Portugal 2050
Uma das ideias centrais é dotar Portugal de uma “visão” de futuro e de “agilidade” para fazer face a um mundo em constante mudança e aceleração.
Visto de Lisboa, é tempo de pensar e preparar o futuro. Em 2021, o governo português de então, também estimulado por desenvolvimentos em Bruxelas, criou o Centro de Planeamento e Avaliação de Políticas Públicas (PLANAPP), uma espécie de think tank interno do Estado que também tem por missão antecipar o futuro. Muitas vezes, com a alternância de partidos políticos no poder, estas entidades desaparecem porque “mudam-se os tempos, mudam-se as vontades.” Não foi este o caso com a PLANAPP e bem. Juntamente com o Centro, foi também lançada uma rede na administração pública, a REPLAN, que reúne aqueles que se ocupam do planeamento e de análises prospetivas a nível setorial. Recentemente, a REPLAN lançou o relatório Megatendências 2050 – O Mundo em Mudança: Impactos em Portugal. Foi para debater este documento que a “Visto de Bruxelas” esteve em Lisboa esta semana.
O que diz e para que serve o relatório?
Sucintamente, o documento faz uma análise das principais megatendências que “irão moldar o futuro de Portugal até 2050.” Das alterações climáticas, urbanização e digitalização à geoeconomia, geopolítica e democracia, são mapeadas oportunidades, incertezas e ameaças que terão implicações para a elaboração de políticas públicas e para a governação do país. Uma das ideias centrais é dotar Portugal de uma “visão” de futuro e de “agilidade” para fazer face a um mundo em constante mudança e aceleração.
A somar ao conteúdo analítico que recomendo, o relatório não é só para ler. É, também, para usar como sugerem os autores lá mais para o fim, através, por exemplo, de exercícios de cenarização, da avaliação de riscos ou da retroprojeção (do futuro para o presente). Seja no governo ou na administração pública, nas universidades ou nas escolas, nas empresas ou nas associações da sociedade civil, o “Megatendências 2050” deve ser usado como um instrumento de antecipação e preparação de futuros.
Portugal 2050: portugueses; mundo; Europa
Na discussão de ontem houve três questões principais que procurei abordar: numa visão para Portugal em 2050, que aspeto ou aspetos seriam prioritários? Porque haverá no relatório mais atenção ao Atlântico e à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e menos à UE como dimensões fundamentais para o país? E, finalmente, que papel deve Portugal desempenhar na Europa em 2050? Uma reflexão e dois apontamentos.
Portugueses
Na construção de uma visão para o país com o horizonte de 2050, o foco principal deve estar nos portugueses. Quando digo ‘portugueses,’ falo de toda a população que vive em Portugal, nacional e migrante, e, também, a diáspora. Ou seja, todos aqueles que até 2050, dentro e fora, estão empenhados e vão contribuir para moldar o futuro do país. É para (e com) as pessoas que os governos devem governar e elaborar políticas públicas. Se queremos um Portugal ágil e com capacidade de adaptação a um mundo em mudança acelerada precisamos, na base, de ter uma população ágil e adaptável a novas realidades. Isto implica muito mais do que só a Educação. Claro que necessitamos de gente com elevados níveis de escolaridade e, idealmente, de conhecimentos científicos, culturais e humanistas. Mas, implica, também, a preparação para um mundo novo que antecipe os temas e muitas das perguntas para as quais não temos ainda uma resposta definitiva.
Por exemplo, num momento de mudanças tecnológicas e digitais rápidas com a disseminação da Inteligência Artificial (IA), que tem um potencial transformador em todos os setores da vida humana, como será o ciclo de vida dos portugueses em 2050 e nas décadas seguintes? Como vão crescer e aprender? Como vão trabalhar (se trabalharem), criar riqueza e consumir? Como se vão relacionar e divertir-se? Como vão deslocar-se? Vão continuar, como hoje, a estudar, depois a trabalhar – numa ou em várias profissões – para seguidamente se reformarem? Ou será que este ciclo ou a forma como organizamos as nossas vidas vai ser radicalmente diferente até porque viveremos mais anos? Há incertezas e receios sobre a era da IA: será um período de substituição e de potencial ‘desumanização’ ou, ao contrário, um período de aumento e de ‘super-humanidade’? Talvez, nem um nem outro, mas será transformador – isso é quase garantido.
Outro exemplo, é a preparação para uma nova realidade geopolítica muito mais exigente em que a paz, a estabilidade e a segurança na Europa não estão garantidas. Isto implica o quê? Vamos assistir a uma (re-)militarização da sociedade portuguesa e das sociedades europeias em geral, com o regresso do serviço militar obrigatório? Vamos todos passar a ser treinados em ‘preparação civil,’ fundamental, também, para lidar com as catástrofes naturais e os eventos climáticos extremos que iremos viver? Ou será que os avanços tecnológicos, também potenciados pela IA, vão contribuir para reduzir o elemento humano nas forças armadas e nas guerras do futuro? E se sim, em que medida?
Ora, é preciso começar já a preparar os portugueses para transformações vindouras, tornando-os ágeis e adaptáveis, até para poderem moldar o futuro ou os futuros que querem num mundo em transição.
Mundo
As razões pelas quais a UE aparece secundarizada em favor do espaço atlântico e da CPLP no relatório podem ser tanto benevolentes como preocupantes. Por um prisma positivo, a UE já deixou de ser olhada como uma entidade externa ao país. Isto é algo que Bruxelas agradece. Ou seja, Portugal é a UE e a UE é Portugal. Olhando de uma forma menos benigna, essa ausência pode resultar da ideia de que a UE é um dado adquirido. Seria um erro pensar isto. Como o “Megatendências 2050” sublinha, há uma incerteza sobre a evolução futura da União Europeia: maior integração ou desagregação? Existem, hoje, forças nas duas direções e Portugal não tem interesse em que as últimas vinguem. Depois, julgo que há um elemento mais profundo. A UE é uma invenção humana da qual Portugal faz parte há 40 anos. Já o Atlântico e a língua portuguesa (não a CPLP), fazem parte da identidade e da História do país há séculos e é menos provável que num futuro até longínquo ou deixe de haver oceano ou que a nossa língua desapareça. Sobre a UE já não podemos ter essa certeza. Como dizia Emmanuel Macron há uns tempos, a “Europa pode morrer.”
Europa
Precisamente para evitar que a Europa morra, Portugal tem um papel a desempenhar. Nas vicissitudes da nossa integração europeia, as ideias de ‘bom aluno’ ou de ‘pelotão da frente’ predominaram. Na fase em que estamos, os portugueses devem empenhar-se convictamente no projeto europeu e pensar nele como às vezes pensamos sobre a Inteligência Artificial: a UE não serve para substituir Portugal. A UE deve servir para aumentar Portugal.
Afastando o cenário da desintegração da UE, é plausível que o projeto europeu avance a diversas velocidades no futuro. Se o Atlântico e a língua portuguesa podem oferecer alternativas, seria um erro Portugal afastar-se do centro de decisão europeu e não continuar a estar na vanguarda do processo de integração, contribuindo, igualmente, com as suas mais-valias geoestratégicas, culturais e linguísticas.
Na UE haverá sempre países mais lentos. Portugal não deveria ser um deles, agora ou em 2050.
P.s. – Portugal perdeu esta semana um dos seus grandes visionários. Uma sentida homenagem a Francisco Pinto Balsemão e ao legado de democracia e de liberdade que deixa para o futuro.
Portugal 2050
Uma das ideias centrais é dotar Portugal de uma “visão” de futuro e de “agilidade” para fazer face a um mundo em constante mudança e aceleração.
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