Em boa verdade, António Lemos não está totalmente convencido de que o tártaro seja um prato que saiba melhor no verão. A confidência é feita no restaurante que abriu na Rua da Boavista, em Lisboa, com a mulher – ou que ela, Maria Calheiros Machado, abriu com ele, para sermos mais precisos –, o MISC by Tartar-ia.
De pé, atrás do balcão, António aponta para o bife tártaro asiático que acaba de servir antes de apresentar a sua argumentação: “Este aqui, com o sabor do sweet chili sauce, dos cogumelos shiitake, das ervilhas wasabi, mais o dashi (caldo japonês feito no MISC a partir de peixe seco e alga), as ovas de arenque e shiso (erva aromática japonesa), os coentros, a pimenta e o tabasco, vai-me dizer que este prato não ia bem numa noite fria de inverno com um bom vinho tinto?”
O jornalista mistura o caldo e a carne com todos os elementos anteriores – como mandam as regras –, leva o garfo à boca e concede: o cliente nem sempre tem razão. Mas e os pratos que não são tártaro?
É que além do de atum (marinado em óleo de sésamo coentros e raspas de lima, servido com puré de abacate com maionese, esponja de tinta de choco e rebentos de shiso), do de salmão (este marinado em molho de soja, cebolinho, azeite e limão, e acompanhado de puré de abacate e manga, maionese e ervilhas de wasabi e ainda salada de daikon) e do bife tártaro clássico (na foto ao lado), no MISC há ainda pratos que se afastam tanto da proposta inicial (já lá vamos) quanto um arroz de lingueirão, croquetes, hambúrguer de carne maturada, brioche rabo de boi ou arroz de perdiz (exceto no verão).
“Isso tudo são pratos”, conta António, “que a Maria acrescentou para que a carta tivesse mais opções”. Apesar de tudo, admite, os tártaros vendem-se menos no inverno do que no verão.
É a experiência a falar. Foi já há seis anos que Maria, a ideóloga deste projeto, entrou num conceito novo de restauração em Portugal (o do Mercado da Ribeira, onde marcou presença desde o primeiro momento até junho deste ano) com uma proposta de “fazer tártaros de tudo o que fosse possível”, recorda. Dieter Koschina, o chef alemão do Villa Joya, no Algarve, um dos melhores restaurantes do mundo, fez a consultoria inicial do projeto.
Na equipa inicial estava Vítor Santos, que depois de passar umas temporadas em Espanha no restaurante com estrela Michelin do Hotel Marqués de Riscal regressou e assume agora a chefia do MISC by Tartar-ia, segunda encarnação do conceito original mas agora num restaurante com dois balcões: um corrido que se estende para o interior e outro, à janela, virado para a rua.
Além dos tártaros (e um ceviche), dos arrozes e de outros pratos quentes, há ainda uma respeitável secção vegetariana – porque “o vegetal em Portugal é mal utilizado na restauração, não há criatividade”, lamenta António – com saladas várias e croquetes de beringela que merecem ser provados.
Para sobremesa há cookie de chocolate com caramelo salgado da Ar by Natasha Marques e um cheesecake de meter respeito: é a tarte de queijo com crumble de amêndoa, queijo feta (para contraste) e zero frutos silvestres. Quaisquer semelhanças com o cheesecake tradicional não são coincidência – são antes inexistentes. Prove-o de segunda a sexta, das 12h30 às 22h30.