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Três livros que mostram que Jorge Sena é, ao mesmo tempo, "clássico e contemporâneo"

A Guerra & Paz edita três títulos do escritor português. Manuel S. Fonseca acredita que "há um Sena a descobrir" pelos leitores nacionais.

Diogo Barreto 21 de março de 2023 às 08:00
Cofina Media

Jorge de Sena foi um dos mais importantes escritores da segunda metade do século XX português, reconhecido pelos seus trabalhos na área da poesia, ficção e ensaios. E se as coletâneas de poesia estão sob a chancela da Quetzal, a Guerra & Paz adquiriu o direito de publicação de textos em prosa e de teor académico. Esta terça-feira, 21 de março, começam a chegar às livrarias "As Novas Edições de Jorge de Sena", com três títulos: Andanças do Demónio(colectânea de contos), O Físico Prodigioso(novela) e ainda Amor, um ensaio publicado pela primeira vez como um texto individual. 

O editor da Guerra & Paz, Manuel S. Fonseca, mostra-se extasiado com a possibilidade de continuar a editar o autor de Sinais de Fogo(nos últimos anos tem vindo a publicar vários volumes da correspondência): "Nós, como editora, existimos por causa do Jorge de Sena, porque a Mécia [mulher do escritor] queria publicar um livro com textos inéditos. E foi por causa desses textos que criámos a editora Três Sinais, cujo primeiro livro tinha o título Dedicácias. Anos depois, quando criámos a Guerra & Paz, um dos primeiros livros que publicámos foi a correspondência entre o Sena e a Sophia. Mas a verdade é que nunca fomos a editora sistemática do Sena [que esteve muitos anos sob a alçada da Babel]".

Esta situação alterou-se com a falência da chancela e com um estreitar da relação entre Manuel S. Fonseca e Mécia, que viria a morrer em 2020, aos 100 anos. "Foi a filha Isabel que ficou responsável pela obra do pai e que nos deu os direitos de a publicarmos", explica, sem esconder o orgulho que sente. 

Três livros, três estilos
As edições que chegam agora ao mercado mostram três facetas do escritor que viveu os últimos anos da sua vida nos Estados Unidos, onde lecionava na Universidade da Califórnia. As Andanças do Demóniomostram um autor interessado em explorar o género curto do conto, contando pequenas histórias (algumas das quais infantis) com muita violência e erotismo; O Físico Prodigiosoé uma novela onde a sexualidade ganha contornos de uma obscenidade inédita na literatura portuguesa; e Amoré um ensaio que revê a presença deste tema na literatura portuguesa, desde as cantigas galaico-romanas até à década de 70 do século XX, passando por Camões, Gil Vicente, Eça de Queirós, Florbela Espanca ou Eugénio de Andrade.

Sobre esta última edição, Manuel S. Fonseca afirma que é um livro "delicioso, impuro e pecaminoso" e que é representativo da craveira intelectual de Sena, um dos "melhores ensaístas literários nacionais", fazendo até uma comparação bastante elogiosa entre o poeta e um dos maiores vultos da literatura britânica: T. S. Eliot. "Ambos eram poetas e romancistas e escreveram de forma desassombrada sobre a sua própria arte."

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Foto: Guerra & Paz
Foto: Guerra & Paz
Foto: Guerra & Paz


Com estas novas edições, Manuel S. Fonseca procura atrair novos leitores para o mundo de Jorge de Sena, "uma das figuras clássicas da literatura portuguesa". "Os leitores atuais procuram o mesmo que os leitores do século XX: uma emoção. E poucos escritores têm tanta capacidade para emocionar como o Sena, que chegou mesmo a dizer que sem emoção não há nem arte nem literatura". 

E é para potenciar essa emoção que a Guerra & Paz decidiu editar os livros "no seu estado virginal", sem contextualizações que não aquelas dadas pelo próprio autor. E para mostrar a contemporaneidade de Sena, o editor optou por editar os livros com capas que "retirem o peso de clássico atribuído ao Sena". "Fizemos umas capas que não são nem vetustas nem austeras, mas sim modernas, como o próprio Sena é moderno", esclarece o editor.

O futuro
O plano da editora é publicar "seis, sete, no máximo oito livros" do Sena por ano, sendo que em 2023 devem chegar ainda uma edição de O Príncipe, de Maquiavel, acompanhado pelo ensaio de Sena sobre esta obra e um verbete sobre a literatura portuguesa escrito para a Encyclopedia Britannica. "Queremos dar destaque a toda a obra de Jorge de Sena e por isso estamos a fazer uma individualização da obra", sublinha.

Pelo caminho haverá lugar para mais livros na tradição dos beaux livres, mas sobre isso, Manuel S. Fonseca prefere guardar algum segredo. "Tudo a seu tempo."

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