O problema é um Presidente que deixa a sua ordem de retirada de pendões sobre a fachada da Assembleia ser flagrantemente desrespeitada e que nada diz quando uma bancada se ergue de cartazes em riste no final de uma votação.
Pode ou não pode? Eis a questão. Esta dicotomia foi celebrizada pelo confronto entre a líder parlamentar do PS, Alexandra Leitão, e o Presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar Branco, que entende que os deputados podiam classificar uma etnia de "burra ou preguiçosa". Depois de numa semana, a extrema-direita ter pendurado faixas pelas janelas da Assembleia e prometido "limpar" a esquerda como Jaime Neves queria "limpar" comunistas, a bem da nossa democracia, vale a pena refletirmos bem sobre como se trata a extrema-direita dentro do Palácio de São Bento.
A forma de o fazer no Governo foi, mais uma vez este ano, tema de campanha eleitoral. Ainda que rodeado de quem defendia uma colaboração com o CHEGA, Montenegro soube na campanha repetir "não é não" vezes suficientes para ser credível para os portugueses. Assim que o PSD empatou as eleições, a cantiga apareceu em formato "remix" – era preciso negociar com "todos, todos, todos". Ainda antes dos encontros secretos para discutir o Orçamento, a estratégia do PSD era usar o CHEGA para eleger Aguiar Branco, trocando a firmeza de Santos Silva por um laissez-faire que não chateasse Ventura, por um lado, e, por outro, lhe negasse o protagonismo que tanto quer.
Na hora da verdade, não correu bem assim. O CHEGA roeu a corda e o PAR teve de ser eleito para meio mandato por uma maioria excecional com o PS. Aos dias de hoje, vale a pena perguntar – quem diria? Bem vistas as últimas semanas, Aguiar Branco parece nunca ter deixado o fito de demonstrar à extrema-direita que merecia mesmo o seu voto.
Não me refiro à duplicidade de critérios com que o Presidente da Assembleia da República governa aquela que devia ser a casa de todos. Ainda esta semana isso ficou patente na forma como mandou calar Isabel Mendes Lopes, que protestava a intervenção de André Ventura a ameaçar os deputados da esquerda, mas ouviu penhoradamente a fúria de Hugo Soares com acusações que um deputado do CHEGA dirigia ao Governo Regional da Madeira. Em ambos os casos, o alvo era o CHEGA, só mudava o protestante – num caso da oposição, no outro do seu partido, cujo apoio para as eleições presidenciais tão sequiosamente corteja.
Tampouco me apoquentam as admoestações de Aguiar Branco ao conteúdo das intervenções parlamentares, nomeadamente para prevenir que os deputados saúdem o público e se tratem por tu. Por muito que possamos desejar um mais nobre exercício do magistério parlamentar, é recomendável que em augustas câmaras como esta se preservem o decoro e os bons costumes. No limite, até podemos concordar com Ana Sá Lopes quando esta refere que a "limpeza" que Ventura prometeu à esquerda era de natureza apenas metafórica.
Tudo isto, em isolado, até podia ser relativo. O problema é que vem tudo junto. O problema é que, para cada vez que Aguiar Branco é forte nas miudezas, ele é muito fraco com os fortes. O problema é um Presidente que deixa a sua ordem de retirada de pendões sobre a fachada da Assembleia ser flagrantemente desrespeitada e que nada diz quando uma bancada se ergue de cartazes em riste no final de uma votação. À medida que a extrema-direita vai testando as águas a cada vez mais um bocadinho, a consequência da reiterada impunidade torna-se a paulatina instauração da anarquia.
À anarquia soma-se a distorção dos valores que devíamos tomar por garantidos. Como é que um "primus inter pares" não tem um sobressalto quando um deputado promete "limpar" outros tantos – por muito metafórico que seja (ou talvez, enquanto o for). Em que planeta pode a ofensa generalizada ao povo turco ser mais tolerável que a crítica política, por mais histriónica que seja, de que "um Governo é tão ladrão como o anterior"?
Por tudo isto e mais algumas coisas, poder-se-ia dizer que Aguiar Branco enquanto Presidente da Assembleia da República não cumpre. Enganar-nos-íamos bem, porém, ao não compreender a lógica, intencional ou acidental, que a sua administração errática cumpre – o branqueamento diário do comportamento do CHEGA e a sua progressiva normalização na nossa democracia. Sobre isso, talvez a história de outros povos, a começar pela República Romana, nos explique o quão perigoso pode ser o caminho.
Em 2022, um artigo científico comparou 441 estimativas de 42 diferentes estudos. A sua conclusão foi de que não podem rejeitar a hipótese de uma descida de IRC não ter impacto no crescimento. Isto quer dizer que, mesmo depois de 441 estimativas, não podemos ter a certeza que exista.
Por todo o Estado, há sinais de escassez gritante de pessoal. Faltam dois mil guardas prisionais. Já na carreira de enfermaria faltam 20 mil profissionais. A isto poderíamos somar a falta de médicos no SNS.
Governo perdeu tempo a inventar uma alternativa à situação de calamidade, prevista na Lei de Bases da Proteção Civil. Nos apoios à agricultura, impôs um limite de 10 mil euros que, não só é escasso, como é inferior ao que anteriores Governos PS aprovaram. Veremos como é feita a estabilização de solos.
Estou farto que passem por patriotas aqueles que desfazem e desprezam tudo o que fizemos, tudo o que alcançámos e, sobretudo, tudo o que de nos livrámos – a miséria, a ignorância, o colonialismo.
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Brigitte e Emmanuel nada têm a ganhar com este processo que empestará ainda mais a atmosfera tóxica que rodeia o presidente, condenado às agruras políticas de um deplorável fim de mandato
Esta ignorância velha e arrastada é o estado a que chegámos, mas agora encontrou um escape. É preciso que a concorrência comece a saber mais qualquer coisa, ou acabamos todos cidadãos perdidos num qualquer festival de hambúrgueres