Secções
Entrar

Gronelândia quer processar Dinamarca por colocação não consentida de DIU's

Leonor Riso 03 de outubro de 2023 às 08:00

Milhares de mulheres sofreram intervenção quando eram crianças e algumas perderam a capacidade de engravidar.

Dezenas de mulheres da Gronelândia pretendem colocar a Dinamarca em tribunal devido à introdução não consentida nem informada de dispositivos intrauterinos (DIU) nos anos 60 e 70. Algumas tinham 12 anos quando sofreram a intervenção e sofreram problemas graves de saúde, perdendo a capacidade de ter filhos.

Emil Helms/Ritzau Scanpix/via REUTERS

Estima-se que 4.500 crianças e jovens tenham sido afetadas. Um grupo exige uma indemnização do estado dinamarquês, no qual se integra a Gronelândia, por terem sofrido uma "violação" com grandes consequências nas suas vidas. Em 2022 Aki-Matilda Høegh-Dam, uma das duas deputadas da Gronelândia no parlamento dinamarquês, considerou que o sucedido se enquadra na definição de "genocídio".

Nos anos 60, a população da Gronelândia tinha uma grande taxa de crescimento do mundo, mas não é claro por que razão é que a Dinamarca achou isso ameaçador. A opção do DIU serviu para reduzir os nascimentos, mas as jovens não eram bem acompanhadas por um médico depois da intervenção e muitas só descobriram décadas mais tarde que tinham o dispositivo médico. Este causava dores graves, hemorragias internas e infeções abdominais e muitas acabaram por remover o útero. Quanto mais cedo lhes era colocado o DIU, mais problemas de saúde afetavam as pessoas, porque o útero ainda não se tinha formado completamente.

Naja Lyberth é psicóloga e foi das primeiras a denunciar a situação, há seis anos. A ela, num grupo de Facebook, juntaram-se dezenas de mulheres. No caso de Naja, foi-lhe introduzido o DIU na escola, quando era adolescente.  

"Descobri que eu não tinha 14 anos, mas só 13, quando me colocaram o DIU", relatou ao site ArcticToday. "Quando entrei na menopausa, sofria de fortes dores menstruais e muitos sintomas recordavam-me das dores que experienciei quando me colocaram o DIU. Mais uma vez, senti que algo era demasiado grande para o meu corpo, tal como as ferramentas ginecológicas e o DIU na altura. O meu corpo, o meu útero, todo o meu abdómen reagiu."

Nos anos 60, os DIU não eram pequenos dispositivos em forma de T: eram muito maiores e em forma de S.

Naja Lyberth aponta que os advogados acreditam que "os nossos direitos humanos e a lei foram infringidos", no que foi uma "esterilização concertada". A psicóloga teve dificuldades em engravidar mas conseguiu, aos 35 anos. Muitas mulheres não o puderam fazer.

O governo dinamarquês e o Naalakkersuisut (administração da região autónoma) já abriu um inquérito sobre o sucedido, e os resultados são esperados em maio de 2025. Os primeiros dados só vieram a público em 1991, quando o setor da saúde passou a ser gerido pela administração autónoma. Até 1953, a Gronelândia foi uma colónia da Dinamarca e depois foi integrada no reino.

No início dos anos 70, a taxa de natalidade na Gronelândia caiu 50%.

"Podemos estabelecer agora as nossas fronteiras. Podemos recuperar os nossos recursos e lutar pela igualdade. Não éramos de todo iguais na Gronelândia quando nos fizeram aquilo. Nunca o teriam feito na Dinamarca às raparigas dinamarquesas", lamenta Naja Lyberth.

Artigos Relacionados
Descubra as
Edições do Dia
Publicamos para si, em três periodos distintos do dia, o melhor da atualidade nacional e internacional. Os artigos das Edições do Dia estão ordenados cronologicamente aqui , para que não perca nada do melhor que a SÁBADO prepara para si. Pode também navegar nas edições anteriores, do dia ou da semana.
Boas leituras!
Artigos recomendados
As mais lidas
Exclusivo

Operação Influencer. Os segredos escondidos na pen 19

TextoCarlos Rodrigues Lima
FotosCarlos Rodrigues Lima
Portugal

Assim se fez (e desfez) o tribunal mais poderoso do País

TextoAntónio José Vilela
FotosAntónio José Vilela
Portugal

O estranho caso da escuta, do bruxo Demba e do juiz vingativo

TextoAntónio José Vilela
FotosAntónio José Vilela