Sábado – Pense por si

Parecer sem ser

08 de fevereiro de 2011 às 12:15

Há um drama na classe política portuguesa. Tem a habilidade única de ver as particularidades da realidade destruírem as teorias que esperava construir.

José Sócrates quis criar em Portugal um Estado tecnocrático e insípido, gerido por uma pequena elite de iluminados. O resultado é um "Blade Runner" terceiro-mundista sintetizado numa canção dos Deolinda. A sua teoria de defesa do Estado social tem sido, na prática, vergastada pelo próprio Governo. Este Governo não tenta reformar o Estado social: quer dissolvê-lo. Já não vive em ficção: sobrevive na própria ficção. Pode alguém ser quem não é? Pode, e Sócrates prova-o. Destrói a realidade para criar uma ilusão. Sócrates criou uma realidade paralela: enquanto destrói o Estado social, imagina-se um pequeno Keynes contra os liberais. Neste jogo de sombras, Sócrates e Passos Coelho representam. José Sócrates pode aparecer como defensor do Estado social porque Passos Coelho apresenta, de vez em quando, uma série de propostas sem nexo que permitem ao primeiro-ministro surgir como um defensor de planos quinquenais. Algumas das que foi apresentando ao longo dos tempos, sem uma lógica consistente (a privatização da CGD, a proposta de revisão constitucional, o fecho de empresas públicas), fizeram com que, criando o Estado mínimo, Sócrates surja como o defensor do Estado máximo. A política portuguesa tornou-se uma ilusão de óptica, um baile de máscaras sem ideologia. José Sócrates, com o auxílio de Passos Coelho, consegue parecer sem ser. Shakespeare criou Macbeth. Gostaria de ter criado Sócrates.

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