Corrupção: "Denunciantes estão desprotegidos e lei facilita perseguições"
O presidente da associação Transparência e Integridade, João Paulo Batalha, alerta para a existência de uma ilusão de proteção a denunciantes e aponta facilidades de perseguições e represálias nos locais de trabalho.
O presidente da associação Transparência e Integridade alertou hoje para existência em Portugal de uma ilusão de proteção aos denunciantes com uma legislação que diz proteger, mas que facilita perseguições e represálias nos locais de trabalho.
João Paulo Batalha falava à agência Lusa a propósito do Dia Internacional contra a Corrupção, que se assinala na segunda-feira, estando previsto um encontro em Guimarães que reunirá organizações e ativistas que se têm destacado no combate à corrupção em Portugal.
"Neste momento temos em Portugal uma situação perversa que é a ilusão de proteção aos denunciantes", disse, considerando que nunca foi valorizado o papel das pessoas que dão o alerta das situações quer seja em casos de corrupção quer seja de outro tipo de abuso de poder ou de situações de ilegalidade
Segundo o presidente da associação Transparência e Integridade, foi adotada uma legislação que diz que quem faz denúncias não pode ser prejudicado ou perseguido, mas não estabelece nenhum mecanismo de proteção efetivo, de recurso, que possa fazer uso se for perseguido nem nenhuma penalização para quem persegue.
"Temos em Portugal uma lei que diz que os denunciantes devem ser protegidos, mas ninguém os protege e isto cria uma ilusão de proteção. Há pessoas que encorajadas pela lei levantam a voz e fazem um alerta em situação de irregularidades ou suspeita e percebem que a lei é um tigre de papel que não os protege minimamente e veem-se expostas a todo o tipo de perseguições no local de trabalho e tornam-se vítimas das denúncias do que fizeram", frisou.
O denunciante, acrescentou, está na linha da frente a receber a retribuição e a represália pela denúncia que fez.
A falta de proteção, defendeu Joao Paulo Batalha, é uma peça chave de uma cultura de silêncio que continua a existir em Portugal.
"Apesar de termos uma lei que diz que os denunciantes devem ser protegidos e depois não os protege a cultura vigente nas organizações é de incentivo e imposição do silêncio. Isto é dramático porque situações de má gestão, de abuso, prepotência e violação de leis laborais acabam por não ser denunciadas porque as pessoas têm medo do que lhes possa acontecer se denunciarem", disse.
Esta cultura do silêncio, alerta, é especialmente perversa no que toca aos funcionários públicos porque estes têm obrigação legal de fazer denúncias quando existem suspeitas de irregularidades ou violação a lei no seu trabalho.
"Se se confrontam depois com a falta de proteção têm de fazer uma escolha impossível que é: se violam a lei e ficam calados não denunciando ou se ao cumprirem a lei denunciando têm de fazer um papel de mártires com perseguições ao longo de anos. Essa é uma escolha impossível e acaba por acontecer um incentivo evidente ao silêncio que não é de quem compactua, mas de quem tem medo de fazer ouvir a sua voz", defendeu.
Já os trabalhadores do setor privado, adiantou, não estão obrigados a denunciar.
Na segunda-feira, explicou, a cerimónia oficial vai refletir sobre o peso da corrupção e os desafios que existem para combater a corrupção no futuro, sendo abordada também a proteção dos denunciantes no combate aos crimes fiscais pelo presidente da Associação dos Profissionais da Autoridade Tributaria e Aduaneira, Nuno Barroso.
A ex-eurodeputada Ana Gomes, adiantou João Paulo Batalha, abordará a importância da União Europeia e casos concretos de denunciantes em Portugal e na Europa que ajudaram a inspirar a legislação.
Por outro lado, explicou João Paulo Baltazar, as comemorações vão ser um apelo para políticas sólidas de combate à corrupção a começar pela proteção dos denunciantes.
Os últimos dados da plataforma da Procuradoria-Geral da República "Denuncia Aqui" apontam que deram entrada entre 01 de novembro de 2017 e 31 de outubro de 2018 um total de 2578 denúncias tendo sido abertos 292 inquéritos, 49 averiguações preventivos e 2561 arquivamentos após análise inicial.
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