Eis que eles, impantes de soberba, já confessam o que realmente querem (parte II)
André Ventura disse finalmente aquilo que há tanto tempo ansiava: “Não era preciso um Salazar, eram precisos três para pôr o país em ordem”. Resta saber se esse salazarista conhece a fábula da rã que queria ser grande como um boi.
André Ventura está mesmo cheio de si.
Na verdade, eis que finalmente ele disse aquilo que há tanto tempo ansiava por gritar aos quatro ventos: “Não era preciso um Salazar, eram precisos três para pôr o país em ordem”. E, pondo-se, como sempre, em bicos de pés, disse querer ganhar as eleições presidenciais para ser “a mão firme que o país precisa”.
É difícil ser mais claro que isto. E atrevido.
Resta saber se esse salazarista confesso conhece a fábula da rã que queria ser grande como um boi. Provavelmente não.
Resta esperar que aqueles e aquelas que vão eleger o próximo presidente da República tenham presente os ensinamentos que estão expressos nessa edificante história infantil.
Obviamente, ter o governo e a maioria dos deputados da Assembleia da República a seguir à risca o ideário do Chega (a Lei da Burca e o projecto de Lei da Nacionalidade são os últimos sinais dessa subserviência ideológica), ajuda muito a insuflar o ego de um arrivista tosco e inculto que quer ser tudo na vida. Ontem queria ser primeiro-ministro, agora quer ser presidente da República.
Infelizmente, até o presidente da República em exercício lhe satisfaz as vontades.
Esclareço.
Marcelo Rebelo de Sousa sabe perfeitamente que a legislação sobre emigração aprovada pelo Parlamento não apenas vai acarretar graves problemas à economia nacional, como, para além de constituir um acto de profunda desumanidade para com seres humanos que têm a mesma dignidade que os portugueses e as portuguesas, e de ser absolutamente contrário a valores civilizacionais da lusofonia que têm sido, desde há seculos, o núcleo central estruturante do nosso país, é altamente lesiva para os interesses estratégicos e diplomáticos de Portugal, enquanto Estado e Nação com quase nove séculos de História.
E, muito seguramente, cristãos e cristãs é que eles e elas não são - ou seja, todos e todas aqueles/as que contribuíram para a entrada em vigor dessa lei infame.
Todavia, apesar de estar bem consciente desse facto (o seu discurso a justificar a promulgação do diploma é disso suficientemente elucidativo), e nada tendo a perder, pois está em final de mandato e não pode, mesmo que o quisesse, concorrer novamente à eleição para o cargo que ainda está a exercer, o PR preferiu dar o seu aval a essa perigosa legislação em vez de ter a coragem de denunciar expressamente os efeitos desastrosos que dela irão resultar e, consequentemente, vetar a Lei.
Mesmo que esse veto pudesse vir a mostrar-se inútil (face à maioria de 70% de deputados que aprovaram essa segunda versão da Lei), teria ficado o acto de coragem de alguém que talvez devesse estar a pensar melhor no julgamento que a História irá fazer dele no futuro.
A não ser que Marcelo Rebelo de Sousa já se tenha conformado com a ideia de que a Democracia e o Estado de Direito têm os dias contados e que, no futuro, a História irá ser escrita pelos xenófobos, racistas e fascistas que “as pessoas de bem” apelidam de extrema-direita nacionalista e populista - os quais, porém, também não apreciam muito o actual presidente da República.
Vamos ver qual será o seu comportamento relativamente à “Lei da Burca” já aprovada, em plenário da AR e ao projecto de lei da Nacionalidade por enquanto apenas aprovado em Comissão especializada.
Claro que toda esta actividade politico-legislativa tem como principal objectivo criar cortinas de fumo obstaculizadoras da discussão dos verdadeiros problemas do País (declínio económico e empobrecimento generalizado da população, que se manifesta muito particularmente na inexistência de habitação a custos acessíveis, destruição do serviço nacional de saúde e da escola pública de qualidade, desinvestimento na ciência e na tecnologia de ponta, abandono da ideia de criação de sistema judiciário eficiente, leal, equitativo e não preconceituoso).
Nada de novo. Como aconselhou o fascista, xenófobo e racista estado-unidense Steve Bannon, ex-assessor político de Donald Trump, “flood the zone with shit”.
E é isso que esta gente está a fazer. Lamentavelmente, repito, já não é só o Chega que actua seguindo essa cartilha.
E isso está a acontecer porque o objectivo final não é a preservação da dita “Civilização Cristã Ocidental” face à “invasão islâmica”, muito menos a defesa dos direitos e dos interesses das mulheres, mas sim a destruição dos direitos sociais e, em última análise da democracia política e do Estado de Direito.
Antes, só era posta em causa “a subsistência do sistema de pensões”, agora já se sustenta que é todo “o estilo de vida europeu” que é económica e financeiramente inviável.
E, em perfeita continuidade da postura anti-social que nós portuguesas e portugueses já experimentámos nos tempos da Troika (mas que no caso da Grécia foi bem pior), a União Europeia já ameaça não permitir a transferência de verbas do orçamento comunitário para os países que não cumpram “as políticas de poupança nas reformas sociais recomendadas” pela Comissão.
Que aviltante é o cinismo contido no uso da palavra “recomendadas”! Quão longe estamos do ideal europeísta dos pais fundadores das Comunidades Europeias.
Mas disso não cuidam os “comentadores” e as “comentadoras” que inundam os vários meios de comunicação social, vomitando incessantemente a retórica manipuladora da extrema-direita, assente nas mais grosseiras distorções da verdade dos factos.
