A Edição Diária no seu e-mail
De Sábado a Sábado, receba no seu e-mail um resumo das notícias mais relevantes do dia.
Subscreva Já
Cancro do Pulmão: "Achei que era um engano, nunca fumei. Sou doente terminal há três anos"
No mês de sensibilização para este tipo de tumor, Filipe Paixão conta na primeira pessoa como recebeu o diagnóstico e a importância de haver um rastreio. Fez recentemente 40 anos e não sabe por quanto tempo conseguirá desafiar as estatísticas. O cancro do pulmão é o que mais mata, justamente porque a maioria se descobre muito tarde.
Fez 40 anos no passado dia 12 de outubro e há precisamente três anos - poucos dias antes do seu aniversário - recebeu um diagnóstico que julgava impossível para uma pessoa como ele. Filipe Paixão nunca fumou e achava que só os fumadores tinham cancro do pulmão. Estava enganado e quer sensibilizar outras pessoas como ele a estarem atentas - daí a razão deste testemunho. Até porque, quanto mais cedo for o diagnóstico, maiores são as possibilidades de sobrevivência. O informático, que vive em Fernão Ferro, e tem uma filha de 8 anos, tem desafiado as estatísticas, mas sabe que um tumor como o seu - que está no estadio mais avançado de todos - não tem bom prognóstico. Conta à SÁBADO na primeira pessoa como tem sido viver com a doença, e mais recentemente enfrentar os efeitos secundários, e também fala da importância de se implementar o rastreio em Portugal.
Filipe Paixão, doente terminal de cancro do pulmão, apela ao rastreio precoce em Portugal
DR
As terapias deixam de funcionar
Como não tinha mais sintomas, e a situação do cérebro estava tratada, avancei logo para a terapia alvo [medicamento dirigido às células cancerígenas]. Tive sorte, mais uma vez: havia uma terapia para a mutação que tenho, com grande eficácia a remover metástases cerebrais. Fiz esse tratamento durante nove meses, um comprimido chamado osimertinib, e foi uma maravilha! Reduziu as metástases no cérebro, fiquei com apenas três, limpou totalmente o osso ilíaco e o pulmão também ficou melhor. Não tinha efeitos secundários nenhuns, podia fazer tudo sem qualquer restrição. Só que essa terapia alvo deixou de funcionar. Esse é o problema do cancro: as terapias deixam de funcionar, o cancro consegue contornar. Comecei a urinar sangue, fizeram-me exames e viram que o cancro estava completamente espalhado – passou para o pulmão, para o rim e no cérebro, quando já só tinha três metástases pequenas, passaram a ser 12. Foi então que iniciei a terapia que hoje ainda estou a fazer, trata-se de um anticorpo monoclonal. Para simplificar, até porque a administração é da mesma forma, é como se fosse outro tipo de quimioterapia. Sou o primeiro doente na Europa a fazer este tratamento fora de um ensaio clínico – está aprovado pela Agência Europeia do Medicamento, mas ainda não pelo Infarmed. Estou a fazê-lo através do privado, chama-se amivantamab.
Filipe Paixão defende rastreio do cancro do pulmão no Parlamento Europeu
DR
A morte sempre presente
O lema é um dia de cada vez. A morte passou a estar muito presente na minha vida, transformei-me num velhinho de 90 anos. Não fisicamente, mas por essa noção de finitude, porque tenho a morte sempre presente. Em dezembro combinei ir com a minha filha e a minha mulher a Paris, mas a verdade é que não sei se poderei ir. Começo a pensar que se continuar assim dificilmente conseguirei. É por isso que tipicamente não faço planos com tanta antecedência. Por exemplo, em janeiro, tive uma perfuração do estômago. O meu estômago rasgou-se e as dores eram tão insuportáveis que nem a morfina aliviava. Felizmente, foi possível fazer uma cirurgia por laparoscopia, com aqueles furinhos, e só perdi 10% do estômago, nem sequer é significativo. Estou completamente recuperado, mas podia ter sido muito mau – estava a evoluir para uma septicemia [infeção generalizada], já tinha comida espalhada pelos outros órgãos. O cancro é mesmo 50% sorte e 50% medicina. Faço questão de dar a cara, em primeiro lugar, por causa do estigma em relação ao cancro do pulmão. Em Portugal só existe cancro da mama. Não tenho nada contra mamas, mas os pulmões estão mesmo por trás, como costumo dizer na brincadeira. A verdade é que este estigma fomos nós que os criámos. Nos anos 80 passavam anúncios na televisão a dizer que fumar era bom – incentivou-se o consumo. E agora os doentes oncológicos são vistos como os culpados da doença, porque causaram a doença a eles próprios.
