Se durante muitos anos os eleitores valorizaram a segurança acima de qualquer outra virtude política, o novo espírito do capitalismo, potenciado pelas redes sociais e as novas economias é profundamente individualista, empreendedor e ágil. Quem não quer a mudança quer estagnar.
Os resultados eleitorais de 18 de maio convocam o Partido Socialista a iniciar imediatamente uma profunda reflexão e ação. Mais que uma injustiça, será um erro tornar a derrota responsabilidade de um indivíduo, um grupo, uma decisão ou um conjunto de ideias. Como escrevi a semana passada, há razões estruturais para o que aconteceu. Além de comunicarmos mais e melhor, algo no qual tenho pessoalmente investido na última semana, é a própria mensagem que tem de evoluir.
Os socialistas e sociais-democratas continuam a ser os grandes vencedores do debate de ideias desde o pós-guerra. Por muito que o neoliberalismo tenha desgastado, deslocado e desfigurado o Estado Social, ele continua aqui e, consequentemente, a nossa principal tarefa política é a sua defesa. Isso faz com que a esquerda jogue mais "à defesa" do que "ao ataque", apelando ao medo de perder direitos em vez de à esperança do que pode ser a vida com uma economia mais justa.
Se durante muitos anos os eleitores valorizaram a segurança acima de qualquer outra virtude política, o novo espírito do capitalismo, potenciado pelas redes sociais e as novas economias é profundamente individualista, empreendedor e ágil. Quem não quer a mudança quer estagnar. Por outro lado, o agravamento das desigualdades e o deslaçar do contrato social, provocado pela crise duradoura dos serviços públicos, criou um rastilho de frustração que o populismo veio acender e converter em vontade de mudança para massas outrora desmobilizadas do processo político. Como tentámos transmitir na última campanha, a melhor mensagem para uma alternativa do PS não é, por isso, a da estabilidade por si só mas a da mudança segura.
É difícil, porém, representar a mudança quando apenas há um ano terminámos, de forma tão abrupta, um ciclo de governação de 8 anos. É preciso tempo, nomeadamente para podermos perceber as diferentes escolhas e as diferenças em competência. É preciso tempo para compreendermos que a governação do PS trouxe uma década de grande progresso económico e social para o país e que, talvez com exceção das carreiras da administração pública, os desafios que atravessamos no SNS, na habitação, na escola pública ou na imigração são bastante mais complexos de resolver do que aparenta. Esse tempo não vem meramente esperando com paciência. Exige que os socialistas saibam reconhecer, valorizar e defender o legado do que fizemos durante os governos de António Costa – os sucessos e as limitações que, respetivamente, nos orgulham e nos ensinam a fazer melhor.
É, mais uma vez, uma grave injustiça, mas, tanto na governação como na oposição, colaram-nos uma imagem. Dizem que o PS é o partido dos pensionistas, das minorias, dos imigrantes, de quem recebe subsídios. Como se eleições fossem um cálculo de custos e benefícios para diferentes classes eleitorais. Como se fosse um insulto contar com o voto de quem tem a experiência de uma vida inteira de trabalho e o sentido de cuidado de terem criado filhos e netos. Como se fosse decente construir um país sem proteger quem precisa. Mas isso não é — e nunca foi — tudo o que somos.
O PS é o partido do trabalho. De quem cumpre as regras. De quem se esforça e puxa pelo país todos os dias — mesmo quando o país parece não puxar por eles. É precisamente essa maioria trabalhadora, empreendedora, contributiva, que temos de voltar a pôr no centro da nossa marca. Não para abandonar quem precisa de ajuda, mas para reforçar a aliança entre solidariedade e justiça, entre crescimento e igualdade, entre Estado Social e mérito, entre direitos e deveres.
A classe média sente que cumpre com os seus deveres, paga impostos mas pouco recebe em troca. Demasiado "rica" para receber apoios mas demasiado "pobre" para viver de forma confortável, sente-se esquecida, sem acesso digno à saúde ou à habitação, e cada vez com menos margem para sonhar. Entretanto, com projetos de investimento que nunca avançam e com fiscalizações que nunca chegam, há um sentimento de inconsequência, impunidade e ineficácia que se alastra perigosamente na sociedade portuguesa. Se não corrigirmos isso, perdemos não apenas votos — perderemos o contrato social.
É tempo de renovar esse pacto e, com ele, renovar a marca do PS. Voltar a ser vistos como o partido que quer dar maior recompensa ao esforço – que defende quem trabalha e empreende, que investe nas novas gerações e nas novas economias, que protege os vulneráveis sem esquecer a classe média.
Uma visão progressista não pode deixar de ser exigente. E uma visão exigente não tem de deixar de ser progressista. O PS tem de ser ambas. Justo, mas solidário. Audaz, mas sensato. Moderno, mas enraizado na sociedade e na vida concreta das pessoas. Essa é a nossa identidade. E é por nossas mãos que a temos de reafirmar.
Estou farto que passem por patriotas aqueles que desfazem e desprezam tudo o que fizemos, tudo o que alcançámos e, sobretudo, tudo o que de nos livrámos – a miséria, a ignorância, o colonialismo.
Já sabíamos que vivemos numa era de ciclos mediáticos muito curtos. Isso já era o caso com a televisão e passou a sê-lo mais ainda com as redes sociais. Todavia, estes meios deveriam permitir-nos confrontar os políticos com o que disseram ou propuseram no passado. Como se diz na gíria, "a internet não esquece".
Muito trabalho ainda há a fazer. O desconhecimento dos portugueses em matéria de literacia financeira permite muitas tropelias. Por exemplo, permitiu que o Governo baixasse de forma "excessiva" a retenção na fonte, causando os reembolsos de IRS dos portugueses a desaparecer.
Este não é um caso novo. Há precisamente um ano, Luís Meira demitia-se da presidência do INEM depois de sucessivas insistências para resolver o concurso de contratação dos novos helicópteros.
Faça-se o que se fizer, num país onde se ganha mal, baixar o IRS parece sempre bem. Foi aliás essa a política do Partido Socialista nos 8 anos em que governou.
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