E ainda se atrevem a dizer que a comunicação social está dominada pela esquerda radical, nomeadamente pelo Bloco de Esquerda. Bem pelo contrário, os defensores de um ideário de uma esquerda que não se conforma com a destruição do Estado Social e a violação dos direitos das minorias são, isso, os alvos a abater, valendo para tanto as maiores torpezas, as mais vis mentiras e a pior baixeza de carácter.
O que aconteceu recentemente com a historiadora Raquel Varela é apenas mais um sintomático episódio dessa ignóbil campanha de “apagamento” dos “perigosos e indesejáveis esquerdistas” que não tem à vista.
Outra mais recente vítima dessa campanha de extermínio político é a ex-coordenadora nacional do Bloco de Esquerda Mariana Mortágua.
Sem dúvida que a mesma terá cometido erros na sua acção como dirigente dessa organização partidária, mas a intensa ferocidade dos ataques que lhe foram dirigidos não resulta desses erros.
Fizesse ela o que fizesse, dissesse ela o que dissesse, era sempre atacada. Das formas mais repelentes e repugnantes. E cobardes.
A não ser que os direitos humanos, a Democracia e o Estado de Direito tenham mesmo os dias contados - o que será terrível -, o que foi feito, escrito e dito acerca da participação de Mariana Mortágua na Flotilha Humanitária Global Sumud irá ser assinalado como uma das actuações mais desprezíveis na História de Portugal.
Claro que a circunstância de ela ser mulher e lésbica foi um dos motivos dessas condutas ignóbeis e aviltantes.
Já havia muita misoginia e muita homofobia a circular pelo país antes de o Chega as ter transformado em bandeiras de combate, mas toda essa miséria moral e de carácter se acentuou com o surgimento dessa gente que, sem pudor ou vergonha, propaga, a torto e a direito e com a maior impunidade, esse ódio visceral de que estão possuídos, sem que as autoridades do sistema judiciário cumpram as obrigações que lhes são impostas por Lei escrita.
Omissão essa que constitui uma flagrante demonstração de que não existe um normal funcionamento das instituições do Estado português. Mais uma, acrescento, porque esta não é a única demonstração dessa perigosa situação de um não funcionamento normal das instituições.
Inês Sousa Real do PAN e Mariana Leitão da Iniciativa Liberal que se cuidem, porque poderão ser as próximas.
Mas essa misoginia e essa homofobia não são as únicas razões que motivam esses persistentes ataques vis, cobardes e ignóbeis a Mariana Mortágua.
Vão ver que, independentemente de quem a substituir nesses lugares, a “saída de cena” do partido e o abandono do lugar de deputada por parte de Mariana Mortágua não irá fazer cessar os ataques ao Bloco de Esquerda.
É que, ao contrário do Livre (que não existia na altura) e do PC (que sempre teve uma postura de duplicidade durante esse lapso de tempo da história do país), o Bloco de Esquerda é o lídimo representante do que de bom e de mau aconteceu no PREC e da primeira campanha de Otelo Saraiva de Carvalho à presidência da República.
E os descendentes dos derrotados no 25 de Abril de 1974, do 28 de setembro desse mesmo ano e do 11 de março de 1975 (e que beneficiaram, mas não participaram – salvo Jaime Neves – no 25 de novembro desse mesmo ano), não esquecem nem perdoam o medo e as humilhações que esses seus ascendentes sofreram e passaram nesses curtos meses.
Medos e humilhações que não são nem sequer minimamente comparáveis com aquilo que os anti-fascistas sofreram, durante décadas, às mãos dos assassinos e torcionários da PIDE e dos demais aparelhos repressivos do Estado Novo.
Mas, ainda assim, a vontade de vingança é tenaz e persistente. Eles nunca desistirão.
Com as devidas diferenças, tudo isto me faz recordar os relatos dos acontecimentos subsequentes à derrota da Comuna de Paris, movimento popular que se desenvolveu na capital francesa entre os dias 18 de março e 21 de maio de 1871.
A repressão dos comunards, homens e mulheres, por parte do governo liderado por Adolphe Thiers foi cruel e sanguinária. Milhares de pessoas foram executadas sumariamente ou na sequência de “Conselhos de Guerra” e muitas outras foram deportadas ou condenadas a trabalhos forçados. E, para evitar a “contaminação revolucionária”, os filhos e as filhas foram separados dos pais.
Nada disso está, obviamente, a acontecer em Portugal. Não estamos no século XIX.
Mas durante o PREC houve assassinatos. Que ficaram impunes.
Eis que eles, impantes de soberba, já confessam o que realmente querem (parte II)
André Ventura disse finalmente aquilo que há tanto tempo ansiava: “Não era preciso um Salazar, eram precisos três para pôr o país em ordem”. Resta saber se esse salazarista conhece a fábula da rã que queria ser grande como um boi.
Eis que eles, impantes de soberba, já confessam o que realmente querem (parte I)
E essa gente está carregada de ódio, rancor e desejos de vingança, e não esquecem nem perdoam o medo e a humilhação que aqueles seus familiares (e, em alguns casos, eles próprios, apesar de serem, nessa altura, ainda muito jovens).
E que tal irmos todos votar?
Abdicar do direito a votar – e, portanto, de manifestar a opinião própria acerca do estado do país – parece-me um comportamento muito impróprio.
Gaza, Gaza e, mais uma vez, Gaza
Campanhas dirigidas contra Mariana Mortágua mais não são do que inequívocos actos de misoginia e homofobia, e quem as difunde colabora com o que de mais cobarde, vil e ignóbil existe na sociedade portuguesa.
O "Reichtag moment" nos EUA
Em 1933, antes mesmo de ter sido realizada uma qualquer investigação, os nazis culparam os comunistas por esse incêndio.
Edições do Dia
Boas leituras!