Secções
Entrar
João Carlos Barradas
06.12.2025

A União Europeia sem dinheiro para a Ucrânia

Passar do congelamento ao confisco de activos de um estado soberano pode ter consequências devastadoras e gravosas para a economia da zona euro.

O dinheiro acaba em Abril e a bancarrota do estado ucraniano será inevitável sem novos empréstimos ou dádivas financeiras que cobram cerca de €100 mil milhões em despesas anuais.

Esta é uma das certezas sobre o curso da guerra e a União Europeia, empenhada publicamente no apoio ao esforço de guerra ucraniano, desespera por uma solução isenta de custos para os contribuintes dos 27.

No «Euroclear» de Bruxelas – um dos principais grupos internacionais responsável pela custódia, manutenção e liquidação de activos financeiros – estão congelados desde 2022 cerca de €180 mil milhões do Banco Central da Rússia, ao abrigo das sanções impostas a Moscovo.

A UE encontrou justificação legal para se apropriar dos juros gerados, aproximadamente €7 mil milhões/ano, mas passar do congelamento ao confisco de activos de um estado soberano pode ter

consequências devastadoras e gravosas para a economia da zona euro.

A mera manutenção das sanções que determinam o congelamento dos activos russos, renovada de seis em seis meses por voto unânime dos 27, tem garantido, pelo contrário, um meio de pressão negocial.

O montante total de activos do estado russo congelados em instituições ocidentais rondará €256 mil milhões e os bens de privados englobados no sistema de sanções é estimado em €50 mil milhões.

Moscovo, por seu turno, concretizou, desde 2022, a nacionalização de €45 mil milhões em bens e activos de empresas estrangeiras presentes na Rússia desde 2022.

Na ausência de cessar-fogo, sem auxílio norte-americano, as estimativas de Bruxelas apontam para a urgência em disponibilizar a Kiiv, em 2026 e 2027, cerca de €135 mil milhões, dos quais €83 mil milhões para despesas de defesa.

Fugas de informação permitiram, entretanto, saber que Washington e Moscovo negociavam dividir os activos congelados para financiar projectos liderados pelos Estados Unidos para futura reconstrução da Ucrânia, reservando-se Washington 50% dos lucros, e investimentos económicos conjuntos russo-americanos.

Alternativas inconvincentes

Isolada a Comissão Europeia colocou sobre a mesa duas opções.

O recurso aos activos russos no «Euroclear» e também em instituições francesa e alemãs para concretizar um empréstimo de €165 mil milhões da UE a Kiiv, destinando-se €50 mil milhões a estabilização orçamental. A Ucrânia pagaria o empréstimo após ser indemnizada pela Rússia pelos danos da guerra.

A Comissão de Ursula van der Leyen considera, ainda, ter direito a impor medidas de emergência nesta matéria para «preservar a estabilidade da economia da União» como ocorreu no período de crise das dívidas soberanas de 2010-2012 e na crise Covid-19, evitando o voto unânime de todos os estados-membros.

Nesta situação está, contudo, em causa política externa e de segurança que obriga a voto unânime e não apenas «calamidades naturais ou ocorrências excepcionais», como refere o Artigo 122 do Tratado da União.

A Comissão ignora a objecção pois, assim bastaria assegurar o apoio de 15 estados, representando pelo menos 65% da população dos 27. A maioria qualificada daria para ultrapassar vetos indesejáveis na renovação semestral das sanções a Moscovo.

A legalidade da proposta é controversa e a alternativa, emissão de dívida conjunta, revelou-se um nado-morto. A Hungria anunciou o seu veto.

Além dos receios da «Euroclear» e do governo belga de não contarem com o apoio dos demais parceiros para cobertura de risco e da litigância da Rússia em tribunal de arbitragem levantam-se questões de direito internacional.

Eventuais indemnizações de guerra e seus montantes dependem dos termos de um acordo de paz e só o Conselho de Segurança da ONU, onde Moscovo tem direito de veto, pode impor o pagamento.

O mesmo se aplica a qualquer decisão do Tribunal Internacional de Justiça que obrigue a Rússia a pagamento de indemnizações.

Até à cimeira europeia de 18 e 19 deste mês outras propostas virão a público e no fim a União Europeia ver-se-á, provavelmente, sem dinheiro.

Texto escrito segundo o Acordo Ortográfico de 1945

Mais crónicas do autor
06 de dezembro de 2025 às 08:00

A União Europeia sem dinheiro para a Ucrânia

Passar do congelamento ao confisco de activos de um estado soberano pode ter consequências devastadoras e gravosas para a economia da zona euro.

29 de novembro de 2025 às 08:00

Um psicopata afável

A ambição de identificar uma possível essência individual do mal fascinou naturalmente os psiquiatras que analisaram os detidos nazis de Nuremberga.

22 de novembro de 2025 às 08:00

A América foi-se e ficámos sozinhos

Vladimir Putin alcançou o objectivo estratégico de dissociar a defesa europeia da intervenção militar norte-americana ambicionado pelos comunistas soviéticos.

15 de novembro de 2025 às 08:00

Lei iníquas e dignidade no trabalho

A discussão que ainda mal começou sobre as propostas governamentais de revisão de leis laborais deixa a claro a falta de tino e visão da ministra Maria Ramalho e de Luís Montenegro.

08 de novembro de 2025 às 08:00

É uma injustiça a morte

Há que admitir aqui que as coisas que receamos para nós são as mesmas que geram piedade quando acontecem aos outros

Mostrar mais crónicas
Descubra as
Edições do Dia
Publicamos para si, em três periodos distintos do dia, o melhor da atualidade nacional e internacional. Os artigos das Edições do Dia estão ordenados cronologicamente aqui , para que não perca nada do melhor que a SÁBADO prepara para si. Pode também navegar nas edições anteriores, do dia ou da semana.
Boas leituras!