Decidi fazer greve às notícias mas mesmo assim, não consegui deixar de ser confrontada com o lixo que empurramos para debaixo do tapete e aquele que, não conseguindo esconder-se, está a acumular-se nas ruas de Paris.
Imaginem que acordavam um dia e a rua não era rua mas um monte de sacos de lixo que tinham de trepar para passar por entre os sacos, desviarem-se do líquido pegajoso que escorre e se cola às mãos, numa espécie de slalom entre o que uns não querem e o que outros deitam fora. Imaginem que a rua que conhecem não seria rua e que, abrindo a porta do prédio onde moram, moscas e varejeiras andariam pelo ar, que o ar teria sido invadido por um cheiro nauseabundo e que pilhas de lixo estariam à porta, que teriam de as contornar para chegar onde querem chegar, se é que la conseguiriam chegar, perante o monte de sacos que, entretanto, se abriram, espalhando lixo por aquilo que antes era a rua. Imaginaram? Agora pensem na forma como tantas vezes olham de lado para o homem do lixo, como evitam o camião e como não pensam duas vezes em atirar mais um saco para o lixo, fugindo do mau cheiro e da imagem pessonhenta que associam ao caixote, ao camião e ao lixo. Pensaram? Óptimo porque eu também. E pensei sobretudo na falta que fazem estas pessoas e como tantas as vezes as consideramos descartáveis. Agora imaginem que vão a circular de automóvel e que, a meio do dia, numa rua de sentido único, com apenas uma faixa de rodagem, pára, à vossa frente, o camião para recolher lixo. Ficam satisfeitos? Não. Pressionam quem faz a recolha com o olhar e o dedo pronto na buzina? Sim. Agora pensem o que seria aquela rua sem esta interrupção no vosso dia. São cinco minutos que vos garantem que não têm de escalar sacos de lixo para poderem circular e, no entanto, descartam a importância do trabalho destes profissionais. Numa empresa, por vezes, a grande vantagem é conhecer o porteiro em vez de privar com o presidente, o que prova que isto de cargos e posição social tem muito que se lhe diga. Nessa mesma empresa, é também importante chegar e sentir o ar respirável, a mesa impecável sem lixo a acumular. Quantas vezes pensamos em quem chegou antes de nós para, fazendo o seu trabalho bem feito, garantir as condições ideais para fazermos o nosso?
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