Fenómeno de audiências na Netflix,Adolescênciaestá a tornar-se num caso sério: além de já ter sido vista pormais de 25 milhões de pessoas, está a demonstrar que é possível ter sucesso com uma tema sério tratado de forma séria. Estreada a 13 de março, já foi considerada a minissérie do ano, está na boca de toda a gente (para não falar nas pontas dos dedos que alimentam as redes sociais) e está nas homepages dos principais meios de comunicação de todo o mundo. Porquê?
A Netflix sabe a resposta a essa pergunta (e talvez só a tenha descoberto agora, mas a tempo) e está a demonstrar que, para ela, o segredo não é a alma do negócio. Na verdade, contar os segredos é que pode alavancar o negócio. Só isso explica que cinco dias após a estreia da série, a própria Netflix tenha decidido divulgar um vídeo (praticamente um documentário, que, para evitar spoilers, deverá ser visto depois do visionamento da série) sobre os bastidores de Adolescência.
É que a história de um alegado esfaqueamento perpetrado por Jamie, um adolescente britânico de 13 anos, com a consequente morte de Katie, colega de escola, não está a conquistar crítica e público só por ser uma minissérie bem feita. Na realidade, a exata forma como esta série foi feita (cada episódio filmado em plano-sequência, ou seja, num só take) é o que mais tem entusiasmado a audiência.
Stephen Graham (que acumula a escrita do argumento com a interpretação de pai de Jamie) e Jack Thorne não fizeram a coisa por menos: criaram uma minissérie com episódios de 50 a 60 minutos, todos filmados num só take. A ideia já estava a marinar na cabeça de Graham desde que tinha trabalhado com o realizador Philip Barantini em Boiling Point, um filme que começou por ser uma curta também filmada num só take.
Em Adolescência, como já explicaram (e se pode ver aos primeiros minutos do documentário da Netflix), a câmara andava de mão em mão como numa corrida de estafetas, era ligada e desligada de drones e passada entre os operadores que seguiam os actores dentro e fora de carros e casas. Os episódios foram marcados (ou seja, o lugar da acção definido) pelos criadores e pelo realizador sem a presença dos atores, que só entraram em cena para gravar, em alguns casos, tentarem gravar as cenas corridas.
"Mapeávamos tudo digitalmente e os movimentos de câmara, e depois era só ir para o cenário com os actores, estar presente e dançar", disse Barantini à Associated Press (AP). "É uma dança coreografada e algumas coisas têm de ser ajustadas, mas temos de estar abertos a isso."
Alguns pormenores são deliciosos. Como contaram à AP os criadores da série, para as cenas de esquadra foi construída uma esquadra da polícia e até o número de escadas teve de ser calculado para proporcionar um tempo de deslocação adequado a uma personagem e à quantidade de texto que esta teria de dizer.
O mesmo para a casa da família. Teve de ser encontrada uma casa que ficasse a três minutos de carro da esquadra da polícia. Mais: um armazém, encontrado nas proximidades, foi transformado numa loja de bricolage para que as que as personagens a pudessem visitar.
Numa lógica que se associa mais ao teatro que às séries ou ao cinema, Adolescência teve muitos ensaios. "[Até para os atores] Parece que estamos num espaço de teatro e não num espaço de televisão", disse o Ashley Walters (que interpreta o papel de detetive do caso) à Netflix. "Quando o comboio começa a andar ninguém o pode parar", explicou, para falar de como as cenas não podiam ter o habitual "corta!" para serem repetidas. O compromisso tinha de ser total - e de todos.