Secções
Entrar

Afeganistão: Três anos depois, talibãs criaram maior crise de direitos das mulheres no mundo

Lusa 13 de agosto de 2024 às 10:20

Segundo a HRW o Afeganistão vive um "sistema institucionalizado de discriminação, segregação, desrespeito pela dignidade humana e exclusão de mulheres e raparigas".

A organização não-governamental Human Rights Watch (HRW) defendeu hoje os talibãs criaram a mais grave crise de direitos das mulheres do mundo desde que assumiram o poder no Afeganistão, a 15 de agosto de 2021.

Num relatório sobre o terceiro aniversário da chegada ao poder do regime talibã, a HRW sustenta que o Afeganistão está também a atravessar uma das piores crises humanitárias do mundo, com a ajuda gravemente subfinanciada, milhares de afegãos forçados a regressar ao Afeganistão vindos do Paquistão e milhares de outros que esperam emigrar para países ocidentais ainda à espera.

Sob o regime talibã, o Afeganistão é o único país onde as raparigas estão proibidas de estudar para além do sexto ano, lembra a organização, com sede em Nova Iorque.

"Os talibãs violaram igualmente o direito das mulheres à liberdade de circulação, proibiram-nas de exercer muitas formas de emprego, desmantelaram as proteções para as mulheres e raparigas vítimas de violência baseada no género, criaram barreiras ao acesso aos cuidados de saúde e impediram-nas de praticar desporto e até de visitar parques", lê-se no relatório. 

Segundo a HRW, o relator especial das Nações Unidas para o Afeganistão, Richard Bennett, descreveu a situação como "um sistema institucionalizado de discriminação, segregação, desrespeito pela dignidade humana e exclusão de mulheres e raparigas".

"Sob o domínio abusivo dos talibãs, as mulheres e raparigas afegãs estão a viver os seus piores pesadelos. Todos os governos devem apoiar esforços para responsabilizar os líderes talibãs e todos os responsáveis por crimes graves no país", disse, por sua vez, Fereshta Abbasi, investigadora da Human Rights Watch no Afeganistão.

Desde janeiro de 2024, segundo a HRW, os talibãs têm detido mulheres e raparigas em Cabul e noutras províncias devido ao que designam por "mau ‘hijab’", ou seja, por não respeitarem o código de vestuário prescrito. 

Os investigadores da ONU relataram que algumas das detidas foram mantidas incomunicáveis durante dias e sujeitas a "violência física, ameaças e intimidação". 

Além da intensificação das restrições aos direitos das mulheres e das raparigas, os talibãs, prossegue a HRW nas denúncias, restringiram fortemente a liberdade de expressão e os meios de comunicação social e detiveram e torturaram manifestantes, críticos e jornalistas.

"O corte na ajuda ao desenvolvimento contribuiu para criar a crise humanitária no Afeganistão. O Gabinete de Coordenação dos Assuntos Humanitários das Nações Unidas informou que mais de metade da população - 23 milhões de pessoas - enfrenta insegurança alimentar. As mulheres e as raparigas contam-se entre as pessoas mais gravemente afetadas", acrescenta a organização não-governamental. 

Segundo a HRW, o plano de resposta humanitária da ONU para 2024 está subfinanciado: em agosto, os países doadores tinham contribuído apenas com 12% dos fundos necessários.

A perda de assistência externa, acrescenta, prejudicou gravemente o sistema de saúde do Afeganistão e exacerbou a subnutrição e as doenças resultantes de cuidados médicos inadequados. 

As restrições impostas pelos talibãs às mulheres e às raparigas impediram o acesso aos cuidados de saúde, pondo em risco o seu direito à saúde. 

"As proibições de educação impostas pelos talibãs garantem uma futura escassez de profissionais de saúde do sexo feminino", insistiu, disse a Human Rights Watch, que defende que os países doadores têm de encontrar formas para atenuar a atual crise humanitária sem reforçar as políticas repressivas dos talibãs contra as mulheres e as raparigas.

Segundo a HRW, mais de 665.000 afegãos chegaram ao Afeganistão vindos do Paquistão desde setembro de 2023, depois de terem sido forçados a sair durante a repressão do governo paquistanês contra imigrantes e refugiados estrangeiros. 

Muitos viviam no Paquistão há décadas, lembra a organização, que salienta que estes números vieram juntar-se aos milhões de pessoas deslocadas internamente no Afeganistão e que têm vindo a sobrecarregar o apoio humanitário existente.

Milhares de afegãos que fugiram do país após a tomada do poder pelos talibãs "vivem num limbo no Irão, na Turquia, nos Emirados Árabes Unidos e noutros países", uma vez que os processos de reinstalação nos Estados que se comprometeram a acolher afegãos, incluindo os Estados Unidos, o Reino Unido, a Alemanha e o Canadá, têm sido "lentos e inadequados às necessidades dos afegãos em risco".

"O terceiro aniversário da tomada do poder pelos talibãs é uma lembrança sombria da crise dos direitos humanos no Afeganistão, mas também deve ser um apelo à ação", afirmou Abbasi. 

"Os governos que se relacionam com os talibãs devem sistematicamente recordar-lhes que os abusos que cometem contra as mulheres e as raparigas e contra todos os afegãos violam as obrigações do Afeganistão nos termos do Direito internacional. Os doadores devem prestar assistência com o objetivo de chegar aos mais necessitados e de encontrar soluções duradouras para a crise humanitária do Afeganistão", termina a Human Righs Watch.

REUTERS/Akhtar Soomro
Artigos Relacionados
Descubra as
Edições do Dia
Publicamos para si, em três periodos distintos do dia, o melhor da atualidade nacional e internacional. Os artigos das Edições do Dia estão ordenados cronologicamente aqui , para que não perca nada do melhor que a SÁBADO prepara para si. Pode também navegar nas edições anteriores, do dia ou da semana.
Boas leituras!
Artigos recomendados
As mais lidas
Exclusivo

Operação Influencer. Os segredos escondidos na pen 19

TextoCarlos Rodrigues Lima
FotosCarlos Rodrigues Lima
Portugal

Assim se fez (e desfez) o tribunal mais poderoso do País

TextoAntónio José Vilela
FotosAntónio José Vilela
Portugal

O estranho caso da escuta, do bruxo Demba e do juiz vingativo

TextoAntónio José Vilela
FotosAntónio José Vilela