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Arrancou a campanha de vacinação: Devo vacinar-me contra a Covid?

Lucília Galha 29 de setembro de 2025 às 07:01

A resposta é positiva e há vários argumentos de peso: o SARS Cov2 é muito mais transmissível do que a gripe, por exemplo. Além de que, quanto mais livremente circular, maior a probabilidade de se tornar novamente pandémico.

Arrancou na passada terça-feira, dia 23 de setembro, a campanha de vacinação contra a gripe e a Covid-19. Se é verdade que já passaram cinco anos desde a pandemia – e que há esse mesmo tempo que convivemos com o SARS Cov2 –, o certo é que ainda há muito por conhecer sobre a infeção. Mas sobre uma coisa não há dúvidas: deve mesmo fazer a vacina. Mais ainda se pertence a um grupo alvo para o qual se recomenda a vacinação (damos uma ajuda: ambas estão recomendadas a maiores de 60 anos, doentes crónicos e profissionais de saúde).
A primeira razão e a mais óbvia neste momento é a de que o vírus da Covid19 é novo – e nesse sentido não se compara ao da famigerada influenza. Mas as duas infeções têm várias coisas em comum: são ambos vírus respiratórios, os dois atacam sobretudo a população mais idosa e mais frágil, e “qualquer um, se não for bem monitorizado, pode despoletar uma nova pandemia”, alerta o professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa. Contudo, há uma diferença grande da Covid em relação à gripe: o SARS Cov2 é muito mais transmissível e não é apenas (ou não se tornou como se esperava) numa infeção típica do inverno – o que surpreendeu os especialistas. “De facto, ele vai-se mantendo ao longo do ano e no início do verão há sempre ali um mini pico. Na pandemia isso parecia uma coisa extemporânea, mas tem-se mantido regularmente”, diz o também o investigador do Instituto Gulbenkian de Medicina Molecular. Há países que, tendo isto em consideração, até adaptaram os seus planos de vacinação. “No Reino Unido, por exemplo, fazem duas vacinações por ano: na primavera e no inverno”, aponta Bernardo Gomes, presidente da Associação de Médicos de Saúde Pública. O conceito de sazonalidade nas vacinas (ou seja, de se repetirem com uma determinada frequência) tem a ver com esse facto de o vírus estar sempre a mudar. “Como estes vírus mudam e a própria imunidade gerada pelas vacinas não é tão duradoura, há necessidade de fazer vacinações uma vez por ano, para adaptar a resposta da espécie ao vírus”, explica o especialista à SÁBADO. É um facto: desde há cinco anos já foram conhecidas várias variantes do vírus. A mais recente chama-se XFG (ou Stratus) e vem da linhagem da Ómicron. Um dos seus sintomas distintivos é a rouquidão. E o problema não é só o facto de estar sempre a mudar, mas também a dificuldade de prever de que forma é que isso vai acontecer. “Nós percebemos bem os mecanismos com que muda, a vantagem evolutiva para mudar muito, porque se adapta muito rapidamente e, portanto, subsiste sempre. Mas, numa determinada situação ou contexto, não conseguimos prever como o vírus vai evoluir”, diz Miguel Castanho. “O conhecimento científico ainda não está assim tão desenvolvido”, lamenta.

Muito perigoso?

Tal como o vírus da gripe, o SARS Cov2 não é muito perigoso para a maioria das pessoas. É sobretudo para os mais idosos e imunossuprimidos. Mas, se o pensamento comunitário – ou seja, o pensar proteger as pessoas que estão desprotegidas – por si só não é argumento suficiente, há mais razões de peso para que se vacine. Primeira: “Quanto mais espaço dermos ao vírus, quanto mais livre ele estiver para se multiplicar, maior é o risco de sofrer uma alteração que o torne pandémico de novo”, alerta Miguel Castanho. O investigador consegue ser ainda mais persuasivo. “Quanto mais o deixarmos à solta, tal como o vírus da gripe, mais próximo estamos do SARS Cov3 e, portanto, eventualmente de uma próxima pandemia”, afirma. Outra razão: o problema não é só infetar-se, mas esta doença poder, por si só, predispor a outras infeções. “Por exemplo, na gripe, a questão das pneumonias. Mas o aumento da carga inflamatória também aumenta a probabilidade de eventos cardiovasculares”, chama a atenção Bernardo Gomes. Há ainda uma terceira razão de peso a favor da vacina: a chamada Covid longa – quando as pessoas ficam com sintomas mais duradouros resultantes da infeção.
"Quanto mais o deixarmos à solta, tal como o vírus da gripe, mais próximo estamos do SARS Cov3 e, portanto, eventualmente de uma próxima pandemia." Miguel Castanho, investigador do Instituto Gulbenkian de Medicina Molecular
Estas chamadas síndromes pós-virais, arrastadas no tempo, não são exclusivas da Covid. Acontece com muitos outros vírus. Mas na Covid19 há um aspeto que faz a diferença, destaca o especialista em Saúde Pública. “A base populacional de afeção é muito maior. Ou seja, como é muito mais transmissível, as suas consequências são bastante importantes em termos absolutos porque há uma grande número de infeções a ocorrer”, explica. Neste caso, a vacina também confere proteção – diminui a probabilidade de isto vir a acontecer. Para o médico, há um aspeto que condiciona sempre as vacinações sazonais: é que dependem da perceção de risco por parte da população. Explicação: “Se as pessoas tiverem uma perceção do impacto da doença como menor e não o valorizarem, é natural que exista menos adesão. Por exemplo, após uma época mais leve, em que o impacto se note menos, provavelmente na época seguinte as pessoas pensarão: ‘Então este ano não vou’”, diz. Mas uma boa campanha de esclarecimento pode ajudar, sugere. O tempo ainda é de ajustes, concordam os especialistas, no sentido de afinar a quem deve ser dirigida a vacina – afinal só passaram ainda cinco anos. Todos os anos há uma revisão das orientações e Portugal está alinhado com o que está a acontecer nos outros países, asseguram. E há ainda a expectativa: “A esperança óbvia é a de que isto se torne menos relevante”, diz Bernardo Gomes.
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