O cenário é de tal forma disfuncional que muitos magistrados se veem obrigados a regressar ao papel, contrariando o regime legal em vigor.
A história repete-se na Justiça portuguesa, onde as mudanças de sistemas informáticos continuam a ser feitas de forma apressada, sem ouvir quem conhece o terreno e suporta diariamente o peso do seu mau funcionamento. Depois do colapso do Citius, que paralisou os tribunais durante semanas, é agora a jurisdição administrativa e fiscal que mergulha no caos total após a migração do SITAF para o novo sistema integrado, com as interfaces MPCODEX e MAGISTRATUS.
Desde 20 de outubro, o panorama é desolador. Processos, inclusive urgentes, desapareceram; outros foram parar a juízes errados ou surgem em branco; acessos foram suprimidos; julgamentos adiados; e ferramentas fundamentais à atividade dos magistrados pura e simplesmente deixaram de funcionar. A confiança na informação disponibilizada pelo sistema está profundamente abalada.
O IGFEJ, organismo responsável pela migração, avançou sem consulta nem coordenação com a Procuradoria-Geral da República, cortando de forma unilateral os acessos até então assegurados pelo SITAF. O resultado é o bloqueio quase total do trabalho judicial e do Ministério Público: magistrados ficaram sem meios para consultar processos de outras instâncias, verificar decisões superiores, apresentar notas de custas ou garantir a tramitação regular dos casos.
As falhas multiplicam-se diariamente em todo o país. Documentos desaparecem, articulados não se conseguem submeter, as assinaturas eletrónicas surgem e desaparecem sem lógica aparente, há mandatários erradamente notificados e modelos processuais essenciais simplesmente inexistentes.
O cenário é de tal forma disfuncional que muitos magistrados se veem obrigados a regressar ao papel, contrariando o regime legal em vigor.
Como se não bastasse, o próprio helpdesk do IGFEJ impõe que cada anomalia seja reportada em detalhe, como se de casos isolados se tratasse — uma exigência absurda que apenas agrava a paralisia.
O Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, que tem uma função constitucional de fiscalização e acompanhamento da jurisdição, está impedido de aceder ao sistema. Esta limitação constitui uma séria perturbação da separação de poderes. Há processos do Supremo Tribunal Administrativo que surgem registados em tribunais de primeira instância e milhares de processos relativos à regularização de migrantes (AIMA) mal atribuídos, o que, se não for corrigido, obrigará à emissão de cerca de 140 mil despachos apenas para os reencaminhar. Um cenário digno do absurdo.
Tudo isto podia ter sido evitado. Bastava ouvir quem trabalha dentro do sistema, quem conhece as suas especificidades e antecipa os riscos antes que eles se tornem desastres.
A Justiça não é um laboratório de experiências informáticas, nem um campo de ensaio para decisões técnicas tomadas à distância dos tribunais. É uma estrutura viva, que exige prudência, conhecimento e diálogo.
Quando se impõem mudanças tecnológicas sem consultar magistrados, advogados e oficiais de justiça, o erro repete-se com pontualidade trágica: a máquina para, os processos atrasam-se, a confiança pública degrada-se. E o que se apresenta como modernização transforma-se, mais uma vez, em retrocesso.
A lição é simples, mas parece nunca aprendida: reformas tecnológicas na Justiça só podem ser bem-sucedidas se começarem por ouvir quem a faz funcionar todos os dias.
Homem de pensamento e de ação, Laborinho Lúcio acreditava que “a justiça é um verbo no futuro”, lembrando-nos de que a sua construção é um caminho inacabado, feito de coragem, reflexão e esperança.
Os magistrados não podem exercer funções em espaços onde não lhes sejam asseguradas as mais elementares condições de segurança. É imperioso que existam vigilantes, detetores de metais e gabinetes próprios para o atendimento ao público, inquirições e interrogatórios.
Pergunto-me — não conhecendo eu o referido inquérito arquivado que visaria um juiz — como é que certas pessoas e associações aparentam possuir tanto conhecimento sobre o mesmo e demonstram tamanha convicção nas afirmações que proferem.
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Álvaro Almeida, diretor executivo do SNS, terá dito, numa reunião com administradores hospitalares, que mesmo atrasando consultas e cirurgias, a ordem era para cortar.
Pela primeira vez podem trabalhar numa organização até cinco gerações, um facto que, apesar de já por si inédito, não deixa de acrescentar desafios e dificuldades organizacionais, e sociais, particularmente para quem lidera pessoas.