Faço questão de dar a cara, em primeiro lugar, por causa do estigma. Em Portugal só existe cancro da mama. Eu não tenho nada contra mamas, mas os pulmões estão mesmo por trás, costumo dizer na brincadeira.
Filipe Paixão, doente de cancro do pulmão
Mas esse estigma arrasa completamente o cancro do pulmão, porque há muitos doentes com este tumor que nem sequer dizem a ninguém. Então, os homens escondem-se imenso e até recusam tratamento. Há pessoas que se entregam completamente. Daí que seja também importante transmitir a importância do rastreio. O cancro do pulmão é o que me mais mata no mundo inteiro porque a maioria dos diagnósticos é tardio. O que altera por completo a taxa de sucesso – é uma diferença de 80 para 5%.
Uma pessoa diagnosticada num estadio I [inicial] tem 80% de probabilidade de estar viva ao fim de cinco anos; enquanto no meu caso, no estadio terminal, as estatísticas são 5%. O rastreio do cancro do pulmão ainda não chegou a Portugal; nos Estados Unidos já existe desde 2012. Mesmo com pouca adesão, só 10% das pessoas elegíveis (é preciso ter mais de 50 anos, ser fumador, entre outros critério), reduziu a mortalidade em 24%.
Não tenho aquela coisa muito americana de uma lista de coisas que quero fazer, mas fiz uma cápsula de tempo para a minha filha. Comprei um baú grande e pus lá coisas para ela abrir em 2035. Quer eu esteja cá, quer não. Tem lá jornais do dia em que ela nasceu, um leitor de Blue Ray onde será possível ver mensagens que vou programando para lá deixar para determinadas datas. Estão lá também os ursinhos que ela usava quando era bebé e o bibe da creche.
Obviamente, se estiver cá para abrir isso com ela seria ótimo. Já desafiei muito as estatísticas, mas conheço pessoas em estadio IV, como eu, com 20 anos de sobrevivência – existem quatro numa fundação americana a que pertenço, a LUNGevity.
E se eles conseguiram, e a medicina está sempre a evoluir, pode ser que eu também consiga. Há sempre essa esperança."
Artigos Relacionados
Descubra as
Edições do Dia
Edições do Dia
Publicamos para si, em três periodos distintos do dia, o melhor da atualidade nacional e internacional. Os artigos das Edições do Dia estão ordenados cronologicamente aqui ,
para que não perca nada do melhor que a SÁBADO prepara para si. Pode também navegar nas edições anteriores, do dia ou da semana.
Boas leituras!
Boas leituras!
Artigos recomendados
As mais lidas
Rita Matias anuncia casamento com segurança de André Ventura e mostra despedida de solteira
10 de novembro de 2025 às 09:22CM
Montenegro patrocina suspeito de corrupção
11 de novembro de 2025 às 23:00Carlos Rodrigues Lima
Sete municípios vão ficar sem eletricidade no domingo: saiba se será afetado
06 de novembro de 2025 às 13:01Luana Augusto
Médico oftalmologista com pensão de 9.500 euros
09 de novembro de 2025 às 09:44SÁBADO
Várias pessoas hospitalizadas em base militar norte-americana após abertura de pacote com pó branco
07 de novembro de 2025 às 10:06Isabel Dantas