Sábado – Pense por si

Pedro Duro
Pedro Duro

Sonhou-se (talvez se sonhe) de várias maneiras. Do que tem mais saudades é de sonhar-se compositor. Realiza-se advogado, roubando tempo para compor em palavras o que já não sabe escrever em pautas.

Chegada

Aos poucos, já começava a "sonhar para a frente e a sorrir para trás", recuperando a mensagem adormecida de uma curvada idosa e a sabedoria dos levadeiros que preferiam encaminhar a água para fazer vida a desperdiçar vida à espera da água.

Miguel

Destino

Apetecia-me frango assado. Quando chegasse a casa ainda ia às compras. Talvez conseguisse rever umas coisas à noite, para compensar a desgraça da manhã.

Miguel

Solidão

O telemóvel. Falam mal do telemóvel. Dizem que nos isola. O meu não. Faz-me companhia. Elas gostam de mensagens. Algumas adoram áudios. Olho para o ícone na esperança sei lá do quê.

Os sábios

O restaurante ficava perto da Igreja de São Roque, com a promessa de descida ao Cais do Sodré para lavar as vistas com nacionais e estrangeiras, já que era importante que eu não me esquecesse de que "há mais mundo".

Miguel

Inversão

A relação já não era boa para ninguém. Sabia que não devia ter regressado. Cometeu os seus erros e regressar foi um deles.

Miguel

Meio-termo

As semanas passavam e sentia-me de castigo, à experiência, como se me coubesse conquistar a confiança. Mas sonhava-nos velhos. E ela sorria, afagava-me a mão, brindava-me com um jogo de pés, já se pendurava no braço. Estávamos a evoluir. Só começámos devagar.

Miguel

Sonhar

Encontrei curvas onde nunca me tinha aventurado. Depois… a desempoeirada. Era a estrada que me abrigara numa nova monotonia. Diferente. Uma monotonia diferente. Daquelas que não cansam. Porque só enjoa aquilo de que se gostou ao engano.

Miguel

O sol que não se põe 

A semana passou devagar. E escondi. Escondi o mais que pude. Do "super slim", do convertido, das miúdas, de toda a gente. Escondi para que não me demovessem. Não se pede o conselho que não se quer.

Miguel

Contexto

A felicidade é um contexto que se abraça. Não é um absoluto. Os mais flexíveis são os mais felizes.

Miguel

Não vou ceder

A mala e a minha organização eram o primeiro desconfortável conforto de quem tem demasiado controlo sobre as suas rotinas. Não havia ninguém para me desempoeirar.

Miguel

Claro que sim

De volta ao trânsito, entre a irritação de não me deixarem respirar e a vaidade de me sentir imprescindível. Ia gozá-la um bocadinho.

Miguel

Pesadelo

Agora, só queria ocupar o tempo, para que aquele dia não ocupasse o tempo todo. Para que todos os dias que levaram àquele dia não ocupassem o tempo todo. Mas ocupavam.

Miguel

Mundo pequeno

O café não arrefecia e espreitei o telemóvel: mais um retrato de uma conta qualquer, publicado por uma família despreocupada, sem olhar à perfeição dos cenários, celebrando apenas a alegria da viagem. Atrás, sem filtro, um casal perdia-se num beijo apaixonado. 

Miguel

Não te preocupes

Adormeci e tomei-me de pesadelos. A desempoeirada, o seu telemóvel, a intimidade que já só surgia a pedido, como se eu fosse um macho de outros tempos a quem devia uns favores para acalmar. Quando o corpo desanima a cabeça acompanha.

Miguel

Não, não sou

De novo o telefone. Fiquei desconfortável por estar a olhar para ela. Decidi pegar no meu. Ainda despachei um pequeno email de trabalho e mandei uma mensagem ao novo grupo.

Miguel

Interessa que estejas bem

Agora ela. Triagem. Estava-se mesmo a ver. Mas havia que esperar pelo médico. Encostou-se ao meu ombro num agradecimento. «Ainda bem que viemos». Era a sua forma de reconhecer que a água não é a cura de todos os males.

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