França e o nacionalismo pintado de verde
A narrativa da extrema-direita contra a ecologia punitiva, que tem tanto de simplista como de populista, é aquela que mais consegue capitalizar votos, convencendo aqueles a quem o sistema não soube dar resposta.
Depois das eleições europeias, o velho continente ficou de olhos postos nas eleições francesas, tentando decifrar as repercussões que um possível governo de extrema-direita poderá ter naquela que é a segunda maior economia da União.
A primeira, e mais evidente, é ter o país da igualdade, liberdade e fraternidade a ser tomado por um partido que não respeita qualquer um destes valores. O segundo, e talvez menos óbvio para os menos interessados no tema, é o impacto significativo que este novo governo poderá ter no desenvolvimento da política climática, tanto à escala nacional como à escala europeia.
O Partido de Marine Le Pen viralizou o conceito de ecologia punitiva para caraterizar as políticas climáticas francesas e europeias. Tal consiste na ideia de que os custos da transição climática estão a ser suportados pela classe trabalhadora e pelos pequenos agricultores, e que as políticas climáticas ditadas por Paris e Bruxelas atacam a liberdade de escolha e o poder de compra.
À primeira vista, poderíamos considerar que oRassemblement National, ao criticar este conceito, estaria perfeitamente alinhado com a transição justa, termo tão utilizado pelos ativistas climáticos e movimentos sociais. A transição justa tem por base a ideia de que a transição climática não pode ser suportada pelas comunidades mais vulneráveis, e por isso devem ser ativados mecanismos que garantam que ninguém fica para trás, ao mesmo tempo que os mais ricos e que mais poluem acarretam os maiores custos da transição.
Esta deveria ser a ideia capaz de captar o eleitorado francês, depois de sucessivas políticas neoliberais que foram alienando a classe trabalhadora. O aumento das desigualdades ao mesmo tempo que se fortaleciam grandes indústrias como a agropecuária e a indústria fóssil, foram algumas das causas para o descontentamento generalizado. No entanto, a narrativa da extrema-direita contra a ecologia punitiva, que tem tanto de simplista quanto de populista, é aquela que mais consegue capitalizar votos, convencendo aqueles a quem o sistema não soube dar resposta.
Não se enganem, para o partido de extrema direita não haverá transição, e esta tão pouco será justa. O programa doRassemblement Nationalprevê parar com o desenvolvimento da energia eólica, cancelando projetos e proibindo futuras prospeções. Além disso, prevê uma forte aposta na energia nuclear e no hidrogénio verde, que apesar de poderem aparentarem ser soluções viáveis, apenas irão contribuir para mitigar as alterações climáticas no longo prazo. Na agricultura, valoriza a curta distância e a produção local mas quer perpetuar a utilização de químicos nocivos para a saúde humana e para os ecossistemas, continuando a beneficiar o lobby agroquímico.
Ao mesmo tempo que dá passos atrás nalgumas das políticas ambientais, atenta contra os direitos humanos, culpando a excessiva imigração pela falha na proteção da natureza. Cria narrativas nacionalistas e xenófobas onde os franceses são protagonistas. Segundo este partido, são os franceses que mais sabem proteger a sua terra, ao passo que os imigrantes não protegem terra nenhuma, até porque não pertencem a terra de ninguém.
Assim, oRassemblement Nationalcai nas suas próprias incongruências, praticando uma ecologia punitiva, mas que em vez de punir a classe trabalhadora, pune a população imigrante. E falha em garantir medidas de adaptação às alterações climáticas aos grupos mais vulneráveis, nos quais se inclui também a classe trabalhadora e pequenos trabalhadores que tanto diz proteger.
Dessa forma, aproveita-se da insatisfação da população, superficializando temas complexos para conseguir chegar ao poder a todo custo enquanto defende tudo e o seu contrário. Vemos o nacionalismo tomar uma nova cor na França, estando agora pintado de verde.
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