A Justiça em Risco na Guiné-Bissau
Por trás desse incidente, revela-se um problema mais profundo: a frágil consolidação do Estado de Direito na Guiné-Bissau.
Nos últimos meses, a Guiné-Bissau tem assistido a uma preocupante escalada de interferências indevidas nas instituições do Estado. Entre os episódios mais graves está a tentativa de setores militares de interferirem na organização e funcionamento do Ministério Público (dissolvendo o Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público) — um gesto que, à luz da Constituição guineense, é absolutamente destituído de legitimidade.
A União Internacional de Magistrados de Língua Portuguesa (UIPLP) recordou oportunamente um princípio essencial: nenhuma entidade militar detém competência para alterar a estrutura interna do Ministério Público nem suspender leis da República. Atos dessa natureza são nulos, abusivos e configuram uma clara usurpação de funções públicas.
Trata-se de um alarme institucional que não pode ser ignorado.
Por trás desse incidente, revela-se um problema mais profundo: a frágil consolidação do Estado de Direito na Guiné-Bissau.
A instabilidade política recorrente, associada à persistência de forças armadas habituadas a intervir na esfera civil, tem impedido a consolidação de uma justiça independente e previsível.
O Ministério Público, responsável por garantir a legalidade e combater a impunidade, torna-se um alvo natural de pressões e tentativas de controlo.
A comunidade internacional e os cidadãos devem perceber o alcance desta situação. O enfraquecimento do Ministério Público significa, em última instância, o enfraquecimento da própria democracia. Quando as instituições de justiça deixam de atuar segundo a Constituição e passam a obedecer a interesses de ocasião, o Estado perde o seu eixo de equilíbrio e a sociedade perde confiança no futuro.
A UIPLP, fiel à sua missão, tem reafirmado solidariedade plena com os magistrados guineenses.
A defesa da autonomia e independência do Ministério Público não é apenas uma questão corporativa, mas uma causa civilizacional: sem justiça livre, não há paz duradoura nem desenvolvimento sustentável.
O desafio colocado hoje à Guiné-Bissau é o de afirmar, com coragem e serenidade, que o poder das armas nunca poderá suplantar o poder da lei. E que, mesmo em tempos de incerteza, a fidelidade à Constituição é o único caminho possível para um Estado verdadeiramente justo e soberano.
Deixo expressa aqui a minha solidariedade com os colegas magistrados do Ministério Público e o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público da Guiné-Bissau.
A Justiça em Risco na Guiné-Bissau
Por trás desse incidente, revela-se um problema mais profundo: a frágil consolidação do Estado de Direito na Guiné-Bissau.
A desinformação que fere a Justiça
Fala‑se muito do Estado de Direito, mas pouco se pratica o respeito pelas suas premissas básicas. A presunção de inocência vale para todos — também para os magistrados.
Um Ministério Público exausto não combate a corrupção
Em muitas unidades, cada magistrado gere, simultaneamente, mais de mil inquéritos.
Quando a verdade se torna irrelevante
A separação de poderes é esquecida por quem instrumentaliza casos mediáticos para tentar capturar ou condicionar a investigação penal.
A fragilidade do que é essencial: proteger a justiça
A recente manifestação dos juízes e procuradores italianos, que envergaram as suas becas e empunharam cópias da Constituição nas portas dos tribunais, é um sinal inequívoco de que mesmo sistemas jurídicos amadurecidos podem ser alvo de ameaças sérias à sua integridade.
Edições do Dia
Boas leituras!