Será que Ministério da Justiça quer que se instale o caos nos Tribunais?
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A execução desta portaria [Portaria n.º 86/2023, de 27 de março, que entrará em vigor dia 11 de maio] será desastrosa porque ela pura e simplesmente não é exequível e deverá ser seriamente ponderada a alteração da lei que regulamenta.
Ao escrever este artigo de opinião confesso ter hesitado quanto ao título que lhe devia dar. Entre as opções em cima da mesa, em face da realidade a retratar, estavam as seguintes: "Será que Ministério da Justiça quer que se instale o caos nos Tribunais", "Vamos todos fazer de conta que fiscalizamos a distribuição dos processos em tribunal" ou "Impõe-se a suspensão imediata da portaria da fiscalização da distribuição".
A realidade que pretendo descrever raia o absurdo e o surreal e poderá instalar o caos no funcionamento dos tribunais nos próximos tempos.
No próximo dia 11 de maio (apesar dos alertas de várias entidades ligada ao sistema de justiça) irá entrar em vigor a Portaria n.º 86/2023, de 27 de março, que regula a distribuição dos processos em tribunal, que se seguiu a alterações introduzidas nesta matéria pela Lei n.º 55/2021, de 13 de agosto (foram introduzidas alterações aos artigos 204.º, 208.º, 213.º e 216.º todos do Código de Processo Civil) e que aguardavam essa mesma regulamentação.
A execução desta portaria será desastrosa porque ela pura e simplesmente não é exequível e deverá ser seriamente ponderada a alteração da lei que regulamenta.
A ser iniciada a execução da portaria, nos termos aprovados, irá instalar-se o caos nos tribunais e será uma inutilidade no que ao seu declarado propósito diz respeito, isto é a "total transparência do procedimento de distribuição de processos".
O próprio Ministério da Justiça, no preâmbulo da portaria, admite "o impacto potencial desta regulamentação sobre o funcionamento quotidiano dos tribunais", sendo certo que esse impacto será bem real e não apenas potencial.
Será que o Ministério da Justiça quer que se instale o caos nos tribunais ao mesmo que os magistrados se transformam em itinerantes fiscais de uma distribuição de processos com anacrónicas atas assinadas a comprovar/certificar uma realidade que verdadeiramente desconhecem.
Ou será que pretende que os magistrados, num exercício de "faz de conta", certifiquem algo que é realizado por um sistema informático e um algoritmo que não dominam.
Cumpre recordar que a distribuição não é manual, mas sim eletrónica e com a utilização de um sistema informático dotado de determinado algoritmo.
Fará algum sentido colocar magistrados judiciais, magistrados do Ministério Público, advogados e oficiais de justiça a assinarem diariamente atas em papel a certificarem uma realidade que na verdade não controlam.
Como magistrado do Ministério Público confesso que tenho dificuldade em entender a utilidade (e o sentido) de apor uma assinatura diária num documento certificando algo (uma realidade) que na verdade não posso comprovar, isto é, que a distribuição realizada naquele dia cumpriu as regras legais definidas. Não estamos a falar de um sistema de bolas a saírem de uma tômbola, mas sim de sistema informático controlado por uma entidade externa ao sistema de justiça e às magistraturas.
Que formação informática possuem os magistrados para o efeito?
Na verdade, é como se todos fossemos certificar num casino que os números que saem numa roleta eletrónica saem aleatoriamente e não de acordo com uma sequência pré-determinada por quem criou ou controla remotamente o sistema informático.
Quem beneficia com isto? Certamente não a transparência da distribuição que ficaria melhor servida com a realização periódica, por peritos, de auditorias, ao sistema informático e com a entrega do sistema aos Conselhos Superiores de Magistratura.
A elaboração diária de atas de fiscalização é uma tarefa burocrática, desfasada da realidade (em especial no atual contexto de carência de recursos humanos) e inexequível em especial em tribunais ou juízos onde não está colocado nenhum magistrado do Ministério Público e em que as distâncias geográficas entre tribunais são grandes.
Além do mais, será razoável que seja interrompida diariamente toda a atividade do tribunal (ainda que urgente) para "presenciar" o sistema informático a realizar a distribuição e assinar uma ata.
E como será no período de féria judiciais?
Será que o Ministério da Justiça pretende que os magistrados, judicial e do Ministério Público, que se encontrem de turno (férias judiciais de verão, páscoa e natal) se desloquem a todos os juízos da área geográfica do turno? Porque se os magistrados tiverem que se deslocar diariamente a todos os juízos do mesmo tribunal, por vezes tendo que percorrer grandes distâncias dada a dispersão geográfica de muitos tribunais, como poderão realizar os atos próprios desse mesmo turno, muitas vezes eles sim urgentes e inadiáveis.
O Ministério da Justiça se quer evitar que o caos se instale nos tribunais deve suspender a execução desta portaria que - em especial no que diz respeito ao tribunais de 1.ª instância - se irá revelar inexequível na sua finalidade e causadora de profundos transtornos no funcionamento diário normal dos tribunais.
Será que Ministério da Justiça quer que se instale o caos nos Tribunais?
É urgente e prioritário reforçar a cultura de prevenção, pois é na ausência dela que o problema ganha proporções trágicas. A prevenção começa na gestão do território: limpeza de matos, manutenção das faixas de proteção, implementação de planos municipais de defesa da floresta contra incêndios e fiscalização mais eficaz.
Importa igualmente reforçar que, durante o período de férias judiciais, os Tribunais e os departamentos do Ministério Público não encerram. O serviço urgente continuará a ser assegurado por magistrados e oficiais de justiça, e o atendimento ao público mantém-se dentro do horário normal: de segunda a sexta-feira, das 9h00 às 12h30 e das 13h30 às 16h00.
Magistrados mais equilibrados e saudáveis estão mais aptos a tomar decisões ponderadas, justas e humanizadas, reforçando a confiança da sociedade nas instituições.
A estabilidade dos magistrados do Ministério Público é uma garantia constitucional que protege a autonomia interna da instituição e, acima de tudo, a democracia. Qualquer tentativa de esvaziar esta garantia, permitindo movimentações arbitrárias sob pretextos gestionários, representa um grave risco para a independência da justiça e para o Estado de Direito.
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