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Governo quer "política afirmativamente antirracista"

14 de agosto de 2020 às 15:31

Secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, Rosa Monteiro, diz que é necessária uma "política sistemática abertamente e afirmativamente antirracista".

Os mais recentes acontecimentos relacionados com o tema do racismo em Portugal vieram mostrar que é necessária uma "política sistemática abertamente e afirmativamente antirracista", defendeu hoje a secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade.

"É hora de estruturarmos política sistemática abertamente e afirmativamente antirracista", que vá mais longe do que a atual abordagem da interculturalidade e da integração, afirmou Rosa Monteiro, em declarações à Lusa, na Presidência do Conselho de Ministros.

Apesar dos "constrangimentos muito fortes" que a pandemia de covid-19 impôs às "prioridades" do Governo, "esse tema não ficou, de maneira nenhuma, de parte", assegurou.

Porém, "pelas piores razões", o tema do racismo está agora na ordem do dia. "Há como que um reconhecimento nacional de que estamos, de facto, numa situação de ameaça da nossa democracia e da nossa segurança. E isso, obviamente, tem de ser mobilizador de discursos políticos e de narrativas políticas, não só de repúdio, mas afirmativos do lado em que se está e o lado tem de ser o da defesa dos direitos humanos", sustentou Rosa Monteiro.

O Governo está a elaborar um "plano de ação intersetorial", que mobilize as várias estruturas de política pública de forma a responder a "um problema transversal", adiantou. O plano não tem prazo para estar pronto, mas resulta de um "compromisso" do Governo, frisou, referindo que uma das apostas é a produção de estudos sobre discursos e crimes de ódio.

É preciso "rever o lastro histórico" e analisar "as representações coletivas, as conceções fundas e os microrracismos que nem são apercebidos como tal", mencionou.

"Há um caminho muito grande a fazer na educação, formal e não formal, para falar da tal questão estrutural. Temos de intervir em largo espetro em vários setores", disse a secretária de Estado.

"Um dos fatores estruturantes é o conhecimento e a informação" e, por isso, Rosa Monteiro lamenta a "perda de oportunidade" de não se ter incluído uma pergunta sobre a origem étnico-racial no próximo censos populacional, hipótese chumbada pelo Instituto Nacional de Estatística em junho de 2019, apesar de o grupo de trabalho formado pelo Governo ter recomendado a sua inclusão.

Outra das medidas passa por uma maior autonomização da Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial (CICDR), que "sempre esteve a funcionar" e a analisar queixas e cuja comissão alargada já retomou as reuniões em julho.

Estratégia é a palavra chave de Rosa Monteiro para a resposta ao "ambiente quente" que se vive atualmente no país.

"Se em vez de andarmos sempre com a questão de ver quem é que diz em primeiro lugar ou que Portugal não é racista, ou que Portugal é racista, e isso os próprios ativistas também já o reconhecem, é demonstrar o que é que nos nossos comportamentos individuais, coletivos e institucionais são sinais de discriminação", afirmou.

Portugal destacava-se, até aqui, como não tendo "políticos que publicamente e expressamente fazem afirmações racistas e xenófobas", recorda. "Deixámos de ter esse ambiente e isso é um caldo e um gatilho para (...) legitimar um conjunto de comportamentos e de incitamentos ao ódio", observou.

A pandemia reforçou "a perceção do medo e da insegurança, que cria muita instabilidade individual e coletiva e agudiza também as condições para a emergência destes grupos, que segregam, querem pôr uns contra outros", constatou.

Sobre o mais recente caso, envolvendo ameaças a três deputadas e sete ativistas por uma autoproclamada "Nova Ordem de Avis -- Resistência Nacional", que reivindicou também uma ação junto à associação SOS Racismo, Rosa Monteiro frisa que este tipo de grupos e movimentos "põem em risco a segurança de todas as pessoas".

"Isto não é um problema das pessoas racializadas, é um problema meu e seu e de todas as pessoas, de toda a sociedade. Se passarmos numa rua, a uma determinada hora, em que um grupo mascarado, com tochas, ameaça ou, pela sua presença, transmite uma mensagem ameaçadora, se vivermos naquela rua como é que nos sentimos? Esta não é sociedade em que queremos viver, não é sociedade que queremos para os nossos filhos e filhas", vincou.

A secretária de Estado lembrou que "aquilo que é do domínio do crime e da organização terrorista tem de ser investigado com os meios próprios que o Estado democrático tem para o fazer".

Rosa Monteiro garante que "todos os casos" envolvendo racismo em Portugal foram acompanhados por "uma Polícia Judiciária absolutamente comprometida, altamente qualificada". E reitera: "Podemos confiar na qualidade e na competência e, essencialmente, no comprometimento democrático e cívico desta força [policial], naquilo que é um combate que tem de ser estratégico e que tem de ser firme."

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