Secções
Entrar

Guterres ataca desigualdade de género e indica desafios para "mudar o mundo"

28 de fevereiro de 2020 às 07:03

"Tal como a escravatura e colonialismo foram manchas dos séculos anteriores, a desigualdade de géneros devia envergonhar-nos a todos no século XXI", disse.

O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, declarou hoje que a desigualdade entre homens e mulheres é "estúpida" e "inaceitável" e enumerou cinco áreas que necessitam de igualdade de género para "mudar o mundo".

"Tal como a escravatura e colonialismo foram manchas dos séculos anteriores, a desigualdade de géneros devia envergonhar-nos a todos no século XXI. Porque não só é inaceitável, é estúpida", disse Guterres na noite de quinta-feira (sexta-feira em Portugal), ao receber um doutoramento honorário na universidade New School.

O português enumerou cinco áreas que vão "mudar o mundo", se oferecerem oportunidades e segurança iguais para homens e mulheres: conflitos armados, alterações climáticas, economia, divisão digital e representação política.

Em termos de conflitos, António Guterres disse que existem "homens a travar guerras contra as mulheres", com "táticas de guerra", como violações e escravidão sexual, e acrescentou que, em média, 137 mulheres são mortas diariamente por um membro da família.

"Revogar leis que discriminam mulheres e meninas; aumentar a proteção contra a violência; preencher a lacuna na educação e tecnologia digital das meninas; e acabar com as disparidades salariais entre homens e mulheres são apenas algumas das áreas para que apontamos", explicou o chefe da organização internacional.

Já ao nível do clima, considerou que "a crise existencial" que o mundo enfrenta "é resultado de decisões tomadas pelos homens, mas que têm impacto desproporcional nas mulheres e meninas".

Lamentando que as "iniciativas para reduzir e reciclar sejam predominantemente comercializadas para mulheres", Guterres alertou para o "risco de que salvaguardar o planeta seja visto como trabalho de mulheres, tal como qualquer tarefa doméstica".

O antigo primeiro-ministro português disse que desfrutou de muitos privilégios, sendo um homem nascido na Europa ocidental.

"Mas a minha infância numa ditadura militar em Portugal abriu-me os olhos para a injustiça e opressão. Como estudante fazendo trabalho voluntário nos bairros de Lisboa, ao longo da minha carreira política e como líder da agência de refugiados das Nações Unidas, sempre me senti compelido a lutar contra a injustiça, a desigualdade e a negação dos direitos humanos", declarou.

Guterres congratulou-se por já ter cumprido um objetivo do seu mandato como secretário-geral da ONU antes do prazo: a equidade entre homens e mulheres em posições de liderança na organização, contando com 90 homens e 90 mulheres na liderança desde 01 de janeiro, num ano em que se assinala o 75.º aniversário da organização internacional.

Engenheiro de profissão, Guterres fez uma promessa, para os próximos dois anos que lhe restam no mandato como secretário-geral: "aprofundar o compromisso pessoal para destacar e apoiar a igualdade de género", bem como "contactar os governos que têm leis discriminatórias para defender mudanças".

Prometeu ainda "terminar com o pensamento masculino padrão nas Nações Unidas".

No discurso em Nova Iorque, o português condenou o "abuso de poder que prejudica as comunidades, economias, o ambiente, as relações e a saúde" e defendeu mais participação de mulheres nos quadros corporativos para serem "mais estáveis e lucrativos".

O secretário-geral chamou a atenção para o facto de a desigualdade de género não ser um problema novo e destacou "novos modelos de liderança" criados pelas jovens Malala Yousafzai, ativista paquistanesa que recebeu o prémio Nobel da paz aos 17 anos, ou Nadia Murad, iraquiana vítima de rapto por um grupo terrorista e vencedora de vários prémios, incluindo o prémio Nobel da Paz.

Chamando a atenção que este não é um problema novo, António Guterres lembrou que a rainha Nzinga Mbandi do Mbundu opôs-se ao colonialismo português naquele que é hoje o território de Angola, ainda no século XVII.

Guterres saudou ainda as mulheres de Hollywood e do cinema que "corajosamente" falaram e lutaram contra a discriminação ou os assédios: "Nem Hollywood protege as mulheres dos homens que exercem sobre elas poder físico, emocional e profissional".

"A igualdade de género é, fundamentalmente, uma questão de poder", defendeu o secretário-geral da ONU.

Descubra as
Edições do Dia
Publicamos para si, em três periodos distintos do dia, o melhor da atualidade nacional e internacional. Os artigos das Edições do Dia estão ordenados cronologicamente aqui , para que não perca nada do melhor que a SÁBADO prepara para si. Pode também navegar nas edições anteriores, do dia ou da semana.
Boas leituras!
Artigos recomendados
As mais lidas
Exclusivo

Operação Influencer. Os segredos escondidos na pen 19

TextoCarlos Rodrigues Lima
FotosCarlos Rodrigues Lima
Portugal

Assim se fez (e desfez) o tribunal mais poderoso do País

TextoAntónio José Vilela
FotosAntónio José Vilela
Portugal

O estranho caso da escuta, do bruxo Demba e do juiz vingativo

TextoAntónio José Vilela
FotosAntónio José Vilela