Não há dúvidas que o documento merece um aplauso pelo esforço compilatório, e que os pontos que identifica são, em grande medida cruciais para a resposta securitária que queremos dar.
Como sabemos, há pouco mais de um ano, foi aprovada em Conselho de Ministros a tão badalada «Estratégia Integrada de Segurança Urbana», uma espécie de panaceia ou documento revolucionário que veio apontar, finalmente, as tão desejadas respostas e caminhos que devem ser dados para combater o fenómeno da segurança urbana. E não deixa de ser curioso que o actual Governo tenha vindo a secundar a sua aprovação, cunhando a dita estratégia, por partilhar, parece-nos, da sua inusitada singularidade, tendo integrado inclusive especialistas que acompanharam de perto a sua criação.
Perdoem-nos, mas não podemos acompanhar de tamanha euforia tendo em conta que o documento, denso e pormenorizado, pouco ou nada acrescenta de novo ao que de muito já vinha a ser feito e que estava, há muito, consolidado no quadro de uma exigente e necessária intervenção multi focal, multi disciplinar ou multi nível, como lhe quisermos chamar, reclamando um esforço integrado [é verdade] de várias entidades públicas e privadas no sempre difícil quadro da segurança urbana, hoje a ocupar um espaço de especial preocupação no seio da população, com vários interlocutores a apontar para a sua aparente deterioração.
Num primeiro momento o dito plano aponta-nos para três figurinos que assumem particular relevância na geometria simbiótica que deve existir entre os mais diversos actores. Desde logo os Conselhos Municipais de Segurança, que têm berço normativo num diploma de 1998 (Lei 33/98, de 18 de Julho) onde, para além da Força de Segurança e representantes políticos, têm assento no mesmo uma miríade de entidades ligadas à protecção civil, à educação, segurança social, cultura, desporto, segurança rodoviária e até sector económico – cf. art.º 3.º-B da lei citada. É aqui que, pelo menos duas vezes por ano, se discutem preocupações, sindicam opções e alinham estratégias locais. Até aqui nada de novo. Depois destaca-se, e bem, a importância dos Contractos Locais de Segurança (CLS) que são edificados em detalhados diagnósticos locais de segurança para o qual todas as entidades que acabámos de elencar contribuem, de forma a evidenciar os problemas que merecem maior atenção, ao mesmo tempo que se apontam soluções integradas para os mesmos. É neste sentido que a PSP actua, contribuindo com planos locais de acção, onde espelha, com base numa competente avaliação de risco e de gestão de oportunidades, os principais objectivos e opções operacionais a materializar nas suas áreas de intervenção. Isto é assim já há quase duas décadas, remontando os primeiros ao já longínquo ano de 2008, seguindo o famoso constructo de Governação Integrada (GOVINT). Desde então os CLS não pararam de se massificar em dezenas de concelhos por todo o país, fomentando uma linha de intervenção em larga escala, onde vários actores, não só a Polícia, contribuem activamente na resposta aos problemas locais de segurança.
De seguida, e tendo como bandeira a proximidade, o documento fala-nos da «Dimensão proactiva operacional», onde recenseia vários programas sectoriais de actuação que, curiosamente, todos eles, já tinham visto a luz do dia, tendo anos de operacionalização, desde o reconhecido programa Escola Segura, aos Idosos em Segurança, passando pela segurança no desporto ou saúde, e acabando no programa noite segura, criado na sequência da morte trágica do Agente Fábio Guerra. Estes programas foram sendo desenvolvidos pela PSP em resultado de uma definição estratégica de prioridades de actuação resultante de uma aturada análise de áreas, sectores ou tipologias de risco ou vulnerabilidade. A estratégia não vem pois, per se, adiantar nada de novo aos inúmeros programas já em curso.
Para finalizar, e com realce dado à visibilidade policial, ainda que com alargamento conceptual a outros domínios, este documento perpassa o seu guião normativo pela (i) necessidade de actuações conjuntas e melhoria da articulação entre Forças de Segurança e Polícias Municipais, um assunto recente e amplamente discutido, pela (ii) carência no aproveitamento de sistemas de informação e novas tecnologias como o Sistema Integrado de Geolocalização (SIG) terminando com (iii) o reforço dos sistemas de videovigilância, um tema que tem ocupado imenso o espaço público, e ainda da incorporação de sistemas de alarmística, tudo a favor de uma estratégia mais tech-policing em vez do tradicional man-policing. Mais uma vez, nenhuma destas ideias é inovadora e alerta apenas para problemas e carências do passado, já bastas vezes referenciadas.
Não há dúvidas que o documento merece um aplauso pelo esforço compilatório, e que os pontos que identifica são, em grande medida cruciais para a resposta securitária que queremos dar. Mas só apontar o óbvio não chega, designadamente a necessidade de termos uma resposta multifária, que envolva e agremie todos os actores que têm responsabilidade em promover a segurança urbana, exigindo deles um compromisso sério e total para o cumprimento destes desígnios mas, mais do que isso, é preciso ter presente que a Polícia, em concreto a PSP, para poder desempenhar o seu principal papel, de Polícia que vigia, protege e responde, com proximidade às pessoas, com uma visibilidade [quase] omnipresente e com uma eficácia na responsabilização dos infractores, precisa rapidamente de um investimento sério no recrutamento e na incorporação rápida de instrumentos e tecnologias que lhe permitam cobrir eficientemente todas estas linhas de actuação.
Em 2022, de cerca de 3 milhões e 600 mil euros foram executados pouco mais de 600 mil euros, representando assim uma miserável taxa de execução de 18%.
Não podemos continuar a almejar uma Polícia forte e respeitada, quando somos os primeiros a não respeitá-la, não respeitando os tremendos profissionais que nela trabalham, ajeitando as carreiras de uns, enjeitando as carreiras de outros, gerando assim uma incompreendida iniquidade.
Não há dúvidas que o documento merece um aplauso pelo esforço compilatório, e que os pontos que identifica são, em grande medida cruciais para a resposta securitária que queremos dar.
É caso para dizer que a igualdade aqui não tem lugar, e que os Polícias só têm de aguentar a chacina de uma horda sedenta de sangue que, sem pejo, ousa vestir a túnica do juiz e o traje do carrasco, condenando à fogueira sem direito a defesa, sem direito a contraditório, sem direito a justiça.
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