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Revelação: Pinto da Costa deu a casa como garantia para FC Porto não sair da UEFA

Carlos Torres 09 de setembro de 2025 às 13:12

Novo livro aborda o último período do reinado de Pinto da Costa e o primeiro ano de Villas-Boas à frente do FC Porto. E traz revelações: das dificuldades financeiras à guerra com Conceição, do porquê de alguns negócios à contratação falhada de Marco Silva.

A situação caótica do FC Porto na parte final da época 2017/18, que foi aflorada nos jornais na altura, é contada com mais pormenores no livro Capitão de Abril – André Villas-Boas e a Revolução Inacabada, da autoria de Octávio Lousada Oliveira e nas bancas a partir desta terça-feira, 9 de setembro (editado pela Oficina do Livro).
Pinto da Costa com Villas-Boas num momento de união no FC Porto
Curiosamente, a história até começa por surgir como uma troca de galhardetes entre os apoiantes de Pinto da Costa e de André Villas-Boas, como se pode ler no livro: “A situação crítica que a SAD enfrentava [em 2024] levou a que Villas-Boas (que já tinha abdicado de ter ordenado) lhe emprestasse 500 mil euros do seu próprio bolso logo no mês em que tomou posse” – dinheiro que seria devolvido “sem que fosse feito o pagamento de qualquer juro”. Aliás, Villas-Boas iria referir que o fez “de coração aberto” e em “resposta a uma situação urgente de tesouraria”. Ora, esta “demonstração de amor”, segundo os apoiantes de Villas-Boas, foi apontada pelos partidários de Pinto da Costa como um “ato de exibicionismo”. E, contrapõem com o que aconteceu em março de 2018, quando a SAD portista precisava de 3,5 milhões de euros para cumprir as imposições da UEFA no âmbito do settlement agreement e assim não ficar fora das competições europeias. Sem deixar sair jogadores no mercado de inverno, para tentar vencer o campeonato e impedir o tetra do Benfica (o que viria a acontecer), os dragões contavam com a entrada de dinheiro via o pagamento de um clube que não chegou e tiveram de arranjar soluções em apenas 24 horas. “Nessa altura, Pedro Pinho deslocou-se ao Banco Carregosa para arranjar esse dinheiro a título particular e a forma mais rápida de o conseguir passava por Pinto da Costa subscrever uma livrança. Contudo, a instituição bancária pedia uma garantia: a casa de Pinho. O empresário acedeu e reportou o sucedido ao presidente dos dragões. Em resposta, Pinto da Costa disse que se Pinho, que não era administrador, ‘oferecia’ a sua habitação como garantia, ele teria de fazer o mesmo. Assim aconteceu”, conta-se no livro Capitão de Abril. Pinto da Costa iria depois explicar a situação aos administradores Adelino Caldeira e Fernando Gomes, que se mostraram solidários. “A livrança no valor de 3,5 milhões de euros foi subscrita por Pinto da Costa, com aval de Gomes, Caldeira e Pinho, tendo sido apresentadas as casas de Pinto da Costa e Pedro Pinho como garantia. Pinto da Costa recebeu o empréstimo de 3,5 milhões do Banco Carregosa e cedeu-o ao FC Porto, que assim evitou entrar em incumprimento com a UEFA”. Quatro meses depois, já com o clube com maior desafogo financeiro, fruto da venda de jogadores como Ricardo Pereira (vendido por 22 milhões de euros), Diogo Dalot (22 milhões), Willy Bolly (12 milhões), Miguel Layún (4 milhões) e Gonçalo Paciência (3 milhões), o FC Porto “acertou contas com Pinto da Costa e, de seguida, o presidente liquidou a livrança com o Banco Carregosa". Este é um dos episódios mais surpreendentes contado em Capitão de Abril – André Villas-Boas e a Revolução Inacabada. Mas há outros casos relevantes neste livro, que aborda os últimos anos da presidência de Pinto da Costa, a Assembleia Geral de má fama, com agressões a adeptos portistas (em novembro de 2023), a campanha e as eleições de abril de 2024 (em que Villas-Boas acabou, de forma esclarecedora, com os 40 anos de reinado de Pinto da Costa) e ainda o primeiro ano da presidência de Villas-Boas. Sobre as eleições, há um dado bastante curioso: o de que Pinto da Costa percebeu, a certa altura da campanha, que iria mesmo ser derrotado pelo antigo treinador da “cadeira de sonho” – e que na época 2010/11, como treinador do FC Porto, levou o clube à conquista do campeonato, supertaça, Taça de Portugal e Liga Europa. Isso mesmo é contado a Octávio Lousada Oliveira por João Rafael Koehler, o nº 2 da candidatura do “presidente dos presidentes”, até porque algumas sondagens por eles encomendadas apontavam que André Villas-Boas tinha intenções de voto na ordem dos 70%. “O presidente sabia perfeitamente que a eleição estava perdida e quis fazer a campanha”, garantiu Koehler. “Era absolutamente inviável. E tivemos muitas conversas sobre isso, mas o presidente queria muito ir até ao fim”, continua, adiantando que “a 15 dias ou três semanas das eleições via-se que o presidente já estava abaixo de 28%” nas sondagens.
Pinto da Costa e Villas-Boas num estádio do FC Porto
