Os dados avançados pela Sociedade Ponto Verde revelam que no primeiro semestre de 2025 a recolha seletiva de embalagens registou um aumento residual de apenas 2%. A CEO da Sociedade Ponto Verde destaca a necessidade da reavaliação do território.
Portugal está longe de cumprir as metas de reciclagem de embalagens estabelecidas pela União Europeia para o final de 2025 - o País tem de garantir a recolha seletiva de 65% de todas as embalagens colocadas no mercado.
Os dados do primeiro semestre de 2025, recolhidos pela Sociedade Ponto Verde [responsável pelo sistema integrado de recolha, tratamento e reciclagem dos resíduos de embalagens em Portugal], revelam um aumento residual de apenas 2% da recolha seletiva de embalagens, "com apenas mais 4.009 toneladas de embalagens a serem enviadas para reciclagem", em comparação com o período homólogo.
O vidro representa neste momento uma das maiores das preocupações, já que é um dos materiais com mais valor na economia circular - 100% reciclável e reutilizável - e está 1% abaixo do valor homólogo: "Foram recicladas menos 1.300 toneladas deste material, num total de 99.321 toneladas". Em entrevista à SÁBADO, a CEO da Sociedade Ponto Verde, Ana Isabel Trigo Morais, destaca a necessidade de reavaliação do território pelas autarquias e organizações intermunicipais, e alerta para o impacto ambiental e económico de enviar embalagens recicláveis para aterro.
Quais os riscos ambientais e financeiros do não cumprimento das metas?
O País tem três incineradoras, o que querdizer que uma grande quantidade das embalagens [não recicladas] vão para os aterros que estão, em algumas regiões do País, a chegar a limites críticos de capacidade. Há aqui um cenário de grande prejuízo ambiental porque estamos a enviar para aterro materiais de embalagens que poderiamter uma segunda vida, e por outro lado, temos um prejuízo económico porque os consumidores estão a pagar na compra da sua embalagem para que ela seja devidamente tratada e reciclada e, no final do dia, oque acontece é que vai parar ao aterro.
Até agora, a meta europeia para a reciclagem das embalagensera de 55% e o nosso apelo é exatamente porque as exigências para o cumprimento das metas aumentaram, mas também porque o sistema que temos desenhado para a recolha das embalagens não está a dar os resultados que deveria estar a dar.
O envelhecimento da população traz desafios?
Pode ser necessário relocalizar ecopontos para servir melhor as pessoas, exatamente porque sabemos que o envelhecimento da população também traz desafios acrescidos e limitações. As autarquias, as juntas e as organizações intermunicipais têm quereavaliar o território e reavaliar a forma como se recolhem as embalagens no seu final de vida. Não tem que ser apenas através de ecopontos: pode haver recolhas porta a porta,pode haver ecocentros, pode haver incentivos para as pessoas depositarem esses materiais.
Qual das etapas, desde a sensibilização dos cidadãos à recolha, necessita de mais investimento?
Os nossos estudos dizem que os portugueses sabem reciclar, mas precisam de melhor serviçodas suas autarquias, das suas associações e dos seus operadores municipais, para poderemter uma reciclagem mais conveniente.
O grande ponto crítico para atingirmos a metada reciclagem e para sermos um país que cria valor ambiental está nas operações de recolha. Operações estas que têm de sofrer um grande investimento, revisão de processos e integração de novas tecnologias. A sensibilização, a literacia, a cidadania ambiental, os programas de divulgação, sensibilização também estão sempre na primeira linha da atividade da Sociedade Ponto Verde.
Existiu um reforço de €41M do investimento nos serviços de recolha seletiva de resíduos de embalagens. Onde foi alocado e que resultados esperavam alcançar?
Os 95 milhões de euros que pagámos até ao passadomês de junho, que são mais 41 milhões, deviam estar a ser investidosna capacidade operacional de aumentar as recolhas, mais pessoas, mais ecopontos, maiscaminhões, novas formas de ir buscar as embalagens. Preocupa-nos muito que o que estamos a financiar ainda não esteja a trazeros resultados que o País precisa. Sabemos que este aumento precisa de tempo para que o investimento tenha resultados, mas o que não estávamos à espera é que a reciclagem das embalagensna dimensão da recolha continuasse completamente estagnada.
Existem barreiras a nível tecnológico?
As dificuldades são mesmo de natureza da operação e da gestão da operação. Temos um programa que se chama Resource, The Next Level of Circular Economy, que o que faz éidentificar qual é a tecnologia que está desenvolvida e que já está testada no mundo e que melhor se adapta a Portugal. Por isso é que nós financiamos parceriascom agentes públicos para os ajudar a usarem a melhor tecnologia para fazerem a melhorrecolha, a melhor triagem e a melhor separação para se vender na indústria da reciclagem.O setor dos resíduos é um setor em que o desenvolvimento das ferramentasde Inteligência Artificial tem sido de uma rapidez estonteante. Financiámos a instalação do primeiro braço robô para fazer a separação das embalagens aqui em Lisboa, na Valor Sul, com uma tecnologia que nos vai ajudar a ter muito mais desempenhoe a separar muito mais quantidades de embalagens.
Porque é que o vidro é um material tão crítico?
O caso do vidro é crítico porque nós estamos muitolonge de cumprir a meta da reciclagem e é difícil. Portugal é um País onde consumo e a utilizaçãode embalagens de vidro per capita é dos mais elevados da Europa, nomeadamente devido à nossa indústriaprodutora de vinhos. O que acontece é que estamos a perder esse vidro todo, não temos matéria-prima para entregaràs vidreiras, que deixam de ter matéria-prima para fazerem novas garrafas de vinho e têm que importar resíduos de garrafas produzidos noutros países.
70% dos portugueses em casa, depois de consumirem, pegam na garrafae levam-na para o ecoponto.Onde nós perdemos as garrafas de vinho para o aterro é no consumo dos cafés, restaurantes, é noconsumo fora de casa. Tem que se investir muito na recolha forade casa.
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