Ler é um acto de entrega consentido: são sonhos, medos, amores, desamores, impossibilidades e heróis espalmados em folhas de papel. E depois vem uma possibilidade deslumbrante de conseguir levantar aquelas letras e dar-lhes o que a nossa imaginação tiver para elas. É ouvir vozes antigas e novas, e encontrar uma companhia mesmo na mais profunda solidão.
QUEM AINDA NÃO descobriu a alegria de ler, é porque ainda não sabe a alegria que o espera. Ler é um prazer que se vai conseguindo aos poucos, não aparece de um dia para o outro. Quando somos novos é tudo insuportável, são tantas letras juntas, tantas frases, tantas páginas, que a ideia de começar um livro é um tormento. Não se quer começar, porque se sabe que vai demorar até acabar. Quer-se rápido e fácil, e que não agite muito o que vai cá dentro. Na escola obrigam-nos a ler o que ainda não queremos nem sabemos; autores que precisam de tempo para serem lidos com o amor e a atenção que eles merecem. É assim que muitas vezes se afasta um leitor de um escritor: obrigando-o a ler o que só deve ser lido por vontade própria. Obrigar uma criança a ler é instigá-la a ganhar aversão à leitura. Ler tem de ser um impulso que nos toma de assalto, como dar um mergulho no mar. Se nos atiram para dentro de água, só queremos sair e ir a correr para a toalha. Houve uma altura em que insistia com as minhas filhas para lerem, porque não aguentava que elas não descobrissem o que já me tinha feito tão feliz. De tanto querer que lessem, elas lá se rendiam e liam por mim. Mas transformar o meu prazer na obrigação dos outros resolve o meu problema, mas cria um neles. Hoje em dia ofereço-lhes livros, e depois espero que um dia olhem para eles com a curiosidade delas. Aquilo que me afastou do Eça de Queiroz foi ter sido obrigado a lê-lo numa altura em que ainda não tinha tamanho suficiente para conseguir abarcar tudo o que ali estava escrito. Era tudo tão grande, tão longe, tão perto de nada que eu conseguisse sentir, que me achava profundamente ignorante. Só quando voltei a ele com a idade e a vontade sincronizadas, é que percebi o que queriam que entendesse muito antes do meu tempo. Ler é uma alegria que tem de ser conquistada pelo leitor, e não por quem vem de fora. Pode – e deve – ser incentivada por quem já leu mais, porque essa partilha é um gesto de amor. Mas incentivar está muito longe de forçar, porque de uma palavra à outra vai uma vontade imensa de resistir – e de desistir. Ler é um acto de entrega consentido: são sonhos, medos, amores, desamores, impossibilidades e heróis espalmados em folhas de papel. E depois vem uma possibilidade deslumbrante de conseguir levantar aquelas letras e dar-lhes o que a nossa imaginação tiver para elas.
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