que o admita"; "assegurar que a apresentação extemporânea de documentos no decurso do julgamento não tenha um efeito suspensivo da sua marcha"; abolir a exigência de "parecer do Ministério Público, após a subida do recurso ao tribunal superior, ao qual se reconhece o direito de resposta em 10 dias". No conjunto de soluções que aí apresentei eram retirados, pelo menos, 53 dias à marcha regular de um processo penal.
Restringir "a obrigatoriedade do debate instrutório apenas às situações onde é requerida, e é deferida, a produção de prova na fase de instrução", substituindo-o, eventualmente, pelo "dever de notificação dos demais sujeitos processuais não requerentes da instrução para, querendo, no mesmo prazo em que esta pode ser requerida (20 dias), exercerem o contraditório sobre as questões suscitadas no requerimento de abertura de instrução";
Suprimir a "obrigatoriedade de a decisão instrutória ser "lida" pelo juiz de instrução, em ato público e presencial", substituindo o ato de leitura pela "notificação – preferencialmente eletrónica – da decisão instrutória";
"[D]deixar expressa a possibilidade de apresentação de peças processuais por meios eletrónicos, incluindo o correio eletrónico";
"[L]imitar a possibilidade de o Ministério Público indicar, como testemunhas, agentes e membros dos órgãos de polícia criminal que, no decurso da fase de inquérito, tenham intervindo em diligências documentadas de obtenção de prova, quando o resultado dessas diligências esteja também documentado e seja passível de valoração autónoma pelo tribunal de julgamento";
"[E]liminação da obrigatoriedade de formulação de conclusões de recurso", nomeadamente pelo potencial entorpecimento na marcha processual que a deficiente estruturação de conclusões implica;
Fixação de "consequências processuais – além das já consagradas, de teor essencialmente gestionário e disciplinar – para a ultrapassagem dos prazos legais de duração máxima do inquérito, mormente o estabelecimento da caducidade do exercício da ação penal".
Custa acreditar que ao fim deste tempo o Governo não esteja em condições de traduzir em iniciativas legislativas todos os contributos que os partidos ou os agentes da justiça lhe apresentaram em nome da celeridade processual, por todos desejada.
O que foi concretizado em meio ano, repito, é pouco. É pouco face ao que foi assumido como compromisso governativo e é pouco à luz do que a Justiça Penal carece e do que Agenda Anticorrupção estabelece como meta(s).
Na tomada de posse do Governo, o Primeiro-Ministro dizia que "[p]recisamos de uma justiça que ande ao ritmo das pessoas e das empresas, ao invés de andarmos todos ao ritmo de uma justiça lenta". A propaganda é boa. Faltam "apenas" os resultados.
Meio ano de Governo e o estado da Agenda Anticorrupção e da Justiça Penal
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