Secções
Entrar

Manuel Clemente completa 10 anos no Patriarcado

Lusa 04 de julho de 2023 às 08:30

O cardeal-patriarca de Lisboa está prestes a completar 75 anos, idade canónica para pedir a resignação, sendo esperada a sua substituição nos próximos meses.

O cardeal-patriarca de Lisboa cumpre na próxima quinta-feira, 6 de julho, 10 anos à frente do Patriarcado, a dias de completar 75 anos, idade canónica para pedir a resignação, sendo esperada a sua substituição nos próximos meses.

Cardeal-patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente

Sendo certo que o Papa, caso não haja graves problemas de saúde, pode manter no cargo um bispo um ou dois anos para além da idade da resignação, no caso de Manuel Clemente a substituição a curto prazo é apontada como certa, uma vez que foi o próprio que, na Missa Crismal deste ano, em 06 de abril, se manifestou convicto de que aquela seria a última a que presidiria enquanto patriarca.

A convicção de que assim será é comum a muitos católicos diocesanos de Lisboa, onde não estão ausentes as movimentações no sentido de desenhar o perfil considerado adequado para o futuro titular da diocese.

Neste sentido, no final de maio, um grupo de católicos de Lisboa enviou mesmo uma carta ao Vaticano, defendendo que o próximo patriarca seja "um bispo centrado no essencial" com a "atitude de proximidade e cuidado (...) com todos", em especial os "mais pobres e vulneráveis".

Na carta, os subscritores -- entre os quais o jornalista Jorge Wemans, e o dinamizador da carta que pediu uma investigação independente sobre os abusos no seio da Igreja, Nuno Caiado - defendiam que o novo bispo "seja a imagem do Bom Pastor" e tenha "a atitude de proximidade e cuidado de Jesus Cristo com todos, em especial com os mais pobres e vulneráveis, doentes, excluídos e marginalizados, não a partir de cima, mas envolvendo-os" e que seja "um bispo livre e humilde", com "movimentos de simples pastor e não de príncipe".

Quanto a nomes, vários têm sido apontados publicamente, desde Américo Aguiar (auxiliar de Lisboa e presidente da Fundação JMJ Lisboa 2023) a Francisco Senra Coelho (Évora), passando por Virgílio Antunes (Coimbra) ou Nuno Brás (Funchal), mas é sabido que muitas vezes é a surpresa que marca a decisão do Vaticano.

É conhecida, no entanto, a opinião de Manuel Clemente, que, no verão de 2022, em entrevista à Rádio Renascença, defendeu que Lisboa iria precisar de "um bispo a condizer com a juventude".

E é a juventude que vai marcar o grande momento desta década de Clemente à frente do Patriarcado, com a realização, de 01 a 06 de agosto, da Jornada Mundial que poderá reunir mais de um milhão de jovens de todo o mundo para um encontro presidido pelo Papa.

Estes dias de festa em agosto, no entanto, não apagarão as marcas do último ano e meio, quando os casos de abuso no Patriarcado saltaram para o domínio público e afetaram a imagem de Manuel Clemente que, segundo o jornal 7Margens, num encontro no Vaticano com o Papa Francisco, em 05 de agosto de 2022, terá deixado nas mãos do pontífice a possibilidade de ser substituído no cargo ainda naquele verão.

Em causa estava, desde logo, um caso ocorrido em 1999 e recuperado no final de julho pelo jornal Observador, dando conta de que o atual patriarca "teve conhecimento de uma denúncia de abusos sexuais de menores relativa a um sacerdote do Patriarcado e chegou mesmo a encontrar-se pessoalmente com a vítima, mas optou por não comunicar o caso às autoridades civis e por manter o padre no ativo com funções de capelania".

"Além disso, o sacerdote continuou a gerir uma associação privada onde acolhe famílias, jovens e crianças, com o conhecimento de D. Manuel Clemente. Tudo, porque (...) a vítima, que alega ter sofrido os abusos na década de 1990, não quis que o seu caso fosse público e queria apenas que os abusos não se repetissem", noticiou o jornal.

Clemente, assegurou, então, numa carta aberta, que "desde a primeira hora" deu instruções, no Patriarcado, "para que a Tolerância Zero e a Transparência Total sejam regra conhecida de todos" quanto ao abuso de menores e procurou esclarecer o que "testemunhou" no caso do padre acusado de abuso denunciado em 1999 ao anterior patriarca, José Policarpo, e disse aceitar que "este caso e outros do conhecimento público e que foram tratados no passado, não correspondem aos padrões e recomendações que hoje" todos querem "ver implementados".

A par deste, outros casos de suspeitas de abusos no Patriarcado foram noticiados, tendo, já em março deste ano, sido suspensos do ministério quatro sacerdotes, um dos quais foi, entretanto, autorizado a voltar às suas funções.

Por mais de uma vez o patriarca pediu perdão às vítimas de abuso, como em 6 de abril, em que fez questão de vincar que esse pedido era "institucional e convicto" enquanto titular do Patriarcado.

A verdade é que a questão dos abusos marcou de forma impressiva os últimos meses do cardeal Manuel Clemente no Patriarcado, ecoando ainda as declarações feitas em março, quando considerou "insultuoso para as vítimas" falar-se em indemnizações.

E é com estes últimos meses de ambiente carregado, que, após 16 de julho e da carta de pedido de renúncia que dirigirá ao Papa, o cardeal natural de Torres Vedras, doutorado em Teologia Histórica, Prémio Pessoa, atribuído em 2009 pela "sua intervenção cívica" que se tinha "destacado por uma postura humanística de defesa do diálogo e da tolerância, de combate à exclusão e da intervenção social da Igreja", entrará num período de espera, até que o Vaticano o liberte de funções.

Artigos Relacionados
Descubra as
Edições do Dia
Publicamos para si, em três periodos distintos do dia, o melhor da atualidade nacional e internacional. Os artigos das Edições do Dia estão ordenados cronologicamente aqui , para que não perca nada do melhor que a SÁBADO prepara para si. Pode também navegar nas edições anteriores, do dia ou da semana.
Boas leituras!
Artigos recomendados
As mais lidas
Exclusivo

Operação Influencer. Os segredos escondidos na pen 19

TextoCarlos Rodrigues Lima
FotosCarlos Rodrigues Lima
Portugal

Assim se fez (e desfez) o tribunal mais poderoso do País

TextoAntónio José Vilela
FotosAntónio José Vilela
Portugal

O estranho caso da escuta, do bruxo Demba e do juiz vingativo

TextoAntónio José Vilela
FotosAntónio José Vilela