Literatura por medida
Bruno Nogueira Humorista
02 de março

Literatura por medida

O autor está morto, pegaram no livro dele e alteraram frases e palavras de maneira a que o leitor não se sinta ofendido. Vivemos uma época em que para não ofender os leitores vivos, manipula-se a escrita dos autores mortos.

ESTÁ A ACONTECER um pouco por todo o lado, mas sobretudo em livros. E até que enfim que está a acontecer, porque assim o mundo fica logo mais justo. Eu pelo menos sinto isso, quando saio à rua. A editora britânica do escritor Roald Dahl (autor de Matilda, Charlie e a Fábrica de Chocolate, etc.) terá contratado uma equipa para analisar as obras do autor, e sugerir alterações. Tudo para que os livros de Dahl “continuem a ser apreciados por todos nos dias de hoje”. Logo aqui, um erro. Devia ser: “Para que continuem a ser apreciados por todos os panhonhas nos dias de hoje.” Assim sendo, pegaram nesses livros e alteraram algumas passagens. Porquê? Porque há pessoas a quem fazem dói-dói determinadas palavras. E qual é a solução? Temos aqui vários caminhos, e vejam se conseguem adivinhar o mais sensato: Hipótese A, o leitor escolhe não ler porque não aprecia a linguagem contida no livro. Hipótese B, o leitor lê e entende que uma obra de ficção representa isso mesmo (uma obra de ficção), e contextualiza na época em que foi escrito; ou hipótese C, o leitor amua porque há no livro palavras que ele sente que não deve ler, e a editora altera para que ele nunca mais tenha de passar por tamanha afronta. Se está alcoolizado e respondeu a hipótese C, acertou.

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