Secções
Entrar

Ricardo Ribeiro: "Sinto-me como um guardião de uma tradição"

E uma tradição "que é muito importante na nossa cultura": o fado. O cantor e fadista edita o seu novo álbum, um disco "muito mediterrânico", esta sexta-feira, 27 de outubro.

Lusa 23 de outubro de 2023 às 13:23
Miguel Baltazar/Jornal de Negócios

O fadista Ricardo Ribeiro edita na próxima sexta-feira o seu novo álbum, Terra que Vale o Céu, que define como "mediterrânico", e no qual garante cantar "a graça e a alegria", em entrevista à agência Lusa.

"Sou um artista muito mais virado para o Mediterrâneo. Costumo dizer que somos um país virado para o Atlântico, mas um povo do Mediterrâneo", disse o fadista.

O álbum conta 14 temas, alguns assinados por Ribeiro, como Tronco e Raiz, com letra e música do fadista, outros, como El Kiko de Diana, com um poema de autoria da fadista Fernanda Maria, ou Prédio em Ruína, com música de Domingos Camarinha; há também um tema composto sobre Gil Vicente, e Tirai os Olhos de Mim, com música de Alain Oulman.

A fadista Fernanda Maria "é uma mulher extraordinária e das fadistas que mais admiro", declarou Ribeiro, a propósito da escolha.

O álbum Terra que Vale o Céu surge quatro anos depois do seu anterior, Respeitosamente (2019).

Para o fadista, preparar este novo trabalho "não foi muito árduo", mas obedeceu a "uma vontade imensa de explorar ainda mais" as suas influências.

O fadista realçou à Lusa "a componente da graça e da alegria" que este disco tem, o que justifica pelo facto de ter sido pai há pouco tempo. "Aquela alegria dele [do filho Francisco, com pouco mais de um ano,] contagia", disse, referindo gostar mais de cantar "coisas profundas, o que não quer dizer que sejam tristes".

Ao filho dedica o poema El Kiko de Diana que juntou num tema único com o poema Se me Deixares, de António Botto, musicado por si.

O fadista, de 42 anos, reconhece uma "maior maturidade" neste momento da carreira.

"Esse amadurecimento tem a ver com a vida, o que nós vamos vivendo e encaixando, a maneira como vamos lidando com o triunfo e a derrota, porque na finalidade são dois impostores e uma consequência do que nós fazemos".

Num texto incluído nobookletdo CD, o musicólogo Rui Vieira Nery faz referência a esse amadurecimento do fadista.

"Ricardo Ribeiro convida-nos neste novo álbum a regressarmos com ele às raízes mais profundas da tradição fadista, ainda que iluminadas agora por um percurso pessoal de amadurecimento e descoberta que o fez passar por outras músicas do Sul que cantam também a paixão, a perda, a solidão e a dor", escreve o musicólogo, historiador do fado.

Nery realça também esta ligação de Ricardo Ribeiro à tradição fadista: "É por isso que o seu fado é cada vez mais um fado antigo que sabe a novo, mas ao mesmo tempo um fado novo que sabe a antigo".

Obookletinclui ainda um poema de Manuel Alegre intituladoRicardo Ribeiro.

À Lusa, o fadista, criador deDeixem-me Ser(Rui Manuel/Manuel Mendes), disse que este novo álbum "é, sem dúvida alguma, muito mediterrânico".

"Estão lá as minhas influências, mas não deixa de ser fado, pois eu sou sempre fadista e sinto-me como um guardião de uma tradição que é muito importante na nossa cultura", sublinhou.

Uma outra influência referida pelo intérprete deAntes Só(Artur Ribeiro), tema com que abre o novo álbum, foi a dos filósofos portugueses António Telmo, Leonardo Coimbra e Álvaro Ribeiro, que lê habitualmente.

Quanto ao alinhamento do novo disco, o fadista disse que Artur Ribeiro, autor de sucessos comoRosinha dos Limões, é um autor de que gosta muito, "um poeta extraordinário e muito fadista". Quanto a este tema, "conhecido de há muitos anos, estava à espera de me dar a oportunidade de o cantar", afirmou.

O álbum inclui aindaChave da Memória(Carminho),Do Silêncio saímos(Fernando Tordo),E Conta Quem Eu Sou(Fernando Guimarães/Ângelo Freire),Meu Amor Não Vale a pena(Nelo/Acácio Gomes) eFado Passado(Nuno Júdice/Fado Franklin de Quadras, de Franklin Godinho).

Ribeiro disse à Lusa que conhece os autores, e eles conhecem-no, são amigos e sabem bem o que queria cantar, exceção para Amélia Muge, a quem pediu um "motivo mediterrânico", e escreveuTerras Dum Mar Interior, com música sua também.

"São todos fados tradicionais. Para mim, o fado tradicional, ou o 'fado-fado', como alguns referem, é aquele que é acompanhado à guitarra portuguesa, viola e baixo, pode ser acompanhado por outros instrumentos, mas para mim fazia todo o sentido neste formato de trio e com este linguajar".

Os músicos talentosos - como os define - que o acompanham nesta gravação, na maioria seus amigos, são José Manuel Neto, na guitarra portuguesa, Carlos Manuel Proença, na viola, e Daniel Pinto, no baixo.

O percussionista Jarrod Cagwin participa nos temasVira-Voltas(Francisco Guimarães/R. Ribeiro),Tronco e Raiz(R. Ribeiro), eTerras Dum Mar Interior(A. Muge), "que pedia umas percussões árabes".

Ricardo Ribeiro acompanha-se à guitarra no temaSe Me Deixares-El Kiko de Diana, e participa emTronco e Raiz, que conta também com Ricardo Dias, no acordeão.

O fadista afirmou-se "muito contente" com o "trabalho de fôlego" realizado de "uma forma natural" e acrescentou: "O disco tem, evidentemente, uma mensagem que cada um vai descobrir por si".

Para Vieira Nery este álbum "é um testemunho simultâneo de continuidade e modernidade, com a marca única de uma voz e de um canto inconfundíveis, a abrir o terceiro século da história do Fado com a consciência sábia do passado e os olhos abertos para o presente e para o futuro".

Artigos Relacionados
Receba o seu guia para sair
todas as semanas no seu e-mail
Subscreva a Newsletter GPS e seja o primeiro a saber as melhores sugestões de fim-de-semana. Subscreva Já