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Como é que Israel pode responder ao reconhecimento da Palestina por parte dos seus aliados?

Débora Calheiros Lourenço 23 de setembro de 2025 às 07:14

Benjamin Netanyahu tem sugerido que o reconhecimento da Palestina vai originar uma resposta unilateral que pode incluir a anexação de partes da Cisjordânia.

A França e a Arábia Saudita esperam que a Assembleia Geral das Nações Unidas, que está a decorrer em Nova Iorque, leve a comunidade internacional a focar-se na solução dos dois Estados para tentar resolver o conflito israelo-palestiniano. Para isso vários países ocidentais, tradicionalmente aliados de Israel, incluindo Portugal, Canadá, Austrália e o Reino Unido, estão a juntar-se à maioria global dos Estados, quase 150 países, que já reconheceram a Palestina.  
Reconhecimento da Palestina por aliados gera resposta de Israel AP Photo/Nasser Nasser, File
No entanto os esforços para impulsionar a solução de dois Estados enfrentam obstáculos, nomeadamente a oposição dos Estados Unidos e de Israel. Exemplo deste tipo de oposição é a proibição, por parte dos Estados Unidos, de autoridades palestinianos estarem representadas na Assembleia Geral da ONU ou as ameaças de Benjamin Netanyahu de que o reconhecimento da Palestina vai originar uma resposta unilateral que pode incluir a anexação de partes da Cisjordânia.  “Israel precisa de entender que a solução de um Estado, com a subjugação do povo palestinianos sem direitos, é absolutamente intolerável. Sem uma solução de dois Estados, não haverá paz no Médio Oriente”, defendeu António Guterres, secretário-Geral da ONU, a semana passada.  Também na semana passada, Netanyahu esteve reunido com o secretário de Estado norte-americano Marco Rubio e considerou que o reconhecimento internacional do Estado palestiniano é um ataque a Israel: “Está claro que, se ações unilaterais forem tomadas contra nós, isso convida a ações unilaterais da nossa parte”.   Israel e os Estados Unidos têm considerado que a pressão internacional para que o Estado da Palestina seja reconhecido internacionalmente é uma recompensa para o Hamas e que torna mais difícil chegar a um acordo para terminar a guerra e recuperar os reféns levados para Gaza no 7 de Outubro. Israel também defende que a criação de um Estado palestiniano vai permitir ao Hamas realizar outro ataque semelhante ao 7 de Outubro, mas numa escala maior. A realidade é que, tal como Israel não reconhece o Estado da Palestina, o Hamas afirma defender a destruição total de Israel, ainda assim alguns membros já afirmaram que aceitam um plano de dois Estados nos moldes de 1967.  Israel e o Hamas estavam a negociar um cessar-fogo mediado pelos Estados Unidos e pelo Qatar que fracassaram mais uma vez depois de Israel ter atacado os negociadores do Hamas no Qatar no dia 9 de setembro. Anteriormente já tinha existido outras duas tentativas de negociações, sem qualquer sucesso além da troca de reféns israelitas por prisioneiros palestinianos.  

Uma solução de dois Estados que nunca foi alcançada 

A criação de um estado palestiniano em Jerusalém Oriental, na Cisjordânia e em Gaza tem sido considerada, nas últimas décadas, como a única forma de resolver o conflito, que começou há mais de um século. A ideia tem por base que a existência de um Estado palestiniano permite que Israel exista enquanto democracia com maioria judaica e que os palestinianos possam ter um território onde vivam sem o controlo israelita.   As negociações de paz negociações de paz do início da década de 1990 fracassaram, incluindo os Acordos de Oslo, apesar da aparente iniciativa de reconciliação devido à violência que se sentia, tanto nos territórios palestinianos como nos israelitas, e que levou à expansão dos colonatos israelitas. Desde que Netanyahu regressou ao poder, em 2009, não existiram mais iniciativas ou negociações para a paz ou para a solução dos dois Estados. Na realidade as relações diplomáticas piorarem desde então uma vez que Israel anexou Jerusalém Oriental, que deveria fazer parte do Estado palestiniano, e passou a considerá-la como a capital e aprovou a construção de mais colonatos.   Neste momento a Cisjordânia ocupada é casa para mais de 500 mil colonos israelitas e cerca de três milhões de palestinianos, que veem muitas áreas da sua vida controlada pelos militares israelitas uma vez que a Autoridades Palestina tem uma autonomia muito limitada. Exemplo disso são os checkpoints (pontos de controlo, em português) que muitos palestinianos têm de percorrer diariamente para se conseguirem deslocar para os seus trabalhos ou para visitarem familiares.   Depois dos ataques de 7 de Outubro, as operações de retaliação de Israel em Gaza já causaram 65 mil mortos, segundo os dados da Hamas, e deixaram deslocados cerca de 90% da população. Os ataques, que estão a ocorrer de forma praticamente ininterruptamente há quase dois anos, deixaram grande parte do território inabitável e a precisar de grandes obras de reconstrução. Além disso o Quadro Integrado de Classificação de Segurança Alimentar, principal autoridade mundial em crises alimentares, já decretou que o enclave vive uma .   O governo de Netanyahu, assim como a maior parte da classe política israelita, já se opunha à criação de um Estado palestiniano mesmo antes do ataque do Hamas em 2023 e o governo de Trump não demonstrou qualquer interesse em retomar as negociações para a paz, preferindo apresentar um plano para a realocação de grande parte da população de Gaza para outros países do Médio Oriente e a criação de um polo turístico, algo que Israel recebeu com entusiasmo apesar da reprovação do resto da comunidade internacional devido à preocupação quanto a uma possível limpeza étnica.  

O plano para o pós-guerra 

A França e a Arábia Saudita desenvolveram um plano faseado com vista a acabar com o conflito através do estabelecimento de um estado desmilitarizada governado pela Autoridades Palestiniana com apoio internacional. O plano prevê o fim de imediato da guerra em Gaza, o regresso de todos os reféns e a retirada completa de Israel, mas o Hamas teria de entregar a liderança do enclave a um comité independente, sob alçada da Autoridade Palestiniano, e depor as armas. O Hamas já concordou em ceder o controlo de Gaza, mas não em depor as armas.  À comunidade internacional caberia ajudar a Autoridade Palestiniana a reconstruir Gaza e a governar o Estado da Palestina, possivelmente até recorrendo a forças de manutenção da paz. No início deste mês os membros das Nações Unidas aprovaram uma resolução não vinculativa batizada de “Declaração de Nova York” relativa a este plano.  É esperado que com a paz em Gaza outros países árabes e muçulmanos normalizassem as relações com Israel, tal como é o caso da própria Arábia Saudita.   No entanto este plano deixou de fora algumas das questões mais importantes do pós-conflito como as linhas de fronteiras finais, a solução para os colonatos, o regresso dos refugiados palestinianos de conflitos passados e a situação de Jerusalém.   O plano prevê a realização de eleições palestinianas dentro de um ano, mas o presidente Mahmoud Abbas adiou as eleições anteriores utilizando como desculpa as restrições israelitas e ignorando que muitos palestinianos veem a Autoridade Palestiniana de ser corrupta e autocrática. 
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