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Morte do líder da Renamo deixa em aberto negociações de paz

03 de maio de 2018 às 22:44

Dhlakama morreu na Serra da Gorongosa, centro de Moçambique, devido a problemas de saúde.

Comentadores moçambicanos destacam que a morte do líder da Renamo, Afonso Dhlakama, lança incertezas sobre o comportamento do maior partido de oposição em Moçambique no futuro e as próprias negociações de paz.

Salvador Forquilha, director do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE) e docente de Ciência Política na Universidade Eduardo Mondlane, disse àLusaque foi apanhado de surpresa com a morte de Dhlakama, esta quinta-feira no centro de Moçambique, e que este desaparecimento abre o risco de um período de instabilidade na Resistência Nacional Moçambicana (Renamo) e que ameaça o próprio país.

"É difícil perceber o que vai acontecer, a começar muito pela própria Renamo: se entra numa fase de instabilidade interna e essa instabilidade tem uma relação directa com a política nacional, que também se tornaria muito instável", observou.

O comentador político destacou "o papel incontornável" de Dhlakama no diálogo com o Governo, com vista à paz em Moçambique, e que envolvia, entre vários dossiês, uma revisão constitucional em relação à escolha dos governadores provinciais e o desarmamento e integração do braço militar do maior partido de oposição nas Forças de Defesa e Segurança.

"Sempre achei que o processo estava pouco institucionalizado e agora vamos sentir as consequências disso", assinalou Salvador Forquilha, reforçando o papel centralizador de Afonso Dhlakama: "O grande desafio agora em cima da mesa é perceber o que vai acontecer a seguir".

O director do IESE acredita que todos aqueles dossiês foram assumidos "com sentido de responsabilidade" pelo líder da Renamo, mas "resta saber se também era o caso do seu círculo mais próximo" e "se o país não resvala outra vez para mais uma situação de violência".

A questão coloca-se também em relação à Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), partido no poder há mais de 40 anos, onde as clivagens internas "serão menos evidentes devido à sua maturidade", mas que, segundo Forquilha, se podem acentuar nesta fase.

"Começa a ser visível que nem todos estavam sintonizados com o dossiê das negociações", alertou.

No mesmo sentido, o filósofo Severino Ngoenha espera que esta morte "não seja uma justificação para um novo caso de guerra em Moçambique".

Severino Ngoenha estabeleceu uma analogia entre o que se passou no Brasil, em que "Lula da Silva foi incapaz de encontrar uma continuidade que merecesse a confiança da esquerda da brasileira" com o desafio agora colocado à Renamo, que não tem, sustentou, um número dois desde a saída de Raul Domingos, que foi mediador-chefe da delegação da força liderada por Dhlakama no Acordo Geral de Paz, em Roma em 1992.

"Corre o risco de se fragmentar", avisou, e trazer a ameaça de nova guerra em Moçambique: "[O Presidente da República, Filipe] Nyusi perde um interlocutor direto. Com quem vai falar agora?"

Quanto à Frelimo, Severino Ngoenha espera que a morte de Dhlakama não seja aproveitada como uma justificação para parar o diálogo.

"Quero ser optimista, mas não estou a conseguir", afirmou o filósofo que tem, apesar disso, "uma esperança de que isto tudo evolua muito rapidamente e que a Renamo tenha uma postura de partido".

O presidente da Renamo morreu pelas 08h00 (menos uma hora em Lisboa) na Serra da Gorongosa, centro de Moçambique, devido a problemas de saúde.  O corpo deverá ser transferido na sexta-feira para o Hospital Central da Beira.

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