
Diz-nos a mais famosa equação de Einstein que, grosso modo, energia gera energia - é possível criar matéria directamente a partir da energia. Quando a intervenção do ser humano na natureza depende de escolhas construtivas ou destrutivas, este raciocínio adquire um contraste mais interessante.
Portugal precisa de gerir os seus recursos hídricos, é um facto. Mas é possível pensar estas complexas dinâmicas sem pôr fim a cenários naturais idílicos, afogados por polémicas tensões entre a natureza e o progresso, entre a preservação da tradição e o alcance das fundamentais e velozes carruagens das novas tecnologias. Nem só o lançamento de gases nocivos para a atmosfera é um crime contra a natureza: a destruição de paisagens, de habitats naturais de povoações humanas e de espécies também o é.
Preparo-me para visitar a região do Tâmega (Alto Tâmega, Daivões, Gouvães e Fridão) e confesso que, pela experiência que tenho tido quando visito locais como a região do Tua ou outras paisagens ameaçadas, preparo-me igualmente para ficar chocado. Perturba-me olhar, tocar, cheirar e sentir o pulsar vibrante da natureza, sabendo que em breve será "esventrado" por barulhentas máquinas de construção.
Procuro informar-me para manter a razoabilidade na análise. No entanto, mesmo colocando estas interpretações numa folha de cálculo e escutando o argumentário dos promotores e defensores das barragens, continuo sem entender a relação custo-benefício, o que me leva a crer que, ou tenho um défice de atenção para acompanhar estas contas, ou os critérios base - entenda-se, os valores humanos subjacentes a esta análise - são efectivamente distintos.
Diz-nos o Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente (GEOTA) - com base em estudos, análises e os mesmos gráficos e folhas de cálculo - que o Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico (PNBEPH) aumentará cerca de 8% a factura eléctrica das famílias portuguesas. Diz-nos também que o investimento em projectos de eficiência energética custa 10 vezes menos que a construção das novas barragens e que o aumento de potência em barragens já existentes custa 5 vezes menos.
Mais, dados nacionais e internacionais demonstram que as novas barragens constituem um dos piores sistemas de produção energética no que diz respeito aos impactes sociais e ambientais. E, ainda assim, continuamos a "investir" nestes negócios que, de acordo com o Sr. Ministro do Ambiente, já não podem ser desfeitos sob pena de pesadas indemnizações. Porque não, se outros contratos em diferentes âmbitos e com grandes empresas têm sido revogados? Fico à aguardar respostas, quando o que me é permitido é apenas perguntar.
A construção das Barragens da região do Tâmega está envolta em inúmeras contradições. É cercado por esta neblina em que viajo até ao magnífico norte do país. Pelo caminho, procuro manter sempre a confiança de que alguma mudança será possível. Mudança esta que reflicta a real vontade e a participação das populações locais, a riqueza imaterial, cultural e ambiental destes ecossistemas únicos, bem como a gestão sustentável dos recursos hídricos e energéticos do país.
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