"Precariedade e salários de miséria" é o cenário na cultura
500 profissionais responderam a um inquérito sobre as condições de trabalho na cultura. Mais de metade dos trabalhadores nas áreas criativas e artísticas vive com dificuldades
O CENA - Sindicato dos Músicos, dos Profissionais do Espectáculo e do Audiovisual afirmou hoje, com base num inquérito ao qual responderam 500 profissionais, que o cenário dos artistas é de "precariedade e salários de miséria."
O dirigente do CENA, André Albuquerque, afirmou à agência Lusa que "o cenário que o inquérito traça é de precariedade e salários de miséria. Cerca de 66% dos trabalhadores destas áreas criativas e artísticas vivem uma situação de precariedade e 30% aufere anualmente entre zero e 1.500 euros."
O inquérito, a que responderam 500 profissionais, dos quais, 267, exercem actividade em Lisboa, foi realizado de 22 de Junho de 2015 a 30 de Janeiro de 2016.
O número de profissionais que mais aderiu tem idades entre os 29 e os 40 anos, sendo esta também, segundo investigação internacional, a idade de máxima ocupação nestas profissões, atesta Helena Vasques Carvalho, autora do relatório do inquérito.
Segundo o inquérito, 92% dos profissionais tem formação na respectiva área, tendo mesmo 70,6% formação académica específica.
Entre outras conclusões, o responsável do CENA realçou "a transversalidade", isto é, o facto de os profissionais estarem quase sempre envolvidos em mais do que uma área de emprego, e realçou que 50% trabalha a recibos verdes. Em termos de vínculo laboral, 22% tem contrato de trabalho sem termo, 12% a termo certo, e 16% sem vínculo ou "qualquer outro", sem especificação, segundo o inquérito. André Albuquerque desconfia que os denominados recibos verdes "escondem" uma situação de permanência, e não trabalhos temporários, e é nesse sentido que o CENA pretende um "reforço efectivo dos meios" da Autoridade das Condições de Trabalho. "Esta é uma das exigências imediatas para a área cultural", disse à Lusa o dirigente sindical João Barreiros.
Num documento assinado pelo CENA e o Sindicato dos Trabalhadores de Espectáculos (STE), hoje divulgado, as duas estruturas exigem à Assembleia da República que dê corpo "às reivindicações e aos direitos dos trabalhadores deste sector", nomeadamente "a necessidade de um aumento efectivo do Orçamento do Estado para a Cultura, tendo como meta urgente 1%".
Outra exigência é a criação de um regime de contratação dos profissionais do espectáculo e do audiovisual, que os enquadre na Lei Geral do Trabalho, "o acesso a contratos de trabalho -- a termo certo, incerto ou sem termo", por forma a reconhecer garantidamente a protecção social "que o Estado tem obrigação de cumprir, retirando a estes trabalhadores a exclusividade das obrigações para com a Segurança Social, e permitindo-lhes a opção de rescindir ou não o vínculo laboral". Esta exigência, defendeu João Barreiros, iria contribuir para criar estabilidade de pessoal e profissional.
Os dois sindicatos exigem o "fim dos recibos verdes na administração pública e local" e "a conversão dos falsos recibos verdes em contratos de trabalho, integrando uma acção geral de combate à precariedade"
CENA e STE pretendem ainda a revisão dos concursos de apoio à criação artística, "tornando obrigatória a garantia dos direitos laborais" e "uma nova regulamentação dos ensinos artísticos que permita (...) o mais amplo acesso" e aos professores "estabilidade no trabalho e no salário".
Este documento foi subscrito por cerca de mil personalidades de diferentes áreas, do teatro à música, como a Almeno Gonçalves, Carla Bolito, JP Simões, Maria Anadon, Pedro Penilo, Rita Lello, Sérgio Godinho, aos quais se juntaram ainda cidadãos anónimos.
O CENA já expôs todas estas exigências aos grupos parlamentares, à excepção do PS, com quem se reunirá ainda esta semana, contando também encontrar-se em breve com o ministro da Cultura, João Soares.
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