O diretor artístico do teatro lisboeta, Diogo Infante, revelou o programa da nova temporada, que arranca na rentrée, em setembro. Até 2025, há muitas peças e concertos para ver.
O espetáculoTelhados de vidro, de David Hare, abre a 12 de setembro a temporada 2024/25 do Teatro da Trindade, em Lisboa, com uma programação que será marcada por temas como política, ditadura, identidade, fama, eutanásia e amor.
O programa da próxima temporada do Teatro da Trindade Inatel foi apresentado esta terça-feira pelo diretor artístico, Diogo Infante, e por alguns dos artistas que com ele trabalharam para a construção desta programação, entre encenadores, atores e escritores.
Diogo Infante começou por assinalar que os resultados da atividade do teatro em 2023 "confirmaram e melhoraram" os números de 2022, tendo registado "mais de 90 mil espectadores".
O responsável salientou que é seu desígnio, à frente do teatro, alcançar "receitas capazes de cobrir os custos de produção e ao mesmo tempo criar espetáculos impactantes e memoráveis, que possam suscitar debate e reflexão na sociedade".
Foi mais uma vez imbuído deste espírito que desenhou uma programação para 2024/2025 com espetáculos que geram confronto com ideologias políticas, o papel social, o género e os pronomes, a eutanásia, a memória da ditadura, a fama, oglamoure o seu lado mais escuro, e "como não podia deixar de ser, o amor".
O primeiro desses espetáculos intitula-seTelhados de vidroe é da autoria do dramaturgo inglês David Hare, um drama contemporâneo sobre poder, política e paixão, aqui com encenação de Marco Medeiros e interpretação de Diogo Infante, Benedita Pereira e Tomás Taborda.
A 19 de setembro estreia-se a peça que venceu a 6.ª edição do Prémio Miguel Rovisco,Sombras, de Miguel Falcão, que lança um "olhar sobre a ditadura, levando as pessoas a atos inimaginados".
Falando da sua peça, Miguel Falcão explicou que se centra numa mulher que, a partir do exterior, apoiava presos políticos e era a única que sabia de um plano de fuga, um texto inspirado no passado ditatorial português e que "nos 50 anos do 25 de Abril se torna ainda mais relevante".
Esta história - encenada por Ana Nave e com interpretações de Carla Maciel e Mafalda Marafusta -- é totalmente ficcionada e dedicada às mulheres que sempre estiveram na retaguarda e no suporte de homens que desempenham papéis principais, as "mulheres nas sombras", explicou o autor
Mas estas "sombras" aludem também às sombras que podem surgir de onde menos se espera, em "regimes democráticos que se julgam consolidados e intocáveis", sem esquecer que em todo o mundo continua a haver ditaduras, regimes opressores, presos políticos e pessoas na linha da frente a lutar por esses presos.
O espetáculo que se segue, a 14 de novembro, intitula-seMarilyn, por trás do espelhoe é o resultado de uma "extensa pesquisa" feita por Anna Sant'ana sobre a vida da atriz Marilyn Monroe, cujo resultado foi entregue a Daniel Dias da Silva que escreveu a peça, explicou Ana Isabel Augusto, encenadora deste espetáculo, que consiste num monólogo teatral, interpretado pela própria Anna Sant'ana.
O espetáculo, que já tem dois anos e apresentações internacionais, chega agora ao Teatro da Trindade para mostrar que a icónica atriz não era sóglamour, era uma mulher "com as suas lutas com a saúde mental, os vícios, a baixa autoestima e a solidão que a acompanhou toda a vida", explicou a encenadora.
Para o espetáculo foi respeitada a imagética da Marilyn, todo o legado que deixou enquanto símbolo de beleza e sensualidade, "sem deixar para trás os momentos de fragilidade que a fazem humana", sublinhou.
A 12 de dezembro estreia-seA médica, de Robert Icke, com encenação de Ricardo Neves-Neves, que explora os temas da ética médica e da capacidade de aceitar a diferença e não marginalizá-la, explicou a atriz Custódia Galego, que faz parte do elenco do espetáculo.
Trata-se de uma peça que mostra que "quanto mais vivemos em liberdade e democracia, mais limites temos para com os outros", suscitando uma reflexão em torno do "respeito pelos limites dos outros e o quanto é difícil viver em sociedade neste contexto", acrescentou.
Já no próximo ano, no dia 6 de fevereiro, sobe ao palcoUm país que é a noite, de Tatiana Salem Levy e Flávia Lins e Silva, espetáculo encenado por Martim Pedroso e com interpretações de Maria João Falcão e João Sá Nogueira.
"É um exercício onde atores e espectadores vão tentar perceber o que seriam esses tempos de ditadura em Portugal e como seria improvável ou impossível estarmos aqui a dizer estas coisas e ter a liberdade de imprensa que temos hoje", assinalou o encenador, alertando para as "forças malignas que perduram na sombra, sempre prontas a atacar-nos".
Martim Pedroso especificou que este espetáculo ficciona a interrupção de uma conversa entre dois amigos -- Sophia de Mello Breyner e Jorge de Sena -, uma invasão de privacidade por dois polícias políticos que, com soberba, invadem um espaço privado, que poderia ser de qualquer um.
No dia 5 de março regressa para mais uma temporadaSonho de uma noite de verão, de William Shakespeare, com encenação de Diogo Infante e com algumas novidades no elenco, seguindo-se, no dia 8, outra peça encenada pelo diretor artístico, a partir de um texto de Paula Guimarães, intituladaEutanasiador.
Diogo Infante contou que recebe muitos textos para possíveis adaptações e este foi um desses casos, mas que o deixou imediatamente agarrado, primeiro "muito atraído pelo título" e depois "sem conseguir parar de ler".
Explicando este seu texto, Paula Guimarães revelou que é uma reflexão sobre um "dilema real" seu relacionado com a eutanásia.
Trata de um interrogatório policial e induz à reflexão sobre a autodeterminação, o direito à vida, o direito à morte e a possibilidade de encarar um novo prestador de serviços, o eutanasiador. "Espero que no fim fiquem como eu, com uma certa admiração e ao mesmo tempo uma certa repulsa em relação a esta figura".
Como já é habitual, faz parte da programação o Ciclo Mundos, um programa anual que dá espaço à música que se faz no mundo, da responsabilidade de Carlos Seixas.
Neste âmbito, o programador revelou que no dia 24 de setembro apresentam-se em palco dois músicos com "diversas afinidades", o cabo-verdiano Mário Lúcio e o brasileiro Chico César.
No dia 22 de outubro chega da Bolívia a cantora e compositora Luzmila Carpio, seguindo-se, a 5 de novembro, a saxofonista norte-americana Lakecia Benjamin.
Para 2025, o Ciclo Mundos deverá trazer o Gospel de uma família tradicional de canto do Mississípi, um haitiano saxofonista e ainda a cantora e compositora nigeriana, residente em Berlim, Nneka.
O presidente da Fundação Inatel, Francisco Madelino, que se juntou à apresentação da temporada, adiantou que está previsto para setembro uma conferência com o público sobre a democracia e o 25 de Abril, no âmbito dos 50 anos.
No segundo semestre, vão encontrar-se nomes como Mário Lúcio, Pepetela e Agualusa para falar sobre "os mundos da lusofonia, sobre o que seria diferente se não houvesse o 25 de Abril e como foi feita a miscigenação", acrescentou Francisco Madelino.