Primavera começa hoje. Risco de covid-19 vai aumentar?
Com a nova estação, chega o sol, o pólen e as alergias. A sazonalidade do vírus ainda não é completamente compreendida, mas uma coisa é certa: a transmissão do SARS-CoV-2 não vai abrandar na primavera.
A primavera começa este sábado com céu limpo e temperaturas máximas a chegarem aos 20 graus. A estação é sinónimo de chegada do "bom tempo", do sol e também das alergias. A sazonalidade do vírus ainda não é totalmente compreendida, mas alguns fatores aumentam naturalmente o risco de infeção.
Covid-19 não abranda com a primavera e o verão
O alerta foi dado pela Organização Meteorológica Mundial, parte integrante das Nações Unidas (ONU), esta quinta-feira. Num relatório, especialistas alertam que o início da primavera não pode ser sinónimo de relaxamento de medidas de prevenção contra o novo coronavírus e que não existem provas de que os fatores meteorológicos, como o tempo quente e a qualidade do ar, impeçam a propagação do vírus.
"Nesta fase, as evidências não utilizam fatores meteorológicos e de qualidade do ar como base para os governos relaxarem as medidas para reduzir a transmissão", afirmou um dos líderes da investigação, Ben Zaitchik, da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, recusando a ideia de que estações mais quentes desaceleram a transmissão do vírus.
"Vimos ondas de infeções que aumentaram nas estações quentes e regiões quentes durante o primeiro ano da pandemia, e não há provas de que isto não voltará a acontecer no próximo ano", acrescentou um dos 16 especialistas que elaboraram o documento.
Além do rumo que terá o vírus na primavera, investigadores debruçaram-se sobre a sazonalidade do vírus. Outras infeções respiratórias, como a gripe, têm o seu pico durante o outono e inverno, o que alimenta a esperança de que a covid-19 siga esse destino nos próximos anos. No entanto, para já, não parece que o novo coronavírus seja uma doença fortemente sazonal.
Estudos apontaram, para já, que o vírus SARS-CoV-2 sobrevive mais tempo em condições frias, secas e de baixo UV, mas nenhuma investigação descobriu se estas "influências meteorológicas diretas", como são chamadas, "têm uma influência significativa nas taxas de transmissão em condições reais".
Existem também dúvidas sobre que papel tem a qualidade do ar na transmissão do vírus. O mesmo relatório indica existirem provas preliminares de que a má qualidade do ar aumenta as taxas de mortalidade por covid-19, mas não que a poluição afeta diretamente a transmissão, via aérea, do SARS-CoV-2.
A influência do pólen
Na passada semana, uma investigação publicada na revista científica da Academia das Ciências dos EUA (PNAS), conduzida por cientistas da Universidade Técnica de Munique e do Helmholtz Zentrum, o maior centro de estudos científicos na Alemanha, apontou que uma maior concentração de pólen no ar está relacionada com um maior nível de contágio da Covid-19.
O estudo foi realizado após surgirem os primeiros grandes surtos da pandemia na primavera de 2020, com a recolha de dados sobre as concentrações de pólen na atmosfera em 248 locais de 31 países, bem como as suas condições climáticas, a sua densidade populacional, o seu número de infeções de Covid-19 e os seus efeitos das medidas e restrições para avaliar uma possível variação epidemiológica relacionada com o pólen.
Em média, o pólen encontrado no ar, em conjunto com a humidade e a temperatura explicava 44% dos casos de aumento da taxa de infeção da covid-19. Isso significa que, em quase metade dos picos, os casos de covid-19 aumentaram após as concentrações de pólen aumentarem nos quatro dias anteriores.
A mesma investigação mostra ainda que, em situações de confinamento, as taxas de infeção subiram 4% apenas com o aumento de 100 grãos de pólen por metro cúbico no ar. Em algumas cidades alemãs, concentrações perto dos 500 grãos de pólen por metro cúbico levaram mesmo a uma subida nas taxas de infeção em 20%.
Assim, investigadores concluíram que a exposição simultânea ao vírus da covid-19, o SARS-CoV-2, e a concentrações de pólen, promovem a infeção viral, aconselhando grupos de risco a usarem máscaras com filtros de partículas, especialmente na primavera, quando a atividade polínica é mais intensa.
Ainda assim, investigadores alertam que não foi possível detetar a magnitude do efeito do pólen no contágio da covid-19, uma vez que o estudo foi realizado já depois do pico de atividade polínica do Hemisfério Norte, que ocorre entre o final do inverno e início da primavera.
De acordo com a Rede Portuguesa de Aerobiologia, da Sociedade Portuguesa de Alergologia e Imunologia Clínica, que disponibiliza previsões semanais dos níveis de concentração do pólen no ar por regiões, os maiores períodos de atividade polínica aconteceram precisamente nas primeiras duas semanas de março de 2020, quando o nível foi considerado "muito elevado".
Voltaram a ser registados níveis muito altos de pólen no ar em junho e início de julho, sem qualquer pico da covid-19 nessa altura, e novamente na altura do Natal, no final de dezembro - poucas semanas depois Portugal testemunharia o pico da terceira vaga da pandemia.
O que explica a maior taxa de contágio quando há maior concentração do pólen é o enfraquecimento da resposta imunitária a vírus respiratórios. Se o corpo tem mais ameaças à sua frente, e como o pólen é uma exposição que não conseguimos evitar devido ao reduzido tamanho das partículas, a capacidade do nosso organismo em responder à ameaça da covid-19 também será menor.
Embora o estudo aponte que temperaturas altas do verão podem levar a um maior número de infeções, este efeito do pólen é mais visível durante a primavera, uma vez que a temperatura do ar não é alta o suficiente para limitar o contágio viral, permitindo ao vírus da covid-19 sobreviver mais tempo na atmosfera, e as concentrações de pólen no ar estão no seu pico.
Investigadores alertam também que se trata da concentração do pólen no ar, e não afeta especificamente pessoas alérgicas aos pólenes. Apesar de ser mais provável o desenvolvimento de infeções respiratórias em doentes alérgicos, o mesmo não acontece no caso da covid-19, em que o risco de contágio não é maior, aumentando apenas a gravidade dos sintomas. O risco, segundo o estudo, é global, pois refere-se à inalação do pólen, e não à resposta do organismo - que provoca a alergia - a ele.
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