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Vidas passadas, telepatia e outros enigmas chegam aos laboratórios

Raquel Lito 23 de maio de 2025 às 07:00

Em contexto laboratorial, comprova-se que alguns médiuns acedem a informações sobre pessoas falecidas. A experiência é relatada à SÁBADO pelo neurocientista Nuno Sousa, coordenador científico do documentário "Para Além do Cérebro" (RTP). A intenção é levar a série sobre as várias dimensões da mente humana para o streaming.

É um campo desconcertante para os céticos, sejam investigadores ou o público em geral, devido à escassa evidência científica. A conta-gotas, enigmascomo a perceção extra-sensorial, a telepatia e as vidas passadas vão chegando aos laboratórios, no âmbito da parapsicologia. Ocientistas Gary Schwartz (da Universidade do Arizona) e Julie Beischel (do Centro de investigação Windbridge, no mesmo estado norte-americano) debruçaram-se sobre a capacidade dos médiuns acederem a informações sobre pessoas mortas.

D.R.

Para o efeito, usaram um dos mais rigorosos protocolos em termos de controlo experimental (o triplamente cego). Pretendiam eliminar explicações convencionais, como a sugestão inconsciente e a capacidade de ler o outro. O estudo foi replicado por equipas britânicas da Universidade de Northampton – quanto mais testado, melhor. E os resultados revelaram-se semelhantes (leia-se promissores): de facto, alguns médiuns obtêm informações sobre falecidos.

A atividade cerebral durante a sessão mediúnica foi analisada, já que a suposta comunicação espiritual provocava uma reação específica. Isto é, os padrões de atividade cerebral dos médiuns divergiam quando estavam a imaginar um falecido, a inventar uma história sobre ele ou a ler informações previamente conhecidas.

Experiências de "desenho rigoroso"

Esta é uma das descobertas mais surpreendentes, relatada à SÁBADO pelo professor catedrático na Escola de Medicina da Universidade do Minho, Nuno Sousa. O também membro da comissão executiva da Fundação Bial fala a propósito da série documental Para Além do Cérebro (transmitida às segundas-feiras, às 23h, na RTP), na qual é coordenador científico. "O meu papel foi ajudar a definir os temas e as pessoas com diferentes perspetivas científicas que pudessem contribuir, abordando as diferentes questões a partir de resultados científicos", diz.

A sua posição é de "ceticismo tranquilo", porque "a ciência não é feita de crenças", mas de factos resultantes "de experiências de desenho rigoroso."

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Foto: Mariline Alves
Foto: Ricardo Meireles/SÁBADO
Foto: D.R.
Foto: D.R.

Espera que o formato apoiado pela Fundação Bial – vai no segundo episódio, num total de 16 – abra caminho ao debate e à investigação: "Este é um tema menos conhecido e frequentemente associado (com justificação) a menor rigor. Ora, esse é precisamente o aspeto que queremos ajudar a mitigar."

Reação do público

Para já, o neurocientista mostra-se prudente sobre os primeiros resultados das audiências do programa de 30 minutos. "Ainda não temos uma análise rigorosa da reação do público à série. Têm sido recebidas muitas mensagens a expressar satisfação, outras, muito menos frequentes, a levantar algumas questões. Teremos de manter uma postura de rigor também neste domínio e não embarcar no facilitismo de retirar conclusões precipitadas e dizer que tudo foi excelente." 

Os números da recetividade do público são animadores, segundo Mário Augusto, o apresentador da série: mais de um milhão de visualizações na RTP Play. Porque hoje em dia as audiências espalham-se por vários meios, sejam a TV em direto, as gravações automáticas (via box), ou a internet. Na próxima semana, dia 26, quando passar o terceiro episódio haverá a novidade do podcast. Mário Augusto e Luís Portela (presidente da Fundação Bial e mentor da série) fazem uma introdução de cinco minutos sobre o conteúdo do programa. 

Mais lá para a frente, será lançado um site com divulgação das entrevistas, na íntegra, aos 50 cientistas de vários pontos do mundo que aparecem no programa. Pertencem a prestigiadas instituições, como a King’s College London, Universidade da Virgínia, Universidade de Liège ou Universidade de San Diego.

Universidades prestigiadas  

Tendo em conta os principais rankings, como o Times Higher Education World University Rankings ou o QS World University Rankings, há universidades que, consistentemente classificadas entre as 100 melhores do mundo, se dedicam à investigação na área. O neurocientista Nuno Sousa enumera algumas: a Universidade de Lund, na Suécia, com o trabalho do Etzel Cardeña e da sua equipa; a McGill University, no Canadá, pela equipa de Amir Raz (Jeremy Olson, Mathieu Landry); a Stanford University, nos EUA, que conta com a investigação de Michael Lifshitz; ou a Universidade de Adelaide, na Austrália, pelos estudos de Lance Storm.

Nuno Sousa menciona outras que, não estando no top 100, "são amplamente reconhecidas e bem classificadas". Exemplos: a Universidade da Virgínia, com a Division of Perceptual Studies (DOPS), que "estuda a possibilidade de sobrevivência da consciência após a morte", esclarece; ou a Universidade de Liège com análises acerca das experiências de quase morte e estados alterados de consciência. 

Intenção de chegar ao streaming 

Habituámo-nos a ver Mário Augusto a apresentar programas sobre cinema, por conseguinte, esta matéria tantas vezes negligenciada pela ciência seria improvável. Mas surgiu naturalmente em conversa de almoço com o amigo de mais de uma década, Luís Portela. O jornalista desafiou-o a fazer um programa, há seis anos, já que estudara o assunto para os seus livros (Ser Espiritual, por exemplo, que o autor lançou pela Gradiva em 2013). "Dava uma série fantástica, vale a pena arranjar uma equipa", disse-lhe Mário Augusto.

Luís Portela assim fez. Formou equipa para uma grande produção, que envolveu, entre outros profissionais, Paula Campos (coordenação); Ricardo Freitas (realizador); André Banza (edição). "A intenção é futuramente estar disponível no streaming", adianta à SÁBADO Mário Augusto. 

Gravada entre outubro de 2019 e maio de 2023, a produção teve uma pausa devido à pandemia. Levou quase um ano a editar e ficou concluída há cerca de oito meses. Mário Augusto diz que neste processo funcionou como "showrunner" (o dinamizador), frisa que o pai do projeto foi Luís Portela.

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