Secções
Entrar

Esquema de sobrefaturação existia em todas as messes da Força Aérea

09 de janeiro de 2019 às 20:52

Segundo a acusação do MP, pela sobrefaturação na aquisição de bens alimentares e matérias-primas para a confeção de refeições nas messes da FAP e do Hospital das Forças Armadas, os militares envolvidos recebiam dinheiro e presentes dos fornecedores, em função da intervenção de cada um.

O major Rogério Martinho disse esta quarta-feira em tribunal que o esquema de corrupção, que passava pela sobrefaturação no fornecimento de bens alimentares, "existia em todas as messes da Força Aérea", acusando os arguidos que o negarem de "mentir".

"O esquema de sobrefaturação existia em todas as messes daForça Aérea. Estes meus camaradas que continuam a negar, não sei se se vão continuar a negar, mas que não admitem, estão a mentir", afirmou o oficial, aludindo aos outros militares arguidos no processo Operação Zeus, com 68 arguidos, 30 dos quais militares e 38 civis, entre empresas e pessoas individuais, que começou na segunda-feira no Tribunal de Sintra.

Rogério Martinho, major atualmente na reserva, chefe da messe da Base Aérea n.º 5 (BA5), em Monte Real, Leiria, entre 2013 e 2015, foi o primeiro dos arguidos a prestar declarações no julgamento do processo sobre corrupção nas messes da Força Aérea.

Na primeira sessão, apenas mais dois dos 30 arguidos militares manifestaram vontade em prestar declarações perante o coletivo de juízes: o sargento-ajudante António Paulo (subordinado de Rogério Martinho) e o capitão Orlando Pinheiro.

Na sessão desta quarta-feira, a defesa de outros arguidos, nomeadamente a do capitão Luís Oliveira, informou que o seu constituinte também vai querer falar em julgamento. O major Rogério Martinho apontou o capitão Luís Oliveira como o homem que passava pelas messes da Força Aérea Portuguesa (FAP) dispersas pelo país para levantar os envelopes com o dinheiro proveniente do esquema, para ser depois distribuído pelos elementos da Divisão de Abastecimento e Transportes (DAT), chefiada à data, pelo major-general Raul Milhais de Carvalho, considerado pelo Ministério Público como o "cabecilha" do esquema de corrupção.

O major Rogério Martinho, que quarta-feira continuou a ser ouvido, referiu que tomou conhecimento de que o esquema de sobrefaturação era transversal a todas as messes da FAP, após ter assumido, em 2013, a gestão da messe da BA5

"Era uma coisa [esquema de corrupção] enraizada. Não era preciso falar. Bastava olhar. Estava no automático", relatou o oficial, sublinhando que "este problema não pode denegrir a imagem" da FAP, que tem "muita gente boa".

O arguido contou ainda que o capitão Luís Oliveira era apenas "um correio" que fazia a "coleta" [levantamento dos envelopes com o dinheiro para a DAT, em Alfragide, Amadora] pelas unidades da FAP, com o objetivo de o entregar aos superiores hierárquicos da DAT.

O oficial na reserva contou que, quando era capitão, competia ao major-general Milhais de Carvalho, fazer o trabalho do capitão Luís Oliveira, de recolha dos envelopes com dinheiro.

Rogério Martinho relatou ainda que os envelopes com dinheiro eram entregues diretamente pelos fornecedores da messe da BA5 a si ou aos seus dois subordinados, sargentos António Gouveia e António Paulo, acrescentando que esses envelopes eram colocados num cofre e abertos quando houvesse uma quantia considerável.

Nesse momento, este arguido explicou que fazia "três montes" e que dizia aos dois sargentos para levantarem, aleatoriamente, um dos maços. Questionado várias vezes pelos advogados de outros arguidos, Rogério Martinho reiterou que, entre 2013 e 2015, ele e os seus dois subordinados terão arrecadado 60.000 euros cada um.

O oficial na reserva disse ainda que foi o capelão da Força Aérea que o "encorajou" a dizer toda a verdade, quando se encontrava preso preventivamente, em Tomar, ressalvando, que já tinha essa vontade de contar a verdade dos factos.

A audição do major Rogério Martinho prossegue na segunda-feira.

A audiência de quarta-feira ficou ainda marcada por momentos de tensão entre Carlos do Paulo, advogado de Rogério Martinho, e advogados de outros arguidos, quando o seu constituinte estava a ser questionado por um dos advogados.

Sem mencionar nomes, Carlos do Paulo falou em "cinismo e hipocrisia", o que provocou visível desagrado e desconforto aos restantes advogados, dando azo a uma troca de acusações entre advogados e à intervenção da presidente do coletivo de juízes, Susana Marques Madeira, que interrompeu a sessão por alguns minutos.

Descubra as
Edições do Dia
Publicamos para si, em três periodos distintos do dia, o melhor da atualidade nacional e internacional. Os artigos das Edições do Dia estão ordenados cronologicamente aqui , para que não perca nada do melhor que a SÁBADO prepara para si. Pode também navegar nas edições anteriores, do dia ou da semana.
Boas leituras!
Artigos recomendados
As mais lidas
Exclusivo

Operação Influencer. Os segredos escondidos na pen 19

TextoCarlos Rodrigues Lima
FotosCarlos Rodrigues Lima
Portugal

Assim se fez (e desfez) o tribunal mais poderoso do País

TextoAntónio José Vilela
FotosAntónio José Vilela
Portugal

O estranho caso da escuta, do bruxo Demba e do juiz vingativo

TextoAntónio José Vilela
FotosAntónio José Vilela