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Associação lança manual contra assédio no cinema e audiovisual

O manual inclui um conjunto de informações práticas para vítimas e testemunhas de assédio, sobre o que fazer, como fazer e a quem recorrer. "É o início de uma mudança que não pode esperar mais."

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Lusa 11 de junho de 2025 às 21:30
Ricardo Meireles

A associação Mulheres Trabalhadoras das Imagens em Movimento (Mutim) lançou esta quarta-feira um manual de boas práticas para o cinema e o audiovisual para esclarecer sobre assédio no setor e para que, no futuro, o manual já não seja preciso.

No lançamento do manual, hoje no Batalha -- Centro de Cinema, no Porto, a presidente da Mutim, Paula Miranda, explicou que o manual nasceu da constatação de que havia uma "falta de informação generalizada" no meio sobre o que constituía assédio, nas suas várias vertentes, e que apoios existiam para as vítimas.

Por isso, o manual -- redigido pelas investigadoras Ana Sofia Pereira e Camila Lamartine, com revisão jurídica de Leonor Caldeira e coordenação da direção da Mutim -- visa esclarecer sobre o assédio e sobre as boas práticas que podem ser implementadas, para que se torne algo comum nos locais de trabalho e, mais tarde, "já não seja preciso".

"O assédio, moral e sexual, no setor do cinema e do audiovisual, não se manifesta apenas através de comentários sexistas ou avanços inapropriados. Assume muitas faces: humilhação pública, intimidação, silenciamento, abuso de poder, exploração de trabalho gratuito ou mal pago, exclusão sistemática de determinadas vozes, desvalorização constante de profissionais. No cinema e no audiovisual, como em tantos outros espaços, estes comportamentos abusivos têm vindo a ser normalizados, tratados como parte da hierarquia, desculpados por serem resultado da 'pressão criativa', do 'ambiente de trabalho' ou da 'competitividade da indústria'", pode ler-se no começo do manual, que teve uma primeira tiragem de 500 exemplares, mas está disponível em PDF no 'site' da associação.

O manual inclui um conjunto de informações práticas, para vítimas e testemunhas de assédio, sobre o que fazer, como fazer e a quem recorrer.

"Este manual é apenas o início de uma mudança que não pode esperar mais", lê-se no documento, que acrescenta: "Não se trata de um problema individual: é estrutural e afeta toda a indústria. Exige respostas concretas, imediatas e coletivas. Vamos adentrar nesta revolução, vamos mudar o paradigma."

Na apresentação, Ana Sofia Pereira afirmou que o manual está escrito numa linguagem que pretende ser acessível, mas rigorosa, e para ser usado da maneira que seja necessária num dado momento específico: "Está feito para que as pessoas possam usar a parte que naquele momento lhes é útil, sempre com esta questão muito presente: a culpa nunca é da vítima ou sobrevivente".

O manual inclui um 'quiz', feito como "ferramenta de autocrítica", para que uma pessoa avalie se já cometeu assédio. Como explicou Camila Lamartine, "quando a gente sofre assédio, de certa forma, existe uma vergonha muito grande, existe uma revitimização, reculpabilização", mas o que acontece quando é a própria pessoa a cometê-lo?

Por seu lado, Leonor Caldeira afirmou ser "muito importante que os tribunais sejam chamados a pronunciar-se sobre este tipo de comportamentos", realçando a importância da criação de jurisprudência.

"Quando uma pessoa que é vítima de assédio traz o caso a tribunal e ganha, essa jurisprudência pode ser usada no futuro", afirmou Caldeira que deixou um apelo a todas as pessoas que sofram assédio: guardem as provas e tenham os prazos em mente porque, findo o prazo, fechou-se a possibilidade de poder vir a pedir justiça em tribunal.

O manual foi editado pela Mutim, em coprodução com a Filmaporto, com o apoio financeiro do Instituto do Cinema e do Audiovisual e da Câmara Municipal de Lisboa, tendo sido criado com apoio do projeto de investigação "FEMglocal -- Movimentos feministas glocais: interações e contradições", financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia.

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