Se antigamente consumíamos notícias directamente dos jornais, rádio e televisões, hoje, fazemo-lo nestas novas plataformas, onde o modo como consumimos informação é influenciado directamente pela arquitectura dos algoritmos.
Estamos a viver uma «Revolução de Gutenberg 2.0». Tal como, no século XV, a invenção da máquina de impressão por tipos móveis por Johannes Gutenberg transformou radicalmente a forma como a informação era disseminada e consumida na Europa, hoje, a internet e — sobretudo — as redes sociais estão a alterar profundamente a dinâmica da comunicação no espaço público. Como a imprensa de Gutenberg então, estas novas plataformas vieram alargar o acesso a informação que era, até há pouco tempo, controlada por um grupo restrito (no caso, os órgãos de comunicação social). Mas, ao fazê-lo, estão, tal como nesse período, também a espalhar desinformação e a gerar tensões sociais de impacto futuro imprevisível.
A primeira grande mudança que a invenção da imprensa no século XV, primeiro, e, hoje, as novas plataformas provocaram foi a desintermediação da informação. Com a imprensa de Gutenberg, informação que anteriormente era controlada exclusivamente pela elite dos monarcas e do clero (pois só podia ser copiada manualmente), passou a ser poder ser produzida e difundida, através de livros e panfletos, por uma população muito mais ampla (embora ainda, aos olhos de hoje, restrita), sedenta de informação e de poder participar no espaço público. Hoje, a internet e as novas plataformas vieram desintermediar ainda mais a informação, retirando a instituições como os media a função (e privilégio) de "gatekeepers" do sistema que até aí tinham, em que decidiam que informação chegava, e de que forma, ao grande público. Actualmente, qualquer pessoa pode criar conteúdo, expressar opiniões e potencialmente alcançar audiências de milhões através das redes sociais, do Whatsapp, do Youtube ou de podcasts.
Esta mudança tem enormes benefícios. Basta pensar nas páginas que seguimos através das redes sociais ou nos podcasts que escutamos, a que, no mundo pré-internet, jamais teríamos acesso. Mas também traz impactos negativos — e, pelo menos no curto prazo, estes são mais exuberantes. Com efeito, o resultado mais visível desta desintermediação da informação tem sido o aumento da desinformação, transmitida online sem qualquer validação dos antigos "gatekeepers". Curiosamente, também quem presenciou o impacto da invenção da imprensa na Europa da Idade Moderna se queixava do aumento da informação de veracidade duvidosa. Hoje, este fenómeno é porventura ainda mais potente, dado o potencial destas novas tecnologias e as novas ferramentas, como a Inteligência Artificial, que possibilitam a criação de deep fakes e outros tipos de manipulação digital.
E a Revolução de Gutenberg 2.0 tem também um impacto que lhe é específico: a alteração no modo como consumimos a informação. Se antigamente consumíamos notícias directamente dos jornais, rádio e televisões — pois nem tínhamos alternativa —, hoje, fazemo-lo nestas novas plataformas, onde o modo como consumimos informação é influenciado directamente pela arquitectura dos algoritmos. Estes estão construídos de forma a maximizar o nosso tempo online e, para isso, filtram os conteúdos que nos chegam para os adaptar às nossas preferências. Tendem, assim, a produzir as chamadas "câmaras de eco", um ambiente no qual consumimos informação menos diversificada, mais alinhada com a nossa visão, propiciando a simplificação e radicalização de opiniões. O resultado é uma fragmentação da esfera pública, em que diferentes grupos vivem em realidades paralelas, incapazes de dialogar de forma construtiva.
Os paralelos entre a revolução de Gutenberg e a era que vivemos estendem-se também ao impacto na sociedade e na política. Tal como a imprensa foi fundamental para a disseminação de novas ideias, desde o Protestantismo de Lutero a novas visões políticas, também as novas plataformas de hoje vieram abrir espaço para o surgimento de novas ideologias — e de ideias antigas até aí reprimidas pelas normas sociais das elites — desde visões puramente anti-sistema (como os anti-vacinas) ao populismo radical de direita e a nova esquerda "woke".
E tal como a invenção da imprensa pôs em causa a autoridade das instituições tradicionais, também a revolução 2.0 tem abalado, em segmentos crescentes da sociedade, a confiança nas instituições. Os media, os partidos mainstream e até a ciência são hoje cada vez mais postos em causa, à medida que as pessoas procuram contacto direto com "fontes" menos institucionalizadas, desde políticos carismáticos a youtubers e influencers com forte capacidade de comunicação. Estas figuras oferecem uma sensação de autenticidade e proximidade com que os media tradicionais, cinzentos e distantes, têm dificuldade em competir.
E os paralelos não terminam aqui. Assim como as novas ideias veiculadas pela imprensa de Gutemberg incendiaram a Europa daquele período — resultando, em alguns casos, em conflitos, como as guerras religiosas do século XVI, um dos conflitos mais longos e mortíferos da História humana — também hoje assistimos, em muitos países, a uma fragmentação identitária, a um tribalismo crescente a guerras (por ora) culturais entre diferentes facções.
Olhando para os vários elementos deste quadro — desde o aumento da desinformação até estas novas guerras culturais — é, de facto, difícil deixar de notar os paralelos com a Europa do século XVI. Estamos, como então, a viver uma revolução, de consequências, positivas e negativas, difíceis de prever para os seus contemporâneos. Nessa antiga Europa em transformação, a Revolução de Gutenberg provocou guerras religiosas e o surgimento de nacionalismos. Mas também contribuiu fortemente para que, dois séculos depois, despontasse o Iluminismo e, com ele, as ideias que dariam lugar às democracias-liberais contemporâneas. Será que a "Revolução de Gutenberg 2.0" também trará, a prazo, progresso social, gerando sociedades de cidadãos mais informados e participativos, e governos mais eficazes e menos corruptos? E, mais importante, será possível aprender com a História e conseguir obter esses benefícios sem ter de passar pelo equivalente moderno às guerras religiosas? A resposta a estas perguntas ainda está por definir, mas uma coisa é certa: estamos a viver um processo de transformação social e política que irá redefinir as sociedades em que vivemos. E estamos todos a assistir da primeira fila.
Revolução de Gutenberg 2.0: como a internet e as redes sociais vão transformar a sociedade em que vivemos
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