Mercado voluntário de carbono ou mercado voluntário de greenwashing?
A poucos meses das urnas o Governo pratica também o seu próprio greenwashing ao parecer empenhado no combate às alterações climáticas, apesar de na prática se revelar pouco ambicioso e lento na implementação dos seus objetivos.
Na passada sexta-feira, 5, o Governo publicou um diploma legislativo que implementa um mercado voluntário de carbono em Portugal. Esta medida vem trazer uma nova possibilidade para as empresas e outras entidades compensarem as suas emissões de gases com efeito de estufa e alcançarem a neutralidade carbónica. Contudo, na falta de tantos diplomas essenciais em matéria climática, este parece mais uma manobra de distração do Governo em período pré-eleitoral.
Numa corrida contra o tempo para mitigar as alterações climáticas, cria-se então este novo mecanismo. Na prática, a partir de agora as empresas poderão, a título voluntário, compensar as suas emissões ao desenvolverem projetos de sequestro de carbono, como por exemplo através da plantação de árvores em áreas particularmente vulneráveis a incêndios. Com base nesses projetos terão a possibilidade de obter créditos de carbono, permitindo-lhes compensar as emissões decorrentes das suas atividades.
Desengane-se quem pensa que os mercados de carbono são uma medida inovadora do nosso governo. Na União Europeia já existe um mecanismo semelhante desde 2005, mas por oposição ao modelo português, este é obrigatório e apresenta um número fixo de créditos de carbono que podem ser emitidos. Assim, as empresas de setores particularmente intensivos, como é o caso do setor da energia, necessitam de comprar os créditos correspondentes às suas emissões, correndo o risco de terem que diminuir a sua produção caso não haja créditos suficientes para serem transacionados.
No caso português, há maior abertura mas pouco vínculo. As empresas de qualquer setor passam agora a ter mais uma oportunidade, caso assim o pretendam, de se mostrarem comprometidas com a neutralidade carbónica e com o combate às alterações climáticas. No entanto, este comprometimento pode ser falacioso e não passar de uma estratégia de marketing para que aparentem ser ambientalmente mais responsáveis daquilo que são na realidade, praticando o chamado greenwashing.
Aderir a este mercado pode ser importante para aumentar a responsabilidade climática das organizações, mitigando emissões que de outra forma seriam praticamente impossíveis de mitigar. Mas este comprometimento de nada serve se não houver uma verdadeira preocupação e investimento direto na descarbonização das indústrias e na diminuição real das emissões de gases com efeito de estufa. Por isso mesmo, caso não seja entendido como uma medida adicional aos verdadeiros compromissos ambientais, este mercado pode desvirtuar um dos principais objetivos do governo na mitigação das alterações climáticas: investir em novas tecnologias e adaptar os modelos de negócio para que estes sejam capazes de poluir menos. Portanto, da maneira que está concebido, as empresas conseguem operar exatamente da mesma maneira, desde que implementem projetos suficientes para as permitir continuar a poluir e emanar o mesmo número de emissões e o mercado voluntário de carbono torna-se um verdadeiro mercado de greenwashing.
Simultaneamente, a poucos meses das urnas o Governo pratica também o seu próprio greenwashing ao parecer empenhado no combate às alterações climáticas, apesar de na prática se revelar pouco ambicioso e lento na implementação dos seus objetivos. Antes de implementar um mercado voluntário de carbono é importante definir qual a quantidade de gases com efeito de estufa que ainda podem ser emitidos para manter a temperatura global em linha com as metas estipuladas ao nível europeu e internacional. Esta definição deveria constar no Orçamento de Carbono, diploma esse que no início do ano de 2024 ainda não existe e que deveria ter sido fixado para o período de 2023-2025, para que assim as empresas e outras instituições tivessem uma noção da real necessidade de redução de emissões a nível nacional.
Se ficarmos à espera que os créditos de carbono nos salvem do aquecimento global, continuando a produzir exatamente da mesma forma, acabaremos num país cheio de projetos de plantação de árvores mas com indústrias obsoletas que não acompanham o resto do mundo na verdadeira descarbonização.
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