Secções
Entrar

Distribuídos produtos menstruais nas escolas, mas tampões só a partir dos 16 anos  

Débora Calheiros Lourenço 02 de junho de 2025 às 07:00

Especialistas consideram medida da distribuição positiva, no entanto defendem que não há qualquer motivo para os tampões ficarem de fora: "Deve ser feito um trabalho para normalizar o período e não privar as raparigas de momentos da sua vida”.

O Governo já começou a distribuição gratuita de produtos de recolha menstrual, através das escolas públicas. No entanto, a inclusão de tampões apenas a partir dos 16 anos está levantar algumas questões.

REUTERS/Stefan Wermuth

Segundo a diretiva da Direção-Geral da Educação, a distribuição prevê, mensalmente, até aos 15 anos, a entrega de uma embalagem de pensos higiénicos de dia e uma embalagem de pensos higiénicos de noite. A partir dos 16 anos, serão distribuídas uma embalagem de pensos higiénicos de noite e uma embalagem de pensos higiénicos de dia ou uma embalagem de tampões, conforme a disponibilidade. 

Patrícia Lemos, formadora e ativista autora de livros como Período - Um Guia para Descomplicar e Não é só sangue – uma conversa sobre o ciclo menstrual, partilhou no seu Instagram que lhe estavam a chegar várias mensagens sobre a inclusão dos tampões apenas aos 16 anos, até porque algumas raparigas que já utilizavam ficaram com a perceção, depois de uma conversa com a enfermeira que foi à escola, que não o deveriam estar a fazer.  

À SÁBADO reforça que "é um avanço tremendo" o simples facto dos kits estarem a ser distribuídos nas escolas porque "não temos todos o mesmo contexto socioeconómico e, especialmente nas famílias onde há muitas mulheres, comprar produtos menstruais pode ser um grande esforço financeiro".   

Ainda assim, alerta que "várias seguidoras denunciaram que estavam a receber emails dos diretores de turma onde é referido que a distribuição deve ser autorizada pelos encarregados de educação", algo que deixa algumas das crianças mais vulneráveis devido ao seu contexto social, até porque "não é uma escolha ter o período".  

Patrícia Lemos critica também "o limite de idade" para a utilização de tampões, algo que considera que "está relacionado com noções de sexualidade": "Não nos podemos esquecer que vivemos numa sociedade muito patriarcal. A determinada altura temos de nos questionar do que falamos quando nos referimos à virgindade, a sexualidade tem tantas questões e vertentes que se nos focamos apenas na penetração estamos em contracorrente com aquilo que tem sido cada vez mais naturalizado".  

Sílvia Roque, ginecologista e obstetra, também refere que "o tampão não tira a virgindade, de todo" e explica que muitas vezes essa visão está relacionada com o romper do hímen, uma visão que também está errada porque além de "a virgindade poder não ser o hímen", "há hímenes complacentes, ou seja, elásticos que por norma não se rompem durante relações sexuais e depois há raparigas que por andarem na ginástica, na equitação ou mesmo por andarem de bicicleta acabam por o romper sem qualquer relação sexual".

No entanto, Patrícia Lemos admite que "muitas das meninas não se sentem à vontade nos primeiros anos para utilizarem tampões", mas acredita que isso está muito relacionado com "o estigma existente relativamente aos produtos internos" e que "tendo em conta que a idade média para a primeira menstruação no mundo ocidental é de 12,4 anos", "deve ser feito um trabalho para normalizar o período e não privar as raparigas de momentos da sua vida".  

Também Sílvia Roque alerta que são necessários alguns cuidados para a utilização de tampões: "Tem que ser ensinado, tem de se falar mais sobre este assunto porque é muito importante que as meninas lavem bem as mãos antes de colocarem um tampão e antes de o retirarem e que saibam a forma correta de os colocarem".

Para isso a médica acredita que "os ginecologistas, mas também as mães, as amigas e as enfermeiras das escolas têm um papel fundamental". "Não vale a pena forçar uma menina a utilizar tampões, mas se estiverem confortáveis com isso, e tiverem as condições de higiene necessárias, não há problema nenhum", reforça, antes de alertar que numa primeira fase, e "enquanto são virgens devem utilizar tampões mais pequenos e mudá-los com muita regularidade, de duas em duas horas".  

Ainda assim, Patrícia Lemos reforça que "a intenção é ótima" e que é preciso apenas "limar algumas arestas".

Numa primeira fase, a distribuição está pensada para ser feita de forma prioritária para crianças e jovens em condições de vulnerabilidade social (beneficiárias de ASE e/ou cujas famílias são beneficiárias de RSI), sem que, no entanto, nenhuma criança ou jovem seja impedida de aceder aos produtos, se o desejar, e caso existam produtos excedentes, refere o Direção Geral de Educação.

Artigos Relacionados
Descubra as
Edições do Dia
Publicamos para si, em três periodos distintos do dia, o melhor da atualidade nacional e internacional. Os artigos das Edições do Dia estão ordenados cronologicamente aqui , para que não perca nada do melhor que a SÁBADO prepara para si. Pode também navegar nas edições anteriores, do dia ou da semana.
Boas leituras!
Artigos recomendados
As mais lidas
Exclusivo

Operação Influencer. Os segredos escondidos na pen 19

TextoCarlos Rodrigues Lima
FotosCarlos Rodrigues Lima
Portugal

Assim se fez (e desfez) o tribunal mais poderoso do País

TextoAntónio José Vilela
FotosAntónio José Vilela
Portugal

O estranho caso da escuta, do bruxo Demba e do juiz vingativo

TextoAntónio José Vilela
FotosAntónio José Vilela