Economistas explicam fraco crescimento do PIB
Fragilidade do sector financeiro português, fraca conjuntura económica mundial e desaceleração do investimento são apontados como causas
A economia portuguesa cresceu 0,9% no segundo trimestre face ao período homólogo e 0,3% em relação ao trimestre anterior, segundo o INE, que reviu hoje em alta em 0,1 pontos percentuais cada um dos valores.
O Governo antecipou que o Produto Interno Bruto (PIB) crescesse 1,8% este ano, uma projecção mais optimista que as do Fundo Monetário Internacional (1,4%), da Comissão Europeia (1,5%) e do Banco de Portugal (1,3%).
As várias respostas apontam para as restrições orçamentais, para a fragilidade do sector financeiro português, para a fraca conjuntura económica mundial e para a desaceleração do investimento.
O professor da Universidade Católica João Borges Assunção começa por dizer que o PIB português apresenta ainda "um crescimento muito débil", devido ao "problema do défice público e do endividamento do Estado", mas também à "crise do BES que certamente está a pesar no financiamento da economia e portanto no investimento" e aos "problemas de capitalização do sistema financeiro".
Borges Assunção, que lidera o Núcleo de Estudos de Conjuntura da Economia Portuguesa (NECEP), da Universidade Católica, cuja previsão de crescimento é de 0,9% para 2016, considera que "é uma grande dificuldade superar as dificuldades dos vários choques financeiros a que Portugal tem sido sujeito desde 2010".
Sublinhando que o Orçamento do Estado para 2017 "vai ser muito importante" porque o Governo dará aí informação actualizada sobre o que espera ainda para o resto de 2016, Borges Assunção espera que este documento permita esclarecer os objectivos do executivo para o próximo ano, uma vez que "não são muito claras quais são as intenções do Governo em termos de política orçamental" para 2017.
Também a analista do BPI Paula Carvalho reconhece que "existem riscos no sentido descendente" e, apesar de o banco manter a projecção de um aumento de 1,3% do PIB em 2016, admite que possa ficar apenas "próximo de 1%".
Quanto aos riscos existentes, a analista destaca sobretudo "o andamento da economia global": "A conjuntura externa continua com dificuldades de crescimento, existem problemas específicos em mercados importantes para Portugal, como é o caso de Angola e do Brasil, e mesmo nas restantes economias, o nível de crescimento global está muito baixo", afirma.
Se a nível externo Portugal enfrenta uma "envolvente muito desafiante", a analista do BPI identifica constrangimentos também na frente interna e diz que Portugal não está ainda a conseguir aproveitar as "condições favoráveis" actuais.
"Internamente existem factores que à partida deveriam impulsionar o crescimento da procura interna, nomeadamente o facto de se estar à espera de devolução de rendimentos em alguns sectores da economia e o facto de os preços do petróleo e dos combustíveis continuarem em níveis tão baixos. No entanto, tem havido alguma dificuldade de tirar partido dessas condições favoráveis", afirmou.
Ainda no plano doméstico, Paula Carvalho antecipa que a política orçamental se mantenha "como uma restrição ao crescimento porque os níveis de dívida pública são muito elevados", antevendo que este instrumento "nunca poderá ser francamente expansionista, de suporte ao crescimento, porque os mercados externos estarão lá para recordar que [o país tem] essa restrição activa".
Já o director da Nova School of Business and Economics (Nova SBE), Daniel Traça, identifica três factores que estão a penalizar o crescimento económico: as exportações abrandaram, o investimento está a cair e o consumo privado está aquém do que se esperava.
O professor argumenta que as exportações "estão a crescer menos do que no passado", sobretudo devido aos mercados angolano e brasileiro, e que o investimento "teima claramente em crescer abaixo do que era esperado", devido ao "extremo endividamento das empresas" e ao facto de a imagem de Portugal lá fora estar a ser penalizada tanto por notícias negativas como pelas notas dos bancos internacionais, o que "tem gerado menos atractividade para os investidores externos".
Quanto ao consumo privado, Daniel Traça reconhece que esta era uma componente do PIB onde se esperava um melhor desempenho, "sobretudo depois das políticas fiscais e orçamentais para dar mais capacidade aos portugueses para consumirem", e diz que isso não tem acontecido porque o aumento do consumo está a verificar-se "sobretudo a nível dos bens importados", o que prejudica o desempenho da actividade como um todo.
Além disso, o director da Nova SBE refere que "os portugueses têm pouca poupança", pelo que "provavelmente estão a usar algum desse acréscimo de rendimento para pagarem dívidas", mas espera que "a prazo se possa gerar um crescimento" no consumo das famílias.
Olhando para a segunda metade de 2016, Daniel Traça entende que o comportamento da economia vai depender do desempenho dos outros países europeus e também da capacidade de Portugal criar uma imagem externa de "estabilidade e de previsibilidade" e antecipa que o consumo privado possa dar "uma ajuda maior do que deu no passado".
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