Óscares 2022. Os cães ladram, a caravana passa (pelas dunas)
O crítico de cinema Pedro Marta Santos crê que aconteceu (quase tudo) como devia e avisa: "Malta nova não quer saber de sexagenários em smoking a brandirem bonecos banhados a oiro".
Aconteceu tudo como se previa (ou quase tudo). O Poder do Cão de Jane Campion, cortesia do maior estúdio de Hollywood – perdão, do gigante do streaming – Netflix, lidera o sprint aos Óscares de 2022 com doze nomeações. Elas incluem Melhor Filme, Melhor Realizador (Jane Campion, a primeira mulher a ser duas vezes indicada ao prémio de direção após o debute com "O Piano" em 1993), Melhor Ator (Benedict Cumberbatch, provável vitorioso), Melhores Secundários (o casal no ecrã do smartphone e na vida real Jesse Plemons/Kristen Dunst), e Melhor Argumento Adaptado. Logo atrás desta bela matilha neozelandesa está o exercício faustoso de antecipação científica em regime de messianismo ecológico, Duna, a partir da epopeia literária de Frank Herbert, supostamente impossível de filmar depois do desastre financeiro do projeto homónimo de David Lynch em 1984. Pelos vistos, para a Academia, o filme (na realidade, a primeira parte de um díptico ou de uma trilogia que mais parece um trailer de 150 minutos) não terá sido dirigido por ninguém, já que o presenteia com dez nomeações mas o realizador, o wunderkind canadiano Denis Villeneuve, não figura na lista de Melhor Realizador. Nela estão o grande cineasta da América no último quartel do século XX, Steven Spielberg (é a oitava vez, graças à revisitação do clássico musical West Side Story), o grande cineasta da América nas primeiras duas décadas do século XXI, Paul Thomas Anderson, o veterano Kenneth Branagh pelo autobiográfico Belfast (primeira individualidade da História a ser nomeado em sete categorias distintas, ao longo de uma carreira de quatro décadas) e o japonês Riûsuke Hamaguchi, autor da única obra verdadeiramente excecional da lista (ainda não vi Licorice Pizza, fica um forte benefício da dúvida). Juntam-se todos à festa, de novo presencial – será no recentíssimo Dolby Theatre de Los Angeles, a 27 de março -,com emissão televisiva pelo canal aberto ABC (prevêem-se ratings miseráveis; malta nova não quer saber de sexagenários em smoking a brandirem bonecos banhados a oiro) e vários mestres de cerimónias, para impedir os pecadilhos sexistas ou étnicos.