O pós-eleições foi algo complicado, com o FC Porto a ter, na prática, dois presidentes, pois André Villas-Boas assumiu logo a presidência do clube, mas em relação à SAD a administração comandada por Pinto da Costa prolongou o prazo até ao limite legal. Pinto da Costa não aceitou a derrota de ânimo leve e só telefonou ao seu sucessor na manhã seguinte ao desaire eleitoral, aproveitando para o convidar a assistir na tribuna presidencial ao jogo entre o FC Porto e o Sporting. Sobre esse episódio, revela-se no livro, Villas-Boas recusou o convite, até porque já tinha dito que iria ocupar o seu lugar cativo junto dos sócios. Ainda assim, propôs outra solução: “Iria ter com Pinto da Costa ao camarote presidencial, desceriam juntos até ao campo e no centro do relvado dariam um abraço. Um símbolo de pacificação e de união para virar a página de uma campanha sangrenta. Sem grandes explicações, o ainda presidente recusou”. Em Capitão de Abril – André Villas-Boas e a Revolução Inacabada aponta-se ainda que, em relação à passagem de testemunho, o administrador Fernando Gomes “terá sido o único responsável portista solícito na passagem de pasta”. Com o até então administrador financeiro terão ocorrido várias reuniões, e “Fernando Gomes sentou-se regularmente à mesa com Pereira da Costa, que herdaria o pelouro financeiro da SAD, e também com Villas-Boas. Chegou, inclusivamente, a levar os dois futuros (e únicos) membros da comissão executiva ao Banco Carregosa devido à urgência da emissão de papel comercial”. A polémica saída de Sérgio Conceição dos dragões, ele que em sete anos conquistou 11 troféus, incluindo três campeonatos e quatro Taças de Portugal, também é abordada no livro. “O primeiro tête-a-tête entre Villas-Boas e Sérgio Conceição aconteceu a 30 de abril de 2024, no Olival, dois dias após a receção ao Sporting para o campeonato. Logo aí ficou claro que clube e treinador teriam de seguir caminhos diferentes, mas que voltariam a conversar no final da temporada para decidirem como consumariam o divórcio”. O encontro aconteceu a 30 de maio, em casa de Villas-Boas, e Sérgio Conceição “já iria pronto para a rutura, mas ainda quis testar o líder do clube acerca dos rumores dos potenciais sucessores no banco de suplentes”. Ora, Villas-Boas apontou vários cenários e não descartou que Vítor Bruno, o adjunto de Conceição, pudesse ser um deles. Aí, “Sérgio Conceição ficou em polvorosa”, até porque Vítor Bruno já lhe teria dito que pretendia dar os primeiros passos como treinador principal e até teria uma proposta do Qatar. Conceição, furioso com a traição, deu conta disso aos seus mais próximos, com o caso a passar para a comunicação social. A desvinculação do treinador a custo zero, como ele tinha apontado, esteve em perigo, pois “Sérgio considerava que lhe estava a ser cravada uma adaga nas costas” e poderia exigir que o clube lhe pagasse os quatro anos de contrato que ainda tinha (prolongado com Pinto da Costa na véspera das eleições). A questão, como se refere no livro, é que esta não era a primeira vez que Vítor Bruno era equacionado para ser treinador principal dos dragões. “O adjunto já tinha sido inclusivamente sondado por Pinto da Costa quando Sérgio Conceição, danado com a saída de Luis Diaz para o Liverpool, ameaçou embalar a trouxa e zarpar. Pior: o antigo presidente chegou a verbalizá-lo a um conjunto não muito reduzido de pessoas, argumentando que se tinha corrido bem uma vez (quando, em 2011, Vítor Pereira assumiu o lugar de Villas-Boas), não haveria razão para não voltar a correr”. Entre vários aspetos referidos no livro, não deixa de ser curioso perceber que André Villas-Boas, quando em maio de 2019 chegou a acordo para ser o treinador do Marselha, apontou logo ao presidente do clube francês, Jacques-Henri Eyraud, que só aceitava ficar à frente da equipa dois anos, porque a partir de 2021 queria começar a preparar-se para ser presidente dos dragões nas eleições de 2024 (como viria a suceder). Mais duas histórias curiosas: a primeira relacionada, com Marco Silva; a segunda referente à transferência de Galeno para o Sp. Braga. Em relação ao técnico português, que em 2017, após ter falhado a manutenção do Hall City na I Liga inglesa, chegou a ser apontado ao FC Porto, Octávio Lousada Oliveira conta que a 23 de maio desse ano jantou na casa de Pinto da Costa, que queria trazê-lo para o clube. Ora, lê-se, Pinto da Costa ficou mal impressionado com Marco Silva por este lhe “ter pedido uma semana para pensar e decidir”. Outro aspeto que desagradou ao líder portista foram as fugas de informação. “Uns dias mais tarde, o presidente do FC Porto confidenciará a alguns dos seus mais próximos que não gostou da atitude e da conversa de Marco Silva, que, vem a saber-se a 26 de maio, tem tudo encaminhado para continuar no Reino Unido, desta feita ao serviço do Watford”. Quanto a Galeno, o episódio aqui abordado poderá ser esclarecedor para muitos portistas que se intrigavam porque é que foi para o Sp. Braga por apenas 3,5 milhões de euros sem que lhe dessem uma oportunidade na equipa principal, apesar de se destacar ao serviço da equipa B. A questão é que, para inscrever Matheus Uribe na época 2019/20, o clube precisava de vender “para fazer face aos constrangimentos impostos pelo settlement agreement assinado com a UEFA”. “É necessário faturar cerca de 3,5 milhões de euros e Pinto da Costa recorre a Pedro Pinho para desbloquear a situação. Este enceta uma série de contactos e o Sp. Braga avança para a compra do brasileiro Wenderson Galeno por esse montante, ficando previsto no acordo que os dragões poderiam vir a readquiri-lo por 9 milhões de euros (o que aconteceria em janeiro de 2022, após a venda de Luis Diaz ao Liverpool)”.
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