A ilusão do Ocidente
A ameaça russa já começa a ter repercussões concretas no terreno. É disso exemplo as constantes e descaradas incursões de aeronaves russas, principalmente drones, em território europeu.
A ordem mundial não está a desmoronar-se. Ela já acabou e nós ainda não temos a coragem de o admitir. Em lado algum é isso mais claro do que na Europa, que já foi palco e raiz de tamanha guerra e sofrimento ao longo dos séculos dos séculos. A Administração americana faz do Velho Continente o seu recreio: para organizar a paz em torno de negócios pessoais e intrometer-se nas democracias europeias, apoiando movimentos sociais e partidários que suportem a sua visão do mundo. Enquanto isso, retraem as garantias de segurança. Não é só a presença de militares americanos na Europa do Leste que se vai reduzir. É o ensurdecedor silêncio de um aliado perante a ameaça de Putin invadir.
Essa ameaça já começa a ter repercussões concretas no terreno. É disso exemplo as constantes e descaradas incursões de aeronaves russas, principalmente drones, em território europeu, com consequências diretas, por exemplo, no funcionamento dos aeroportos. Já teve, claramente, impactos económicos, na forma de uma crise inflacionista, que trouxe grandes custos sociais e políticos a governos de várias cores. Nenhum custo será maior do que a evidência de que, além das debilidades económicas tão bem diagnosticadas por Mario Draghi, a Europa está dividida, sem agência nem rumo, num mundo crescentemente multipolar.
A primeira pergunta que devemos colocar é de que nos vale a aliança atlântica aos dias de hoje. Ela tem de servir para mais do que obrigar a Europa à compra de material militar ou como uma promessa de defesa coletiva apenas entre europeus. No curto prazo, precisamos ainda da intelligence norte-americana e de peças para o material armado que já temos. Todavia, fica pouco claro que mais podemos regatear a uma Administração que nos é abertamente hostil. Nessa aliança em desmoronamento, faltará saber o que se fará se, por exemplo, a Estónia, ou parte dela, for o próximo. Honraremos o artigo 5.º ou vai cada país ter uma noção diferente dessa obrigação?
A segunda questão a refletir é que paz queremos. A história um dia rezará de como a Rússia pós-soviética começou a sua ofensiva em 2008 na Geórgia, prosseguiu-a na Crimeia em 2014 e consolidou-a na Ucrânia em 2022. Tal como em 1938, condenaremos os apaziguadores que acreditavam em ceder território a troco de um cessar-fogo, em sacrificar povos para uma paz fácil num território distante ao qual se pode aplicar uma lógica de esferas de influência. Ao contrário de Chamberlain, os lideres de agora não terão a seu favor o argumento de que compraram tempo para capacitar a Europa para a guerra. Estes últimos 3 anos foram absolutamente desperdiçados, nem se encomendando o que demora tempo a construir nem criando capacidade industrial para cá os produzir.
O terceiro desafio para a Europa está em como financiar a guerra. E não haja dúvidas: nós estamos já em guerra. Ao longo da história, muitas foram as maneiras de o fazer mas nenhuma foi tão contraproducente como fazê-lo à custa dos cidadãos, através de impostos mais altos ou de serviços públicos piores. Há pelo menos 50 anos que os estrategas militares sabem que a batalha mais importante não são com soldados. São os “hearts and minds” (corações e cabeças) das pessoas. Deve ser por isso que, nos próximos anos, enquanto despejamos dinheiro à barda em armamento, a Europa se prepara para impor, de uma só vez, o fim do PRR, cortes na Política de Coesão, cortes na Política Agrícola Comum e uma nova dose de austeridade nacional, imposta pelas novas regras orçamentais. Por muito bons que sejam os líderes políticos, não há tecido social que sobreviva a isto.
O quarto e último eixo que a Europa não pode ignorar é o que fazer com os outros BRICS. Este conjunto de países, que mesmo após a invasão da Ucrânia nunca quebrou ligações com o Kremlin, tem, nos últimos anos, investido (literalmente) forte e feio no reforço das suas ligações diplomáticas, usando o dinheiro e a sua capacidade de construção como isco para nações mais pequenos e indefesas. Hoje a China e a Índia também já não são apenas operários numa fábrica global a competir pelo baixo preço. São criadores de ciência e até de tecnologias de produção, do qual Portugal e a Europa não pode ficar de fora. Num mundo multipolar, o truque não é tanto em ir exigindo alinhamento geopolítico, quando este pode ser múltiplo e circunstancial. Também não é de despejar dinheiro em feiras sem feirantes. As parcerias que faremos no mundo devem ser baseadas profundamente em ouvir. Não vale a pena também querermos armar uma guerra com todos ao mesmo tempo.
A Europa não precisa de mais discursos comovidos. Precisa de visão, coragem e investimento: não só militar, mas social, industrial e estratégico. Se queremos garantir a paz, temos de nos preparar para defendê-la com meios próprios, firmes nas nossas alianças mas senhores do nosso destino. E se queremos respeito no mundo multipolar, teremos de o conquistar não com apelos vazios, mas com exemplos concretos. Essa é a Europa que faz falta e é por ela que vale a pena lutar.
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