Ser pai é aprender a engolir o orgulho, e ninguém te ensina isso, ninguém te prepara, apenas dizem que é amor, mas não falam do peso que esse amor tem, da preocupação que alastra no peito como um fogo posto. Não te dizem que vais passar o resto da vida a perguntar-te se fizeste o suficiente, se não faltaste em nada
É POSSÍVEL QUE se não tivesse sido pai, ficasse sem conhecer uma parte fundamental de mim. É até possível que tivesse passado ao lado de quem sou, como se me tivesse enganado no que estava para ser. Onde é que teria ficado isso, se não fosse chamado para aqui? Estamos sempre a um acontecimento de desbloquear uma coisa nova, um recanto de muitas assoalhadas que nem fazíamos ideia que estavam cá dentro. Somos o que achamos que sempre fomos, e de repente acontece uma coisa enorme, um estrondo que leva tudo à frente, e temos de aprender a andar outra vez. Sempre soube que queria ser pai, mas era uma ideia distante de felicidade, uma miragem que já tinha visto em tanto lado, e que queria também para mim. A vontade não vem com o resto atrás – o resto só se descobre mais tarde, quando já estamos no meio de tudo. Mas quando nos acontece a nós, percebemos a complexidade que temos cá dentro, o infindável comprimento de cabos que ligam umas coisas às outras. Onde antes estavam estradas que iam a direito, surgem agora outras que serpenteiam por entre montes e vales, e que nos deslumbram sem a pressa de outros tempos. Agora que sou pai, sei que sou muito diferente do que estava para ser. É um amor desprendido, mas agarrado a tudo. Ajudava se a palavra amor tivesse dentro dela muitas outras palavras, para que não soasse tudo ao mesmo, como se os vários amores fossem parentes próximos.
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Só espero que, tal como aconteceu em 2019, os portugueses e as portuguesas punam severamente aqueles e aquelas que, cinicamente e com um total desrespeito pela dor e o sofrimento dos sobreviventes e dos familiares dos falecidos, assumem essas atitudes indignas e repulsivas.
Identificar todas as causas do grave acidente ocorrido no Ascensor da Glória, em Lisboa, na passada semana, é umas das melhores homenagens que podem ser feitas às vítimas.
O poder instituído terá ainda os seus devotos, mas o desastre na Calçada da Glória, terá reforçado, entretanto, a subversiva convicção de que, entre nós, lisboetas, demais compatriotas ou estrangeiros não têm nem como, nem em quem se fiar